Nomes
e Datas
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DIP - Departamento
de Imprensa e Propaganda, criado pelo decreto lei nº.
1949 de 30/12/1939. Era o órgão encarregado
de praticar a censura nos jornais
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Embaixador Americano - Jefferson Caffery foi o embaixador
americano no Brasil no período de 1937 a 1944 |
Goes Monteiro -
General Pedro Aurélio de
Goes Monteiro, nasceu em Alagoas em 1889 e morreu em 1956, no
Rio de Janeiro. Em 1932 comandou as forças fiéis
ao governo de Getúlio Vargas
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São Paulo, sábado, 6 de janeiro de 1979
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Jornalistas
contam a História 2
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OS ENSINAMENTOS DOS ANOS 30
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Depoimento
de RAIMUNDO MAGALHÃES JR.
ao repórter
Gilberto Negreiros
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Num momento como este, quando há pressões
de todos os lados e os condutores do regime vigente, instaurado
pelo movimento de 1964, se mostram empenhados em promover
o "aperfeiçoamento democrático das instituições",
é oportuno lembrar fatos do período de 1944/45,
que culminou na derrubada da ditadura de Getúlio
Vargas. Os acontecimentos dessa fase foram presenciados
por Raimundo Magalhães Jr., censor de cinema no início
do Estado Novo e, depois de passar dois anos no exterior
para não ser preso, signitário do manifesto
de março de 1945, em que os jornalistas denunciaram
à nação o regime ditatorial.
A partir do seu depoimento, é possível, parodiando
uma frase tão do gosto dos políticos antes
de 64, afirmar: Lembrai-vos de 45. Afinal, Getúlio
Vargas foi deposto justamente quando se empenhava no aperfeiçoamento
de seu Estado Novo, com a anistia, novos partidos e até
eleições gerais. É bom recordar também
que, se na época foi permitido para Filinto Muller
um dos responsáveis pelas torturas praticadas
na ditadura saísse no final de tudo
incólume e protegido pelas imunidade do mandato de
senador.
A carreira de Raimundo Magalhães Jr. na grande imprensa
carioca começa em agosto de 1930, quando participou
da fundação do já extinto "Diário
de Notícias". Entre passagens amenas, como a
primeira entrevista dada por Carmem Miranda, publicada pela
"Vida Doméstica", ele determinou que fosse
feita uma reportagem com João Cândido, que
em 1910 liderara a Revolta da Chibata, uma insurreição
dos marinheiros contra os antigos corporais que recebiam
nos navios da Armada. Publicada a reportagem, Raimundo Magalhães
Jr., conta ter recebido telefonemas anônimos perguntando
se ele queria experimentar a chibata.
Após a derrubada da ditadura, retornou ao "Diário
de Notícias", onde permaneceria como um dos
seis articulistas políticos até o início
dos anos 60, acumulando o exercício do jornalismo
com o mandato de vereador pelo antigo Distrito Federal (pertencia
ao Partido Socialista Brasileiro). A chamada redemocratização
foi, portanto, acompanhada de perto por Raimundo Magalhães
Jr., para quem o precedente aberto com a cassação
do registro do Partido Comunista Brasileiro e dos mandatos
dos parlamentares eleitos por sua legenda, "foi o primeiro
grande erro do regime de 46".
Eu queria colocar como questão inicial justamente
o "Diários de Notícias", que teve
sua grande fase no Estado Novo.
O seu proprietário, Orlando Dantas, foi o único
dono de grande jornal a ser preso durante o Estado Novo,
se não me engano, não é isso?
RAIMUNDO MAGALHÃES JÚNIOR Não
sei, mas se foi preso foi por muito pouco tempo e, naquela
época, era comum diretor de jornal ter problemas,
quando não se rendia às diligências
do governo. Muitos jornalistas foram presos, mesmo antes
do Estado Novo. Edmundo, Paulo Filho, Paulo Bittencourt,
vários deles foram presos. É raro o jornalista
de oposição que não teve um período
turbulento, um período delicado na sua vida. Eu não
sei propriamente essa prisão do Dantas, se foi, foi
uma prisão rápida ou então coincidiu
com o período em que eu não estava no Brasil.
Eu passei três anos ausente, durante o Estado Novo.
