TERMINOU O JULGAMENTO DO "TROTZKYSTAS"

Treze dos accusados foram condemnados à pena maxima - Trotzky continua atacando o governo sovietico

Publicado na Folha da Manhã, sábado, 30 de janeiro de 1937

Neste texto foi mantida a grafia original

MOSCOU, 29 - Terminou o julgamento dos accusados trozkystas, ás 19 horas. Os juízes recolheram-se em conferencia, afim de pronunciar a sentença.

O que os salvaram da pena de morte

MOSCOU, 29 - Treze dos dezesete "trotzkystas" accusados de tramarem contra a segurança do regime e a pessoa do dictador, foram condemnados hoje pelo tribunal vermelho à pena maxima, em espiação dos crimes de que se tornaram culpados.
Salvaram-se da pena de morte Radek, Sokolnikov e Arnold, condemnados a 10 annos de prisão e Stroilov, condemnado a 8 annos, da mesma pena.
Terminou assim o maior processo politico que a breve historia da União Sovietica recorda, depois de sete dias de depoimento, em que tudo concorreu para accusar a Allemanha e o Japão de estarem tramando uma nova guerra, provavelmente para o anno em curso, de que se prevaleceriam para arrancar o poder de Stalin, os lideres que hoje, pela ultima vez, se sentaram no banco dos réos.
Esses lideres, Radek, Piatakov e Sokolnikov confessaram amplamente que tinham aproveitado as altas posições que o regime lhes concedeu até ha pouco, para minar as bases da organização sovietica. Nas suas confissões revelaram todos os detalhes e schema do "complot", denunciando dezenas de cumplices, marcando com suas declarações uma nova era de prisões e de terror na União Sovietica.
Nas suas ultimas declarações, prestadas hoje perante o tribunal, os accusados confirmaram plenamente seus anteriores depoimentos, reconhecendo-se culpados de assassinatos e de actos de sabotagem, mas allegando para isso motivos de ordem psychologica e essencialmente politica.
Todos foram concordes em accusar Leon Trotzky como principal instigador dos seus actos. Todos, ainda, pediram clemencia, com excepção de Radek, Pitacov e Shestov. Este ultimo chegou até a pronunciar uma breve allocução, pedindo a pena de morte, afim de "lavar com seu sangue os crimes que commettera".
Radek e Piatakov tentaram justificar-se, allegando serem conjurados politicos, mas de nenhuma maneira delinquentes communs, nem assassinos.
As ultimas declarações dos dezesete réos imprimiram ao actual processo um carater totalmente differente do julgamento, em que foram condemnados Kamenev e Zinoviev, em que os accusados choraram, especulando sobre a emotividade dos jurados e dos juizes. Todos observaram o contraste apresentado pelos dois processos, sendo que os réos de hoje se limitaram estrictamente ao relato de factos, sem que por um momento apparecesse a nota dramatica, a dar emphase a seus depoimentos.

