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São
Paulo, sexta-feira, 28 de julho de 1972
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Neste
texto foi mantida a grafia original
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CORRESPONDENCIA INEDITA ENTRE
LOBATO E BELMONTE
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GUARIBA
(Do correspondente) - "Aplique as idéias do Messias
(H. Ford) no Juca Pato e verás que pata botadeira de ovos
de ouro elle sae" - escrevia Monteiro Lobato, por volta de
1923, para o caricaturista Benedito Bastos Barreto, mais conhecido
por Belmonte. As cartas ineditas do escritor taubateano encontram-se
hoje em poder da filha do caricaturista, sra. Lais Barreto Sadalla,
residente em Guariba.
O estilo, a combatividade e as convicções politicas
de Lobato revelam-se nessas cartas, algumas incompletas e redigidas
muito livremente, uma vez que o autor não tencionava publicá-las.
Belmonte começava então a ser conhecido graças
ao tipo de "Juca Pato", que criou e divulgou pela Folha
de S.Paulo.
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"Leia
o Ford" |
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Respeitada a ortografia da epoca, é a seguinte a primeira
das cartas de Monteiro Lobato, cedida pela sra. Lais Sadalla:
"Belmonte: Bravos! Sinto um verdadeiro prazer quando vejo um
amigo atirar-se. É um prazer maior quando o vejo começar
certo. Mas ninguém, a não ser por acaso, começa
certo, se não lê e medita a Biblia moderna - o livro
de H. Ford. Os principios de um negocio são os mesmos, seja
elle o maior negocio do mundo ou um pequeno negocio insusceptivel
de grande surto. Porque são reflexos de uma coisa de que
a humanidade anda muito apartada: o bom senso.
"Aplique as ideias do Messias no "Juca Pato" e verás
que pata botadeira de ovos de ouro elle sae. Na minha nova phase
"Cia. Editora Nacional", tudo se baseia nos milagrosos
principios, e os resultados são tão surpreendentes
que verifiquei uma cousa: fallido eu estava antes da fallencia,
porque estava errado. Depois de fallido oficialmente é que
realmente desfalli. Comece certo, Belmonte. Comece lendo o Ford.
Mas não leia a tradução do nosso amigo Bueno,
que apesar de toda a boa vontade faz o Ford dizer muitas vezes o
contrario do que disse. Ou leia a ingleza ou a franceza ou a minha,
que sairá em julho. Em vez de mandar-me uma desenxabida lorota
para o 1.o n.o mando-te este conselho que, seguindo, me agradecerás
um dia como o melhor dos presentes. Lobato".
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O
pato |
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Outra
carta, datada de 19.4.26, foi escrita no Rio:
"Belmonte: Muito me sensibilizou a tua carta, onde se revê
a sinceridade, uma coisa tão rara e que aqui no Rio, então,
é a avis rarissima. Mas é que você é
Pato e os Patos compreendem os Patos e se sentem ligados a eles
por fundas afinidades sentimentais. Isso porque somos as eternas
victimas. Eu chamo Pato a todas as criaturas de almas sã,
ingenuas, sinceras, boas, capazes de sacrificios e incapazes de
infamias. Qualidades todas ellas negativas no Brasil, terra onde
só vencem os capazes de infamia. Quando vejo um sujeito alcançar
um alto posto na politica, penso comigo: quantas fez elle para pendurar-se
lá. Vende o que faz mais, o que bajula mais, o que trahe
mais, o que calunia mais o que mais filhodaputisa mais. O nosso
paiz, meu caro, é uma bem triste coisa, visto pelos aspectos
moraes, sobretudo visto deste Rio, que o summario da terra e (?)
incita em alta potencia todas as mazellas do carater nacional.
Teu lapis amargo terá muito que escalpelar - mas o triste
é que escalpelará em vão. A caricatura entre
nós não corrige, como não corrige a satyra
literaria, como não corrige a cadeia. Só mesmo há
atraz dellas. Como sei que é assim, admiro grandemente os
artistas homens como tu, desajudados de toda especie de ajuda technica
e que apesar disso chegam a fazer coisas tão interessantes.
Se ainda estivessemos nos "ominosos tempos", Pedro II
agarraria em ti e te poria a estudar em Munhic, do seu bolso. Serias
um dos que não escapariam, porque tens talentos de verdade
e elle sabia distinguir o talento verdadeiro do falso.
Adeus, meu caro Belmonte; hei de fazer propaganda do teu José
da Silva Pato e havemos de conversar mais tarde sobre umas ilustrações
de que vou precisar. Adeus. Lobato. 97 - R; Prof. Fabiso, 97".
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Incompleta
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O terceiro documento divulgado agora é datado de 1.4.23,
também do Rio, e está incompleto.
"Belmonte: Só hontem, indo à Manhã, encontrei
a tua carta e o rolo do Juca Pato. O negocio do Clay só poderá
ser resolvido ahi, com o sr. Octales Ferreira, rua dos Gusmões,
31.
Como tudo no Brasil anda às avessas a filial de São
Paulo começou a funcionar antes da Matriz do Rio.
Li a colleção de patadas que o teu pobre Juca Pato
vae levando pela vida em fora, e li a autobiographia do mesmo na
Folha. Confere, e nem pode um pato esperar outra cousas da vida.
Há de levar na cabeça sempre e sempre. Elle já
está muito popular e ficará, como ficou o Zé
Caipora do S. Agostini. A apresentação que faz(es)
delle no album está ótima, porque és ainda
maior escriptor do que desenhista... Ser escriptor é bem
escriver; é ter o que dizer e saber dizer.
"As ilustrações para o livro do Victor estão
m. interessantes. Se puderes estudar desenho como os allemães
o estudam serias um formidavel illustrador. Tenho aqui um album
de desenhos do A. Menzel, o mais assombroso desenhador allemão.
Cada pagina é uma obra prima mas a gente vê que formidavel
dose de estudo." |
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