Eu estive fora primeiro o ano de 1940 e novamente em 42
e voltei em 44. Em 1942 eu estive prá ser preso,
mas consegui sair do País, fui para os Estados Unidos,
voltei dois anos depois, já estava tudo esquecido,
mas não foi por causa de artigo no "Diário
de Notícias", porque eu não escrevi nada
naquela ocasião.
Qual foi o fato então?
RAIMUNDO - Eu escrevi em dezembro de 1941 um artigo
com o título: "Pisando na Cola da quinta Coluna",
pouco depois do bombardeio de Pearl Harbour, e fazia uma
insinuação de que um dos mais fortes redutos
do nazismo no Brasil era o Ministério da Guerra.
O depoimento que eu vou te dar sobre o Dantas, em primeiro
lugar é o princípio do "Diário
de Notícias", eu fui um dos fundadores do "Diário
de Notícias" e trabalhei lá com Dantas
uns três anos seguidos, de 1930 a 1933, mais ou menos.
E é curioso que, nessa época, Orlando Dantas
era mais um homem de administração de jornal
do que mesmo um diretor, ele tinha os diretores intelectuais,
que era o Nóbrega da Cunha e Alberto Figueiredo Pimentel
e tinha um redator-chefe muito bom que era o João
Maria dos Santos, um negro de grande talento, educação
na França, era um jornalista de grande capacidade,
brilhante mesmo e o "Diário" ia mal nessa
época, ia muito mal e ele começou pouco antes
da Revolução de 1930, começou em agosto
de 30.
Como jornal de
oposição?
14.mai.55/Folha Imagem
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Juarez
Távora
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RAIMUNDO É,
como jornal de oposição. E logo de entrada,
logo depois da revolução, houve umas tolices,
porque havia um redator político no jornal, chamado
Agripino Nazaré, que depois, parece, foi ministro
da Justiça do Trabalho, foi figura graduada no Ministério
do Trabalho e era um homem destabocado, meio metido a revolucionário
e logo que triunfou a revolução de Getúlio
ele deu uma manchete que desgostou muito a Dantas. O Dantas
arrancou o cabelo. A manchete era: "Todo Poder a Juarez
Távora". Ele queria transformar o Juarez Távora
em ditador, aquilo foi um escândalo tremendo. Eu fui
secretário de uma edição da tarde do
"Diário de Notícias", essa edição
saía, mais ou menos, ao meio-dia e mantinha uma parte
da matéria da "Folha da Manhã".
Uma ocasião
o jornal estava em dificuldade e o Artur Bernardes foi procurar
o Dantas e declarou que ele queria comprar umas ações
do "Diário de Notícias", e Dantas
disse que não queria intromissão de políticos
no "Diário de Notícias". Ele disse:
não, eu quero comprar umas ações, mas
eu quero ficar longe do seu jornal e no dia em que você
tiver condições para me recomprar as ações,
você compra. E trocou uma carta com o Dantas nesse
sentido.
O Dantas, então, vendeu ações a ele
e mais tarde, realmente, recomprou sem nenhum lucro para
o Artur Bernardes. Quer dizer, foi um capital que Bernardes
imobilizou. Evidentemente não era grande coisa naquela
época: 200 contos, 300 contos. Hoje isso é
ridículo, mas naquela época era alguma coisa,
né? Foi uma independência tremenda. Agora,
ele tinha seus preconceitos, ele era sistemático,
um homem sistemático nas oposições,
nas opiniões.
Ele trabalhou com o Assis Chateaubriand, vocês sabem
disso. Ele começou a vida de imprensa dele nos Associados.
Rompeu com o Assis. Depois desse rompimento é que
ele botou o "Diário de Notícias"
para fazer frente aos "Associados", ele não
reconhecia no Assis Chateaubriand nenhuma qualidade maior.
Também não tolerava o Getúlio. Principalmente
depois do rompimento. No princípio o jornal era um
jornal revolucionário, mas depois...
Esse rompimento se dá quando?
RAIMUNDO Ele se dá com a Revolução
de São Paulo, em 32
Ele toma partido de quem?
RAIMUNDO Ele toma partido moderado porque não
era possível, porque havia uma pressão grande,
mas ele tinha simpatias. Daí ele começou a
se afastar e então quando veio o problema da candidatura
José Américo e o "Diário de Notícias"
embarcou nela e houve aquela atrapalhada. Aí então
ele foi definitivo.
Em 52 eu fiz uma viagem à Europa. Fiquei seis meses.
