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As relações do autor de "Flores do Mal"
com a madame Sabatier datam da época em que o poeta, vivendo
no famoso hotel Pimodan, frequentava assiduamente a casa de Fernando
Boissard, cujo sumptuoso salão servia para as sessões
do "Clube dos Haschischins".
Era moda, naquelle tempo, que as mulheres aprendessem a natação.
E Sabatier aprendia a nadar para não desmerecer, a sua reputação
de mulher elegante.
A escola de natação ficava no bairro de Anjou e sempre
ao regressar Sabatier ia dar dois dedos de prosa com Boissard, Gautier,
Baudelaire e outros familiares da casa.
Sabatier era alta e bem proporcionada; sua cutis era fina e rosada
e seus cabelos brilhavam como reflexo do cobre.
Bocca e mãos pequenas e, um ar de ingenua que attrahiam e
encantavam.
Mulher de grande cultura, em sua casa reuniam-se literatos e artistas.
Amavel e affectuosa para com todos, fazia que entre os que accorriam
à sua casa reinasse a maior camaradagem.
Por sua belleza, intelligencia e bondade, produziu grande impressão
sobre Baudelaire.
Mas, o autor do "Paraisos Artificiaes" era um timido e
tinha grande temor ao ridiculo.
Não se atreveu a declarar-se à linda mulher, porque
não poude encontrar palavras apropriadas e temia que Sabatier
levasse tudo em brincadeira.
Aos 33 annos agiu como um jovem enamorado: disfarçando a
lettra, dirigiu, à sua adorada durante cinco annos, cartas
e poesias impregnadas de uma respeitosa e mystica paixão.
"Eu lhe peço perdão - escrevia elle - por esta
imbecil correspondencia anonyma, mas sou egoista como as creanças
e os enfermos. Penso nas pessoas amadas quando soffro; geralmente,
penso em você "em verso" e quando está feita
a poesia não posso resistir ao desejo de que a conheça
a pessoa a quem foi dedicada.
Mas ao mesmo tempo, occulto-me como alguem que teme o ridiculo".
Durante um lustro Baudelaire não trabalhou, não viveu
senão para ella.
Apezar de suas numerosas aventuras passionaes e de seus severos
juizos sobre a mulher, experimentava pela primeira vez em sua vida
uma exaltação amorosa só comparavel à
dos antigos poetas - Dante, Petrarca - que cantavam "a doce
senhora dos seus pensamentos".
As suas melhores poesias datam dessa época.
Mas que pensava daquelle amor Bertha Sabatier?
Demasiado feminina para não ter advinhado logo o nome do
seu mysterioso idolatra, não deixou entrever que o houvesse
descoberto.
Mas não permanecia insensivel ao culto do poeta.
Em 18 de Agosto de 1857, por occasião do processo que se
instaurou a respeito do seu livro "Flores do Mal", Baudelaire
escreveu a ella pela primeira vez sem disfarçar a lettra,
firmando o seu verdadeiro nome, e supplicando-lhe ardentemente que
"fosse seu confidente e guardasse segredo sobre tudo quanto
lhe dissesse".
Declarado o amor, Bertha escrevia ao poeta: "Posso dizer-te
sem exaggero que sou a mais feliz das mulheres e que te amo com
toda a minha alma. Faze de mim o que queiras, pois pertenço-te
em absoluto".
Mas o amor de Baudelaire, correspondido assim tão rapido
e amplamente, soffreu um grande abalo e o poeta, em uma carta bastante
cruel, deu sciencia disso a Sabatier.
Por que assim occorreu: Ninguem o diz, até hoje.
Muitos querem ver ahi a vingança de quem fora desdenhado
primitivamente e que contrapunha o desdem ao velho orgulho.
"Até poucos dias - diz Baudelaire - tu eras uma divindade,
um ser formoso e inviolavel. Agora não és mais do
que uma mulher. Oh! que desengano! Demais, temo desgostar esse pobre
homem que continua tão cégo e enamorado como dantes".
Aqui Baudelaire alludia a Mosselmam, o protector official de Bertha
Sabatier.
Mas se de facto amava, por que esses escrupulos? A paixão
não conhece essas delicadezas e ignora a piedade.
Isso causou profunda dor à Bertha, que amava verdadeiramente
o poeta. Não sabia que conjecturas fazer. Soffreu e resignou-se.
Chorou sua desillusão.
Mulher, não fugiu aos despiques, mas estes foram tão
suaves que não feriram o ingrato.
Em uma carta, Bertha escreveu:
"O meu coração está mais tranquillo e
aconselho que não tenha debilidades. Chegará a descer
até o grau de calor que tu desejas. Soffrerei, indubitavelmente,
mas supportarei por ti as maiores torturas".
Tudo havia terminado e não se fallava de amor entre elles.
A fogosa paixão de Baudelaire extinguira-se de golpe.
Continuou frequentando a casa de Sabatier, mas esta dahi então
só foi para elle a amiga affectuosa, quasi maternal, que
o exhortava ao trabalho.
O que Bertha pensava daquella situação e como a suportava
é um desses mysterios femininos que em vão se procuraria
decifrar. |
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