"Sob
uma calma aparente, numa fisionomia quase imovel, uma grande agitação
interior, uma paixão contida, uma vida intensa" -
assim se refere Paul Landormy em recente estudo sobre o compositor,
sua vida e sua obra.
Da mesma idade de Arthur Honegger, Darius Milhaud nasceu em Aix-en-Provence,
a 4 de setembro de 1892.
Sua familia amava apaixonadamente a musica. Em boa hora Milhaud
conheceu os classicos. Aprendeu violino e, uma vez por semana,
fazia parte, com seu professor, de um quarteto de cordas. Permaneceu
em sua terra natal até terminar seus estudos no liceu e
só foi a Paris depois de ter conquistado seu diploma de
bacharel. Depois dos quinze anos, começou a compor. No
Conservatorio de Paris, Darius Milhaud passa pelas classes de
Berthelier (violino), Lefevre, Paul Dukas (orquestra), Xavier
Leroux (harmonia), Gédalge (contraponto), Widor (composição)
e Vincent d'Indy (direção de orquestra). Em todas
estas materias, o jovem aluno destacou-se de forma notavel entre
seus companheiros de estudos. A guerra de 1914 fez com que Darius
Milhaud desistisse de concorrer ao Grande Premio de Roma. Tinha
então somente 22 anos.
Darius Milhaud é, dentre os compositores franceses contemporaneos,
o mais caro, talvez, ao coração dos brasileiros.
Isso porque viveu entre nós de 1917 a 1919, como adido
à embaixada da França no Rio de Janeiro, quando
era ministro Paul Clodel. Antes de regressar à França,
depois de deixar a embaixada no Brasil, visitou as Antilhas e
os Estados Unidos.
Entrementes, em Paris, Felix Delgrange havia organizado pequenas
salas de concerto, onde todos os jovens compositores da epoca
encontrariam oportunidade de executar suas obras. Erik Satie,
por sua vez, fundava uma nova sociedade musical ("Societé
de Nouveaux Jeunes"), da qual faziam parte Georges Auric,
Louis Durey, Arthur Honegger, Roland Manuel e Germaine Tailleferre.
De seu lado, Madame Jeanne Bathori introduzida nos Concertos de
Vieux Colombler as obras destes jovens compositores. O ambiente,
portanto, era extremamente propicio a Darius Milhaud que, em seu
regresso do Rio de Janeiro, se juntou aos compositores de vanguarda
de seu país. Este grupo, que passaria a exercer forte influencia
na nova geração de compositores, não somente
franceses mas de outros paises, é que veio a constituir
o famoso "Grupo dos Seis".
Entretanto, não se constituiram por assim dizer num "partido
musical", como seria de prever, praticando e defendendo uma
doutrina estetica comum. Pelo contrario, cada um deles conservou
sua independencia.
Darius Milhaud foi, na França, o apostolo mais eloquente
da politonalidade. A produção de Milhaud é
extremamente abundante. Suas primeiras obras datam de 1911, quando
apareceu sua Primeira Sonata para Piano e Violino. É uma
sonata ainda um pouco audaciosa em nossos dias. Não é
uma peça sutil e delicada como a musica de seu amigo Louis
Durey, por exemplo. Mas nela se nota, já toda a linguagem
musical de Milhaud, rude e vigorosa. Ela traduz estados dalma
sombrios, inconstantes, emotivos. Milhaud faz transparecer ali
toda sua chama interior. É o musicista da colera, do odio,
do desespero, do assombroso, de todas as paixões humanas
levadas ao paroxismo.
Os grandes tipos epicos ou tragicos sempre tentaram Milhaud. Nesta
ordem de idéias, "Agamemnon", "Les Choéphores"
e "Les Euménides" estão compreendidas
entre as obras nas quais o compositor manifesta mais completamente
seus excelentes dons musicais. Ninguem, como Darius Milhaud, sabe
jogar com tanta pericia os instrumentos de percussão. É
o que se nota, por exemplo, em seu balé "L'Homme et
son Désir", com cenario de Paul Clodel, nesta partitura,
faz-se ouvir, em periodos longos, somente a bateria e o ritmo
dos instrumentos de percussão, o que basta para provocar
a emoção. Toda a violencia dos desejos do homem,
toda a tortura que ela lhe inflige, são exprimidas somente
pelos instrumentos de percussão: é o ponto culminante
do drama.
Nem sempre, porem Darius Milhaud é aquele compositor violento,
cheio de vida, explorando o tragico e sombrio. Existem, em sua
obra varia e colorida, muitas peças onde se encontram notas
doces e ternas, notadamente em seu "Quarto Quarteto para
Cordas", há uma sonoridade extremamente suave; em
sua "Primeira Sinfonia" e em "Saudades do Brasil",
há uma graça encantadora. Sua "Sonatina",
para flauta e piano, é tambem de uma ternura à qual
ninguem poderá resistir. Suas "Primaveras", por
outro lado, já nos haviam revelado em Darius Milhaud uma
acentuada disposição bucolica. Jamais escreveu o
compositor paginas tão equilibradas, de uma linha tão
simples e seguras, como em sua "Sonatina". Nessa obra.
Milhaud latiniza-se. Olvidando, por um momento, suas tendencias
romanticas, suas paixões desordenada, sua fantasia exuberante,
ele parece encontrar esta sobriedade, esta nitidez classica tão
conformes com a tradição francesa.
Uma das obras principais de Darius Milhaud é "Cristovão
Colombo", drama lirico que alcançou exito consagrador
em sua estréia, a 6 de dezembro de 1936, na sala Pleyel,
em Paris. Entre suas obras capitais conta-se, tambem "A Criação
do Mundo", cuja primeira parte, a introdução,
é no dizer de Paul Landormy, "uma das coisas mais
admiraveis que se conhece".
Obras principais de Darius Milhaud: "Cristoval Colombo",
"La Brebis Égarée", "Le Pauvre Matelot",
"Les Malheurs d'Orphée", "Esther de Carpentras",
"Maximilien", "Simon Bolivar", liricas. "Le
Boeuf sur le Toit", "La Création du Monde",
"Le Train Blue" e "Salade", balés.
Três sinfonias, cinco pequenas sinfonias para pequena orquestra;
"Suite", "Carnaval d'Aix", "Carnaval
de Londres", "Ballade" para piano e orquestra,
e "Concertos" para piano e dois pianos, obras sinfonicas.
Catorze quartetos de cordas, um trio de cordas. "Sonata",
para flauta, clarinete e piano: musicas de camara. "Poemas
Judaicos", "Melodias Populares Hebraicas", "Alissa"
(8 melodias), "Chants de Misére" e "City
Prières": musica vocal. "Voyage d'éte"
(15 melodias) musica para canto e orgão.
- M.C.