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Já escrevi uma vez sobre os "gatos", mas não
me parece demais voltar ao mesmo assunto. E, antes de tudo, convem
dizer a quem não o souber que "gato", na giria
jornalistica, é a troca de letras numa palavra, ou de palavras
numa frase, de modo a dar a um artigo ou a uma noticia um sentido
diverso do que se pretendia dar. Assim "pastel" é
a mistura da composição de duas noticias ou artigos,
dando em resultado uma coisa profundamente atrapalhada e profundamente
humoristica.
Às vezes, o cochilo da revisão produz "gatos"
ou "pastéis" horriveis, absolutamente improprios
para menores, senhoritas e pessoas adjacentes. Outras vezes, porem,
eles são inocentes, embora ligeiramente maliciosos, como
este anuncio publicado pelo "Diario Popular" num dos seus
numeros de janeiro de 1926:
"MOÇA - Vende-se uma, a balanço, baratissima,
com freguesia formada e aluga-se o predio onde funciona" etc.
O "Estado de São Paulo", no seu numero de 1 de
maio de 1926, publicou, na sua seção esportiva, a
seguinte noticia - mistura de futebol com trecho de sua seção
religiosa:
"LIGA DE AMADORES DE FUTEBOL - Hoje, dia 1.o de maio, a secretaria
da Liga de Amadores de Futebol funcionará somente até
às 12 horas. Venham as castas donzelas saudá-la como
o simbolo de pureza e o exemplo sublime de todas as virgens cristãs!
Venham as mulheres em cujas frontes brilha o diadema formoso da
maternidade" etc. etc.
Ainda "O Estado" publicou, em 29 de junho de 1928, este
belissimo exemplar de "pastel" mistura de uma noticia
policial e de uma reportagem sobre a visita do rei da Saxonia ao
Brasil. Depois de descrever uma cena criminosa em que uma japonesa
alvejara o marido a tiros e que este, caido no solo, tentava por
sua vez atirar sobre a mulher, terminou assim:
"Melhor seria matá-la e ele, agora, com o revolver em
punho, deu varias vezes ao gatilho. As balas partiram e uma delas
matou a japonesa que, depois desse agape ainda realizou um breve
passeio pela cidade, pretendendo visitar hoje Campinas, para onde
irá pela manhã".
O "Diario Nacional", em seu numero de 15 de março
de 1928 por ocasião da catastrofe do Monte Serrate, publicou
o seguinte telegrama da caravana de adeptos do Partido Democratico
em excursão politica pelo sul:
"URUGUAIANA. 13 (Diario Nacional) - Logo que chegou a Uruguaiana
a contristadora noticia da catastrofe que enlutou a cidade de Santos
e todo o Brasil, os caravanistas enviaram longo tartaruga em vez
de uma chaminé de ferro".
Quando acontecem essas coisas, e outras piores, num jornal, o melhor
que se tem a fazer é deixar o "gato" cair no esquecimento
para não acontecer o que, segundo se afirma, aconteceu ao
austero "Jornal do Comercio", ainda no tempo da monarquia.
Certo dia s. m. o Imperador levando uma queda do cavalo, teve que
se conservar varias semanas em tratamento, num dos aposentos do
palacio. Quando s. m. melhorou, o "Jornal do Comercio"
se apressou em noticiar o auspicioso fato e participar aos seus
leitores que dom Pedro saira de seus aposentos amparado a duas muletas.
Mas a noticia saiu assim:
"Ontem felizmente, s. m. pode sair de seus aposentos particulares
amparado a duas maletas".
Quando o jornal saiu foi um escandalo. Aquelas "duas maletas"
causaram colicas nos jornalistas. Resolveu-se, então, publicar
uma retificação. E esta saiu nos seguintes termos:
"Ontem, por lamentavel descuido de nossa revisão disemos
que s. majestade havia deixado seus aposentos particulares amparado
a "duas maletas". O leitor inteligente, porem, viu logo
que se tratava de um engano. Com efeito. O que escrevemos foi que
s. majestade saira de seus aposentos amparado a DUAS MULATAS".
É inutil dizer que o jornal resolveu não corrigir
mais nada. |
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