Não deixei de escrever meu artigo um único
dia no "Diário de Notícias". E da
parte de Orlando Dantas muitas vezes as minhas opiniões
não coincidiam com as dele, porque eu não
era tão sistemático e, além do mais,
ele era um liberal e eu era um socialista. A minha opinião
era uma opinião socialista.
Então, muitas vezes eu escrevia um artigo com opinião
inteiramente contrária à opinião do
Dantas. Entrava lá, ele estava, eu ia sempre falar
com ele, uma vez, duas por semana eu ia ao
"Diário de Notícias". Chegava no
gabinete dele: "Olha, Dantas, como vai e tal".
Ele dizia: "Olha, aquele teu artigo de anteontem, eu
não estou de acordo com nenhuma linha daquele artigo,
mas eu sou como Voltaire, eu deixo que vocês digam
o que quiserem, mas depois eu respondo nos meus editoriais".
E assim Osório Borba, que também era um homem
de opinião muito diferente da dele às vezes,
ele não intervinha, ele dava resposta depois no editorial,
que representava a opinião do jornal. Ele queria
- era golpista ele - já aí não é
tão liberalista, tão liberal, não é?
Queria sanear o País pelo golpe e tal, mas desde
que o golpe fosse com elementos como o Eduardo Gomes, uma
figura assim. Mas o Osório Borba, Rubem Braga, Joel
Silveira, eu, e outros, nós dávamos a nossa
opinião e não havia problema nenhum. Nunca
houve um choque. Agora, depois que ele morreu, a primeira
vez que eu entrei em choque no "Diário de Notícias",
fizemos polêmica em duas ou três vezes no editoriais,
na quarta ou quinta vez, o Prudente de Morais Neto, me telefona
e diz: "Olha Magalhães, tenho que te comunicar
uma coisa desagradável, teus artigos não podem
sair mais". Eu disse: "Já contava, estava
esperando por isso".
Agora, voltando a um ponto que foi abordado por você.
O Orlando Dantas foi o único que não recebeu
dinheiro do governo na época da ditadura. Era essa
uma exceção?
RAIMUNDO Eu não digo que tenha sido o
único, eu não posso, eu não sei, realmente,
quem recebia dinheiro. Agora sei que outros jornais frequentavam
bastante o gabinete do Lourival Fontes. Sei que alguns fizeram
parte de um Conselho de Imprensa.
É, o Conselho Nacional de Imprensa
RAIMUNDO Que decretava punições
para aqueles que escreviam coisas contra as determinações
do DIP.
Que tipo de punições eram?
RAIMUNDO A punição era a suspensão
do jornal por 5 dias, por 10 dias, proibição
da importação de papel e outras coisas assim,
eram tremendas.
Agora, esse período, início de 45, a decomposição
do Estado Novo, como é que o "Diário
de Notícias" marca a posição dele
nessa fase. Getúlio tentando se segurar ainda no
Poder.
RAIMUNDO Não, o "Diário de
Notícias" entrou na campanha, mas não
foi ele que abriu a campanha. Aí houve algumas coisas,
que determinaram a queda das ditadura. Foram: o congresso
de escritores em São Paulo, já aquilo foi
um desafio...
Em 1945?
20.out.77/Folha
Imagem
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O
escritor José Américo de Almeida
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RAIMUNDO
Em 44, logo depois desse congresso de escritores,
veio a conspiração pela entrevista do Zé
Américo de Almeida. O Zé Américo de
Almeida é o candidato das esquerdas, não vamos
dizer o contrário, o Zé Américo, quando
foi candidato em 37, ele era o candidato das esquerdas.
Os manifestos, a favor do Zé Américo são
assinados por todos os intelectuais de esquerda do Brasil.
Houve uma conspiração em fins de 44, princípios
de 45, e o instrumento dessa conspiração foi
o Carlos Lacerda. Ele foi mandado fazer uma entrevista para
sair simultaneamente no "Diário Carioca",
no "Correio da Manhã" e no "Diário
de Notícias", que eram os três grandes
jornais da manhã. Mas houve um problema qualquer,
um desencontro e acabou saindo só no "Correio
da Manhã". Depois, os outros publicaram.
Nesse episódio da entrevista do Zé Américo
fala-se, comenta-se, até hoje, da participação
da Embaixada americana.
RAIMUNDO Eu não acredito, o Getúlio
era "persona grata" dos americanos naquele momento.
