|
O momento atual tem profundo significado para nós. É
o momento em que as Américas se definem pela América
e em que os homens americanos devassam as terras americanas em todas
as direções. Parece-nos mesmo, que o americanismo
passou do plano exclusivamente político e económico,
para integrar as preocupações dos homens médios.
Assim, não é mais fórmula aproximadora de nações,
um pã-americanismo, mas uma realidade unificadora de povos,
isto é, de individuos e ideais.
Nós, no Brasil, já tivemos no passado homens que lutaram
pela aproximação americana, e muito trabalharam para
isso. Rio Branco e Joaquim Nabuco foram americanistas por excelência,
se entendermos o americanismo como forma de incrementar as relações
entre as nações americanas, à moda de Monroe.
Depois desses dois estadistas, houve altos e baixos relativamente
à aproximação continental, entre nós,
predominando, como sempre, o sentido de maior compreensão
americana. O nosso momento, entretanto, é original. As Américas
tornam-se América através das gerações
novas. Pela primeira vez, de norte a sul, os moços participam
intensamente da vida e dos problemas americanos: é a função
que estão realizando as universidades, as grandes instituições
que concedem bolsas de estudos, as missões de divulgação
cultural e os próprios governos. E só desta maneira
podem os americanos se por em contacto com os problemas reais da
América, problemas que são nacionais sob certos aspectos,
mas que sob outros são americanos e mesmo universais. Tambem
se apresenta como o único modo para uma compreensão
ampla, do americanismo, pois o conhecimento da nova formação
e dos problemas atuais, está, sem dúvida fornecendo
uma outra América à geração nova, a
América que é hoje, e não as Américas
da época colonizadora, entrepostos comerciais das grandes
potências européias.
O americanismo não é um problema. É antes,
uma realidade ou, diríamos melhor, uma contingência.
Veiu-nos com o descobrimento, com a fixação do homem
à terra, com as necessidades impostas pelo meio aos novos
elementos étnicos, criando um ambiente de rudeza e de fraqueza
que observamos em todos os povos da América, sejam do norte
sejam do sul, latinos ou não. Embora as soluções
não tenham sido idênticas, as situações
foram constantemente as mesmas. O negro, por exemplo, na América
do Norte foi segregado, enquanto no Sul, entre nós, fundiu-se
em grandes proporções aos demais elementos étnicos.
Mas o tráfico e a escravização inicial do negro
foi uma contingência, lá como aquí.
E quais foram os primeiros civilizados da América? Os homens
da ombridade e da sombranceria, os homens de punho de ferro e coração-fornalha.
Formamo-nos, todos, aos poucos e de empréstimo. Transplantamos
homens e cultura e vivemos o mesmo drama da liberdade selvagem,
do homem liberal por contingência e formação
e de um democratismo sui-generis: o obedece-me que serás
benquisto e digno. Democratismo, aliás, que resultou do encontro
de duas atitudes antagônicas: o autoritarismo individual do
europeu dominante e os padrões propriamente democráticos
de conduta, impostos pela realidade, pois aquí até
a tolerância foi, historicamente, uma contingência.
Nisso a América superou o homem...
Atualmente, mais que no passado, somos os homens que lutam por duas
soluções: a étnica e a económica. Começamos
um processo e não percebemos seu fim e dele conhecemos apenas
certas fases já realizadas. Como se definirá cada
tipo étnico americano e quando? Como serão resolvidas
as questões sociais implicadas pela nossa formação?
Qual o sentido que tomarão as relações entre
brancos e não brancos em cada país americano e como
influirão na tendência de maior aproximação
americana? E qual vai ser a afirmação económica
de cada pais americano? Seguirão a linha imposta pelos recursos
naturais ou procurarão futuramente criar um organismo económico
autárquico, mesmo que artificial? Seguirão a divisão
natural dos mercados, compreendendo a complementaridade dos mesmos,
ou criarão economias nacionais em conflito, como já
o fizeram os europeus? Como influirá a situação
económica de cada pais nas relações das Américas
como América no futuro? Quais os aspectos que tomarão
as relações sociais nessas sociedades? Porque estamos
em processo tudo são perguntas, e valem tanto aqui como acolá.
Somos, quasi, a mesma gente. Pelo menos vivemos as mesmas situações
e temos que resolver problemas fundamentalmente semelhantes.
Somos os mesmos homens sem "finesse", os homens de mãos
calejadas que constroem o mundo brilhante e enfatuado de amanhã.
O mundo americano realizado e das idéias voltadas sobre si
mesmas. Porisso somos os homens da tragédia e sentimos palpitar
a selva que estua violentamente neste mundo híbrido e em
realização. Nós o sentimos porque o estamos
criando, e o sentimos não como criadores, mas ingenuamente,
sem malicia e profundeza porque ele nos parece grande demais para
ser criado por alguem -mesmo milhões de pessoas em dezenas
de gerações.
Porisso falamos em mais América. Este mais América
significa um maior conhecimento recíproco de formas e não
de conteudos, como poderia ressaltar do que já dissemos no
artigo. Contudo não deixa de ser necessário e fecundo,
emprestando um carater muito simpático a esse bandeirismo
inter-continental e verdadeiramente americanista das novas gerações.
|
|