São Paulo, quarta-feira, 16 de setembro de 1925
Neste texto foi mantida a grafia original


ULTIMAS PALAVRAS DE REIS NO SEU LEITO DE MORTE


E' grande o numero de reis que em toda a sua vida jamais falaram com tanta sinceridade como nos seus ultimos momentos: em todos os paizes ha existido um monarcha que esperou essa solemne ocasião para reconhecer seus erros ou suas faltas. Felippe III, em seu leito de morte, voltou-se para um dos seus ministros e lhe disse: - "Boa conta vamos dar a Deus de nosso governo!" As ultimas palavras de Carlos IX da França, atormentado pela recordação de Saint Barthelemy, foram estas: - "Quanto sangue! Quantos crimes! Que Deus me perdoe o mal que fiz!"

A história da Inglaterra conserva as ultimas phrases pronunciadas por alguns de seus reis, que tambem não deviam ter a consciencia muito tranquila. A rainha Isabel morreu exclamando: - "Todos os meus bens por um momento de vida!" Guilherme II perguntava, ao morrer: - "Isto póde durar ainda?" e Ricardo III gritou, na sua agonia: - "Traição! Traição!" Estas palavras contrastam com as do grande Carlos V, que ao expirar, em Juste, com serenidade e resignação commovedoras, estirou a mão para tomar um crucifixo, murmurando: - "Já é tempo, Jesus!" E exhalou o ultimo suspiro.

Outro rei da Hespanha, Fernando, o Santo, teve uma morte egualmente christã: considerando que morrer era o acto mais glorioso de sua vida, ordena em seu último instante aos sacerdotes que entoassem um "Tedeum", e, ao começar o canto, expirou. E' tambem digna de menção a resignação de Luiz XV da França, que ao ver os seus cortezões chorando, junto ao seu leito de morte, lhes perguntou: - "Porque choraes? Suppunheis que eu ia viver eternamente? e logo acrescentou: "Pensei que era mais dificil morrer!" - "Um rei deve morrer de pé", exclamou, ao deixar a vida, Luiz XVIII, da França. Jacob V, da Inglaterra, que recebeu, quando agonizava, noticias do nascimento de sua filha Maria, a famosa Maria Stuart, disse propheticamente: - "A coroa veiu por uma mulher e se irá por uma mulher".

Muitos soberamos se têm preocupado mais com os outros do que comsigo mesmos, em seus ultimos momentos. Exemplo: Alexandre I, da Russia, que, depois de excusar-se da sua servidão com os incomodos causados pela sua longa enfermidade, dedicou suas ultimas phrases á sua esposa, dizendo com profunda ternura: - "Deves estar cansada, Izabel!" Taes palavras recordam a phrase "Pobre Carlota!" que pronunciou o imperador Maximiliano, no momento de ser fuzilado.

Outros monarchas se têm sentido inclinados ao perdão das ofensas e suas phrases derradeiras respiraram a mais nobre generosidade.

O grande Carlos III, ao perguntar-lhe o patriarca das Indias si perdoava a seus inimigos, respondeu: - "Pois havia de esperar este transe para perdoal-os? Todos foram perdoados no acto da offensa".

Ricardo I, da Inglaterra, tambem morreu perdoando: acabava de ser ferido por uma flecha de Bertrand de Gourdon e ao vêr que este havia cahido prisioneiro, disse, nos estertores de agonia: "Jovem, eu vos perdôo"; e, voltando-se para os creados, ordenou-lhes: - "Tirae-o das correntes, dae-lhe cem shilings e deixae-o ir livremente".

Luiz XIV, rei da França, não viveu o bastante para terminar sua ultima phrase: - "Francezes, (gritou do cadafalso) morro innocente dos crimes que me imputam: pedi a Deus que o meu sangue não caia sobre a França. Si ..."

Um rumor de tambores o interrompeu e embora tivesse pedido em gritos que o deixassem continuar, foi impossivel ouvir-lhe uma palavra mais.

As ultimas palavras de alguns reis contemporaneos tambem se fizeram celebres. Alberto, esposo da rainha Victoria de Inglaterra, disse: - "Tive riquezas e dignidades, e poder; porém, si tivesse tido apenas isto, quão infeliz teria sido!" E as palavras com que Affonso XII passou desta para melhor foram: "Que conflicto! Que conflicto!".
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