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Ambos nascidos no paiz da arte, onde as linhas architectonicas,
as plasticas marmoreas, os paineis prodigiosos, deram-lhe tal denominação.
Ambos tendo por longo espaço de tempo vivido nos humbraes
esquecidos das velhas e poeirentas cidades da antiga Roma. Ambos
sequiosos de mostrar ao Novo Mundo as habilidades que dos reconcavos
da antiguidade brotam fecundas e abundantes, rumaram á America.
Marinetti, o representante mascarado de uma facção
politica, vem á scena empunhando o facho de luz da arte moderna,
surgida por entre as arcadas ancestraes do velho Colyseu, pregando
a transformação do sentimento politico, transcripto
em longos e encantadores versos, pelo estourar das bombas, repicar
de sinos, silvar de locomotivas.
Na representação da velocidade assustadora de vida,
na locomoção rapidissima, tenta impedir, pela deslocação
brusca, que respire o oxygenio sustentador a arte perfeita e pura,
isto é, aquella que todos apreciam, todos sentem, e a todos
agrada.
Quando um quadro attráe uma multidão, pela singeleza
de suas linhas, pela verdadeira expressão do bello, podemos
dizer, que de facto, é artístico, porém, os
quadros dessa nova escola revolucionaria do espirito intelectual
do mundo são comparaveis áquelle pintado por um demente,
em que se via uma téla em branco, com a seguinte inscripção:
"A passagem dos Israelitas pelo Mar Vermelho". Alguem
se approximando delle, e desejando comprehender a sua significação,
interroga o louco:
- Onde estão os Israelitas?
- Já passaram.
- Os hebreus?
- Ainda não chegaram.
- E (já assustado com as respostas) o Mar Vermelho?
- A voz de Moysés recuou.
Assim são de facto as producções futuristas
dos discipulos de Marinetti.
Só a imaginação delles existe, e talvez nem
mesmo aos futuristas agrade.
Os que sinceramente dizem não comprehender, são os
"passadistas; os que não comprehendem e se fazem de
bons entendedores são os futuristas".
Conclue-se disso que a escola futurista não é nem
mais nem menos que o fructo da hypocrisia do seculo corrente.
Mas, falavamos de Marinetti e Meneghetti, este, ladrão astucioso,
audaz, perigoso, assassino frio, calmo, sereno, vem da Italia, para
revolucionar o meio policial e atemorizar o meio social da nossa
paulicéa.
O tiroteio da manhã de hontem nada mais é que a prova
patente do atrevimento de um criminoso nato, no dizer de Lombroso;
criminoso, na época actual, futurista, pois, nos crimes que
praticou nesta capital, demonstrou que estava decidido a revolucionar
a arte profissional que exercia.
Marinetti, tambem tentou revolucionar a arte, e foi applaudido pela
mesma fórma futurista com que as balas da policia paulista
felicitavam o autor de aventuras romantescas, pelos innumeros projecteis
que ao alto das galerias, a mocidade academica em manifestação
de franca hostilidade lhe dirigia, mostrando o brio do povo passadista.
Ambos, Marinetti e Meneghetti são usurpadores extranhos ao
nosso meio, que nos vêm inflingir os males perniciosos de
sua arte.
Marinetti quer tirar-nos pelo assassinio da arte passadista as mais
palpitantes provas do coração do povo brasileiro,
a poesia, que é o romantismo, a pintura, que é a reproducção
perfeita dos encantos nas expressões vivas da téla,
para implantar as grotescas e desinteressantes producções
dos modernos futuristas.
Meneghetti, esse quer roubar pelo assassinio, a propriedade do povo,
a paz dos lares e os fieis cumpridores dos seus deveres, substituindo
a segurança e a ordem, pelo terror de suas anarchicas e audaciosas
façanhas.
A Marinetti e a Meneghetti, futuristas na arte e no crime, façamos
a maxima campanha, para que no nosso territorio não mais
appareçam outros transformadores do quilate desses dois.
S. Paulo, 4 de Junho de 1926.
WALFRIDO PRADO GUIMARÃES
Rua do Carmo, 12.
Leia
reportagem publicada em 1926 sobre Meneghetti em Manchetes
Leia biografia de Meneghetti em Miscelânea
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