Roosevelt veio aqui se encontrar com ele em Parnamirim,
ele tinha servido a todos os interesses americanos, o que
é que os americanos podiam exigir de Getúlio,
que Getúlio não desse? Deu a base, deu base
naval no Recife.
A guerra já estava terminada praticamente.
RAIMUNDO Estava terminada, mas eles não
tinham razão nenhuma para jogar fora o homem que
tinha valido a eles, naquele momento difícil. Eles
jogaram fora o Salazar que deu os Açores prá
eles, heim? Jogaram fora o Fulgêncio Batista, o Franco?
Então, está aí, já vê
que não havia motivos. Não, não acredito.
Se houve um movimento nacional depois, aí sim, aí
houve participação do embaixador americano,
que até foi chamado depois aos Estados Unidos. Parece
que o Departamento de Estado não gostou muito. Mas
ele era um liberal, mesmo.
Ele se entusiasmou demais?
RAIMUNDO Se entusiasmou e fez dois discursos.
Um para ser ouvido por jornalistas onde felicitava de o
Brasil marchar prá democracia e tal, restaurar e
tal, etc, as franquias, né? Essa coisa toda e o Getúlio
ficou danado com isso. Imediatamente os jornais oficiais
atacaram muito o embaixador por intromissão nos assuntos
internos.
Agora, a entrevista do Góis Monteiro é
dada com exclusividade ao "Diário de Notícias".
Quando o Góis Monteiro voltou do Paraguai, não
é?
RAIMUNDO Voltou do Uruguai e veio para liquidar
o Estado Novo.
Veio para derrubar Getúlio.
RAIMUNDO Liquidar o Estado Novo. Não,
liquidar o Getúlio, não. Liquidar o Estado
Novo.
O Estado Novo?
RAIMUNDO Ele disse que vinha liquidar o Estado
Novo, porque ele queria ser o antecipador das reformas políticas.
Seria uma ambição pessoal, puramente, ou
ele refletia, assim, uma apreensão do Exército?
RAIMUNDO Talvez ele não quisesse a divisão
das Forças Armadas, mas no fundo ele queria para
ele a Presidência da República. Esse homem
foi dominado por uma obsessão de chegar ao Poder.
Chegou ao Senado e nada mais do que isso, entendeu? E o
general Góis Monteiro era um figura muito curiosa.
Uma ocasião fiz uma entrevista com ele, quando ele
chegou dos Estados Unidos. Depois de fazer a entrevista,
na qual ele dizia que o general Eisenhower era um incompetente,
que o general Marshall era um toleirão, ele disse
as coisas mais tremendas sobre a organização
militar americana; ainda insistindo em que os alemães
só estavam sendo derrotados porque havia uma conspiração
mundial. Terminada a entrevista, ele disse: "lê,
lê que eu quero ouvir". Aí eu recitei
pra ele e cometi depois uma indiscrição, uma
tolice, que, jornalisticamente, eu não me perdôo
até hoje: Eu disse: "General, se fosse qualquer
outra pessoal que desse essa entrevista, não fosse
o senhor, essa pessoa corria o risco de ser fuzilada".
Ele disse: então, rasga e vamos fazer outra. E me
obrigou a rasgar, e deu tudo ao contrário do que
tinha dado. Você vê que coisa inacreditável?
Mas ele era muito inteligente. Era muito cínico e
muito inteligente.
Parece que ele se gabava de falar assim de malabarismos
de linguagem nas entrevistas dele.
RAIMUNDO Ele criava. Ele tinha o dom de criar
frases que pegavam. Ele criou uma vez um advérbio
assim: "Agirei niponicamente". Aí, isso
pegou, a imprensa toda fez.
Niponicamente agirei. Traiçoeiramente...
RAIMUNDO Agirei niponicamente. Não, é
de maneira drástica, quer dizer, como os nipônicos
estavam agindo na China e tal, devastando.
Agora, um ponto que eu queria abordar também é
essa questão de relacionamento do jornalista, o profissional
mesmo de imprensa e o DIP. Me parece que você foi
do DIP?
Mas você foi censor em que período?
RAIMUNDO Eu fui de 36 a 40. Aí,
o filme foi aprovado e produziu-se dentro do DIP não
era DIP ainda era Departamento de Difusão. Produziu-se
um pânico lá dentro porque disseram que iria
haver intervenção do Ministério da
Guerra, dentro do órgão.
Um outro ponto que eu queria saber também, você
falou na questão do Congresso dos Escritores, né?
