Neste texto foi mantida a grafia original
 
A "TOURNÉE" DA INSTRUCÇÃO ARTISTICA DO BRASIL

Fala á "Folha da Noite" o brilhante escriptor Menotti Del Picchia
 
Menotti del Picchia, vive produzindo. Não toma folego. Não se descuida de sua mentalidade, e por isso mesmo evolue continuadamente. Cada instante de renovação vem encontral-o alerta - vibrando productividade. Na galeria de seus livros existem todos os matizes das estheticas e dos pensamentos. Talvez seja a sua propria, unidade mental essa desunião vibrante de escolas e credos literarios. O que não cabe duvida, a ninguem é a projecção do seu destino sobre a mocidade brasileira. O nome de Menotti tem o dom da ubiquidade: tanto está no sul, no centro, quanto ao norte do paiz. Agora, confirmando o que acima escrevemos, elle inciará uma série de conferencias. Trabalhando sempre, Menotti irá agitar um pouco mais o nosso meio, distribuindo belleza e pedindo espiritualidade para esse momento angustioso do Brasil. A proposito de sua proxima palestra, assim nos falou: - "A Instrucção Artistica do Brasil quis a cooperação de um poeta, desta vez de S.Paulo, para os seus recitaes. Acceitei com prazer o convite porque tenho na maior conta a funcção educativa, que merece o mais carinhoso apoio do publico em geral e de todos os intellectuaes do paiz, uma vez que em todo o paiz elle se irradiará. O Brasil viu falhar ruidosamente o espirito de accentuado materialismo de que andava impregnado. Cuidar mais da instrucção, das coisas do espirito é pugnar por um programma do maior alcance social". - E qual a situação dos artistas perante a Instruccção Artistica? - "A Instrucção tem uma dupla e utilissima finalidade: preparar platéas, facilitando o constante contacto entre nossos valores artisticos e o publico e facilitar a este, por meio de uma especie de cooperação, o facil accesso ás nossas possibilidades artisticas. Até hoje julgou-se o artista uma creatura decorativa, podemos arriscar mais: inutil... Isso é triste de se registar, mas é verdadeiro. Delles se lançava mão geralmente para recitaes de beneficencia onde os artistas entravam com o trabalho, e seus fidalgos organizadores colhiam as glorias da iniciativa e as instituições os proventos. Todos se esqueciam dos sacrificios, do arduo esforço despendido para se crear uma individualidade, da quasi geral precaridade dos seus recursos pessoaes. Em toda parte do mundo onde um povo alcança um ponderavel nivel cultural, os artistas acabam creando sua independencia, senão dispondo de formidaveis fortunas. Não preciso citar a situação de um Paderewsky, de um Shaw, de um Remarque, de um Wells... Mesmo os secundarios possuem uma situação invejavel. Veja-se o que legou, recentemente, aos seus herdeiros Edgard Wallace. Veja-se o que tem ganho Dekobra. No Brasil insistia-se no miraculoso phenomeno de se ver um artista viver de brisas... Isso não depunha contra o espirito de sobriedade e de sacrificios dos eleitos de Apollo. Pelo contrario. Póde-se dizer sem maldade que era um liberllo contra o meio. A Instrucção, já com uma larga projecção entre nós, creou, tornando extremamente accessiveis os seus ingressos nos recitaes, cultas e enthusiasticas plateéas. Só não coopera em tal sociedade quem não quer encontrar opportunidades para se instruir. A esses Deus ajuda na sua infinita misericordia". - E o que nos diz dessa "tournée"? - "Seu exito integral garante-o a arte de d.Irene da Cunha Bueno, uma das mais bellas e educadas vozes que o Brasil possue. Quanto a mim, realizarei uma palestra essencialmente literaria, falando da alma brasileira , que aliás, não existe ainda. Mais do que eu falarão pela minha voz nossos maiores poetas do norte, do centro e do sul. Quanto á Instrucção preciso assignalar o devotado esforço de uma das suas directoras d.Helena de Magalhães Castro, organizadora excellente e artista que acaba de realizar um "tournée" triumphal".
 
Publicado na Folha da Noite
Data de publicação  08.abr.1932
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