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Ludwig Wittgenstein
nasceu em Viena em 1889 e morreu em Cambridge em 1951.
Fez estudos superiores em Berlim e em Londres, onde, por influência
de Bertand Russel, foi levado ao estudo da Lógica. Seu
primeiro livro, "Tractatus Logico Philophicus", foi
escrito em cadernos de campanha, durante a Primeira Guerra Mundial,
e apareceu em 1920. Sua obra é particularmente importante
pela teoria da analise linguística posta a serviço
do pensamento filosófico. Wittgenstein é um filósofo
que interroga e propõe enigmas, e seus livros "Caderno
Azul" e "Caderno Marrom", são, indiscutivelmente,
um dos mais belos ecos da filosofia de Sócrates, especialmente
no "Crátilo" e no "Teéteto"
de Platão. É do "Caderno Marrom" o texto
que hoje publicamos.
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Quando
um homem se levanta de manhã, as coisas se passam da seguinte
maneira: ele se pergunta a si mesmo se é realmente hora de
levantar-se, se esforça para tomar uma decisão, e
de repente percebe que está se levantando. Este modo de descrição
torna clara a ausência de um ato de vontade. Mas, antes de
tudo, onde é que podemos encontrar o protótipo deste
ato de representação? Ou então, como é
que se chegou à conclusão de que as coisas acontecem
assim?
Creio que a experiência do esforço muscular constitui
o protótipo do ato de vontade. Ora, alguns elementos dessa
descrição me incitariam a pensar que não há
nada disso. Observe-se bem que uma pessoa não conseguiria
perceber que a gente se levanta do mesmo modo que se percebe outra
pessoa levantar-se. Não se observa, no primeiro caso, uma
série de movimentos sobre os quais não podemos exercer
qualquer controle. Não se observa um ato reflexo.
Tomemos um exemplo: eu me coloco, de lado, encostado numa parede,
tocando a parede com as costas da mão do braço caído
e, deixando esse braço pendente, pela ação
do músculo deltóide, empurro fortemente a parede com
as costas da mão: se, nesse momento, eu me afastar de repente
da parede, sem me preocupar com meu braço, verei, sem minha
intervenção, meu braço levantar-se como num
movimento próprio.
Só num caso semelhante se poderá dizer com justa razão:
_ "Percebo que meu braço está se levantando".
É claro, contudo, que as diferenças são marcantes
e múltiplas. O caso é que, entregando-me a essa experiência,
observo meu braço levantar-se, e o caso em que olho alguém
que se levanta, ou o caso em que vejo a mim quando me levanto, especialmente
neste último caso, não pode haver elemento de surpresa,
e eu, por outro lado, não observo meus próprios movimentos
da mesma forma que observava os de uma pessoa que vejo virar-se
de um lado para outro em sua cama, dizendo comigo mesmo: _ "Será
que ele vai se levantar?" A ação voluntária
que eu completo ao levantar-me é muito diferente desse movimento
de meu braço que se eleva involuntariamente, mas não
se descobre entre esses atos, pretensamente voluntários ou
involuntários, uma diferença singular e única,
a presença ou a ausência do ato de vontade.
A descrição deste ato de levantar-se, no qual uma
pessoa se dá conta de que está se levantando, pareceria
indicar que a pessoa se observa a si mesma no momento em que está
se levantando. É evidente, porém, que a observação
real está ausente. Contudo, não se poderia afirmar
que uma atitude de observação supõe obrigatoriamente
uma tensão de espírito contínua durante todo
o tempo em que dizemos que estamos observando.
Diversas séries de comportamentos e de experiências
podem ser qualificadas como uma atitude de observação.
Poder-se-ia falar, numa simplificação generalizada,
de curiosidade preliminar, de observação atenta do
acontecimento, de surpresa; e se pensarmos em toda a variedade de
expressões do rosto correspondentes a esses três termos
e ao fato de que a observação pode ainda não
ser sublinhada por nenhuma expressão particular, a multiplicidade
dos fenômenos correspondentes nos parecerá evidente.
Eu declaro: _ "Quando disse, sem querer mentir: "o trem
parte às 15h30", não aconteceu nada a não
ser a emissão dessas palavras". Poderão objetar
_ "Aconteceu outra coisa, pois você pronunciou uma frase
sem pensar no que estava dizendo". Posso responder: _ "Eu
não quis dizer que não existia diferença entre
a palavra significante e a palavra automática ou mentirosa;
mas a oposição entre acreditar e não acreditar
no que uma pessoa diz refere-se a uma infinidade de casos diferentes,
as diferenças acusadas pela diversidade das circunstâncias,
não se aplica a uma diferença unica, que consistira
na presença ou ausência de um certo estado de espírito."
Examinemos alguns casos característicos de ação
voluntária e involuntária. No caso em que uma pessoa
levanta uma carga pesada, o fato de a carga ser levantada voluntariamente
se caracteriza por diversas sensações de esforço
físico. Compare-se isso com o caso da escritura voluntária,
na qual, geralmente, não se tem essa impressão de
esforço; mesmo se se nota uma certa crispação
dos músculos e se a mão não se fatiga, não
se tem a impressão de um movimento penoso, característico,
pode-se dizer, da ação voluntária... Compare-se,
por outro lado, a maneira pela qual a mão se eleva quando
uma pessoa sustenta um peso, e a maneira pela qual essa mão
se levanta quando, por exemplo, se mostra alguma coisa situada acima
dos olhos. Este gesto será considerado como um ato voluntário,
embora não seja acompanhado de nenhuma sensação
de esforço. |
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