E...
RAIMUNDO Eu não fui do Congresso dos Escritores,
mas acompanhei daqui, foi uma coisa importantíssima.
Mas ele foi muito marcante. Na época estava saindo
um ensaio de um escocês, (ou americano?) "Os
Irresponsáveis", em que ele anunciava a omissão
dos intelectuais na Europa diante do nazismo, não
é? Archibald Mac, não sei se você conhece,
na época era muito citado.
RAIMUNDO É isso. O Congresso foi muito
útil e ainda havia uns resquícios de integralismo
aí e tal. Uma coisa que também nunca pegou
com o Dantas foi o Integralismo, né? Nunca teve,
nunca deu guarida. Havia uma pressão muito grande
sobre a imprensa, naquela época.
Mas eles chegaram assim a algum grande jornal? Chegaram
a ter uma...
RAIMUNDO Não, aqui no Rio eles encontraram
resistência da maior parte dos jornais, a não
ser da "Gazeta de Notícias", que estava
inteiramente vendida aos interesses dos alemães.
Mas eles foram obrigados a fundar o próprio jornal,
aqui no Rio, chamado o "Ofensiva".
RAIMUNDO Eu fui do DIP porque comigo aconteceu
uma coisa muito curiosa. Eu não era do DIP eu era
de uma outra coisa que se chamava Departamento de Propaganda
e Difusão Cultural, onde estava a censura do cinema.
Eu era censor de cinema. Então, era um censor de
cinema muito liberal. Dentro da censura havia elementos
muitos liberais. Basta dizer o seguinte: que colegas meus
da censura eram Vinícius de Moraes, o Pedro Dantas,
Nazareth Prado, dos Prados de São Paulo. Agora, tinha
outra, tinha um católico chamado Perilo Gomes, que
era um homem do Itamaty; tinha outro do Itamaty, que foi
depois ministro, que era caricaturista, também, Nemésio
Dutra; houve uma senhora integralista, dona Maria Engraçadinha
Pena, dona Maria de Oliveira Pena; tinha o nome de Engraçadinha,
era mãe deste ministro Oliveira Pena, do Itamaty;
e dona Stela Guerra Duval e umas outras pessoas. Os problemas
nossos foram principalmente no tempo da revolução
espanhola. Nós recebemos vários protestos
da delegação da Embaixada da Espanha, porque
não aprovamos um filme chamado "Bloqueio".
O assunto era o bloqueio do portos espanhóis, apresentando
o fascismo de Franco de uma maneira bastante violenta. Bem,
tivemos problema com o "Último Trem de Madri",
e outros filmes dessa espécie. Mas o principal problema
foi o filme baseado no romance de Erich Maria Remarck, chamava-se
"O Regresso", "A Volta". Era a volta
dos soldados alemães derrotados na França
para dentro da Alemanha, e tentavam encontrar suas famílias,
seus filhos, seus lares, aquela coisa toda. Esse filme foi
aprovado por uma turma da qual faziam parte o Dantas, o
Vinícius, eu, e não me lembro quais outros.
Aprovamos o filme. O filme, realmente era muito bom, um
filme antinazista. E se não me engano já era
1939.
Voltando ao "Diário de Notícias",
por que é que ele era caracterizado como um jornal
que os militares tinham preferência?
RAIMUNDO Ah, pelo seguinte: é a coisa
mais interessante do Dantas. Na época da maior perseguição
ao jornal, ele colocou repórteres nos Ministérios
militares, para dar o maior noticiário possível
do interesse dos militares: promoções, remoções,
e tudo, festas militares e tal. De maneira que os militares
liam, sistematicamente, o "Diário de Notícias"
e então o editorial isso foi realmente
admirável da parte dele poder influir
num meio que podia mudar os caminhos do Brasil.
Mas considerado o tempo que o Estado Novo durou essa
tática não...
RAIMUNDO Não. Essa tática foi boa.
Agora ele tinha que manter aquilo. Compensava a ele do ponto
de vista de ter leitores qualificados. Agora, ele sabia
que aquilo era um coisa lenta, não vinha de um dia
pro outro, ele estava preparado pra isso.
Essa fase entre a derrubada do regime e a volta do regime
Constitucional de 46. Por exemplo, a questão das
torturas na Chefatura de Polícia.
RAIMUNDO Não, é o seguinte: é
sabido que o Filinto Muller fazia executar pessoas que ele
considerava inimigas das idéias do regime, que às
vezes eram inimigas das idéias pessoais dele. Ele
era um homem truculento e fazia uma sistemática de
repressão, através da Polícia Especial.
Era no Quartel da Polícia Especial, no Morro de Santo
Antonio, um lugar inacessível, onde não tinha
tráfego de civis e eles podiam bater à vontade,
o sujeito gritava e ninguém ouvia. E aí mataram
muita gente.
Derrubado o Estado Novo, ninguém tomou a iniciativa
de apurar, fazer a apuração desses casos,
assim?
RAIMUNDO Houve, mas não teve êxito
porque o Filinto Muller subiu imediatamente com o Dutra,
para posições políticas. Ele e os irmãos
em Mato Grosso, que era o Estado do presidente da República.
Ele teve imunidade sempre. Não deixou nunca de ter.
Morreu com imunidades. Morreu senador da República,
naquele acidente de avião, não é? Ele
procurou se colocar dentro do oficialismo. E, depois, à
medida que o passado vai ficando pra trás o negócio
vai sendo muito mais difícil.
Mas houve uma tentativa, houve uma CPI na Câmara.
RAIMUNDO Houve, mas não produziu nada,
você sabe como são essas coisas, né?
Mas a questão ainda das torturas do Estado Novo,
terá havido assim um acordo tácito pra não
se mexer no problema?
RAIMUNDO Não, não acredito. Talvez
dificuldades de obter os elementos necessários, porque
os cúmplices não iam se delatar, né?
Pegar médicos da Policia Especial que assinaram atestados
de óbitos, como colapso cardíaco de sujeitos
que levaram pancadas. Se hoje fizerem isso, você acha
fácil levantar isso hoje?
Sabe-se que houve muita violência no Morro Santo Antonio,
na Polícia Especial, aquilo era sabido, era mesmo.
Você viveu esse período de 45, esse processo
de agonia do Estado Novo e os fatos que estão ocorrendo
agora. Você traçaria um paralelo? Como você
compararia?
RAIMUNDO Eu não comparo pelo seguinte,
porque não é possível, é um
período histórico inteiramente diferente.
Em primeiro lugar, Getúlio, quando estabeleceu a
sua ditadura, ele outorgou uma Constituição
que não foi nem executada. Fechou o Congresso. O
regime que veio de 64 pra cá é um regime que
não permite a participação dos brasileiros
em geral no seu sistema, na vida política brasileira.
Mas ele se preocupou, com algumas formalidades que o Getúlio
colocou de parte: mantém um Congresso, ainda que
seja um Congresso de carimbo, mas mantém um Congresso.
E, dentro desse Congresso, de quando em quando, uma pessoa
se destaca lá e faz um discurso, um grande discurso.
Faz declarações que repercutem no País
inteiro e provocam um problema. Nós vimos isso, às
vezes, com o risco de ser cassado e tal, mas colocam os
problemas. Então, com toda a censura que houve para
a pequena imprensa e mesmo para a grande imprensa nesse
período, não se pode comparar com o período
de Getúlio de maneira nenhuma. O período da
ditadura do Getúlio foi uma ditadura realmente séria,
severa. Essa tem tido de quando em quando um endurecimento
e depois uma certa complacência, não é?
Então, para encerrar, eu lhe peço que diga
quando se aprecia a chamar redemocratização
de 46 com a atual.
RAIMUNDO A de 46 foi fraudada logo pelas cassações.
Foi o primeiro erro eu considero aquilo um
erro que foi um processo de degeneração.
A cassação dos mandatos...
RAIMUNDO Dos mandatos comunistas, que abriram
caminho para a cassação de outros mandatos,
que é uma coisa sem precedente no Brasil. Onde é
que você encontra esse precedente?
Eu acho que foi um erro, um erro grave. Os comunistas não
teriam chegado ao Poder, como não chegaram na Espanha
agora. Eles eram a minoria e os regimentos das Casas de
Congresso não permitiam que eles tivessem atuação
muito significativa. Não podiam perturbar o processo
Legislativo. Eu achei uma coisa inteiramente errada. Agora,
que a lei eleitoral no início foi boa, isto foi.
Porque permitiu a organização de todos os
partidos, a organização partidária
mais fácil. Agora nós temos esse bipartidarismo
que não pode substituir. Eu acho que uma das coisa
a corrigir é essa.
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