Os accusados inovam attenuantes para os seus crimes

MOSCOU, 29 - A sessão da manhã do Tribunal Militar, que preside ao julgamento dos accusados do "Centro Parallelo", foi consagrada às ultimas declarações dos accusados, que confirmaram os depoimentos precedentes.
Alguns delles invocaram circumstancias attenuantes para os seus crimes, isto é, pediram simplesmente que lhes fossem conservadas as vidas para poderem reparar os crimes que commeteram contra a patria. Outros, como Radek, por exemplo, que fez uma longa declaração, julgam merecer plenamente a morte e não solicitaram graças.
Após curta defesa, Kommodov solicitou ao Tribunal indulgencia para o seu cliente Pouchine, que rompeu com a organização trotzysta antes da sua prisão e fez no seu depoimento exposições sinceras e completas.
Platakov pediu ao Tribunal para acreditar na veracidade da sua affirmativa, quando declarou que desejava romper com a organização trotzkysta, desde que compreendeu que havia esta se transformado em agencia fascista e accrescentou que reconhecia em Trotzky o "principal criminoso e que, no entanto, infelizmente não se encontra entre nós".
Radek começou resumindo o processo, dizendo que as suas conclusões são as seguintes: - provam que a organização trotzkysta era encabrestada por todas as forças contra revolucionarias e provam que a organização preparava a guerra mundial.
Depois insurge-se contra o procurador que apresentou os accusados ao Tribunal como réos de direito commum e diz, que se fossem autores de delicto commum, não teriam dito a verdade.
"Tenho em minhas mãos - diz - a parte secreta da preparação de guerra. Não tenho o direito de occultar esse segredo e quero persuadir o mundo de que digo a verdade".
Accusou Trotzky de haver lançado uma outra organização terrorista, ainda não completamente desmascarada que se apoia em quadros importantes da administração da U.R.S.S. A seguir declarou Radek:
"Respondemos pelo crime de alta traição, segundo o rigor da lei, e queremos acolher a setenças do Tribunal como homens conscientes. Não tendo o direito de falar ao povo inteiro queremos dizer àquelles que estiverem identificados comnosco: - "A organização trotzkysta é o centro de todas as forças contra-revolucionaras."
A França e a Hespanha são outros paizes que precisam saber que o trotzkymo é sabotador, mas o principal - esse é o facto historico pelo qual pagamos com as nossas cabeças - é que o trotzkysmo é um instrumento manipulador de guerras. Não podemos pedir indulgencia e não a pedimos. Sabemos o que somos e quando Mouralov, amigo intimo de Trotzky, capaz de morrer sem confessar, declarou aqui que depôz a verdade para não se transformar em bandeira de toda a canalha contrarevolucionaria, o fez em nome de todos nós e é este o resultado mais significativo deste processo".
Após Radek falou Sokolnikov, que reconheceu tambem inteiramente o seu crime e accrescentou:
"Não podendo nos apoiar na mesa, descambamos para os "complots". Não podendo encontrar no paiz forças sufficientes mesmo para o "complot", procuramos apoio no estrangeiro."
Sokolnikov pediu, finalmente, ao tribunal acreditar na sinceridade da sua confissão e ser indulgente a seu respeito.
Mouralov tomou a palavra, declarando:
"Tornamo-nos alliados do fascismo, crendo poder nos servir delle para a luta, mas constatamos, ao contrario, que eramos uns joguetes em suas mãos".
Repetiu a seguir a declaração a que alludira Radek. "Não quero servir de bandeira para as forças anti-revolucionarias". Pediu ao tribunal para crêr na sua sinceridade.
No fim da sessão foram ouvidas ainda as ultimas declarações dos accusados Serebriakov, Bopgouslavski, Drobnis Norkine, Chestov e Stroileev. Todos pediram ao tribunal para acreditar na sinceridade do seu arrependimento.
Alguns pediram que lhes fosse conservada a vida para que se penitenciem dos seus crimes.
Na sessão da tarde foram feitas as derradeiras declarações dos restantes accusados: Arnold, Livchitz, Kniazev, Toutnok, Rataitchak, Grache e Puchine, que confessaram o seu pleno arrependimento e solicitaram indulgencia.
Às 19 horas os membros do tribunal se retiraram para deliberar.

As defesas do réos

MOSCOU, 29 - Terminada a leitura do libello contra os accusados trotzkystas, os patronos destes deram inicio à defesa.
Braude, defensor de Kniazeff, declarou que a principal responsabilidade dos crimes commettidos pelo accusado devia recahir sobre Trotzky e os dirigentes da organização contra revolucionaria trotzkysta, que se achavam no bando dos culpados, assim como sobre os serviços japonezes de esplonagem.
Reconhecia, no entanto, que o accusado Kniazeff devia soffrer severo castigo pelos accidentes ferroviarios que provocará e que haviam causado mortes, assim como pela espionagem a que se empregará .
Braude mostrou em seguida como o accusado fôra recrutado pelos trotzkystas e o serviço japonez de espionagem e como o sr. X., agente japonez de espionagem recorrera a "chantage" e à intimidação para alistal-o no serviço de espionagem.
Pediu finalmente ao Tribunal que levasse em conta o completo arrependimento do acussado e lhe conservasse a vida.
Kaznatcheeff, defensor de Arnold, allegou igualmente em favor do accusado as ameaças e intimidações de que usará a organização trotzkysta para recrutal-o, accentuando que se verificara que só depois de ameaçado de morte é que o acusado consentira em preparar actos de terrorismo, para cuja pratica, por duas vezes, lhe faltará coragem no ultimo instante. O accusado não commettera pois, de facto, actos terroristas, não executára as monstruosas instrucções da organização dos trotzkystas. A defesa pedia assim ao Tribunal que attenuasse a condemnação do accusado.

Trotzky ataca o governo do seu paiz

MEXICO, 29 - Em entrevista aos jornaes, Trotzky declarou que a G.P.U. elaborou duas versões do "complot" terrorista attribuido aos trotzkystas; uma versão original, brutal falsificação policial, directamente attribuida a Stalin, "para uso interno" e na qual se apresenta Trotzky como um trahidor fascista, puro e simples, vendido à Allemanha; a segunda, mais subtil, "folhetim diplomatico complicado, estylo Radek, para os delicados eruditos amigos da U.R.S.S.", apresenta Trotzky como alliado temporario dos fascistas, para o desmembramento da U.R.S.S. que annullaria as revoluções subsequentes na Allemanha e no Japão.
Trotzky conclui suas declarações recordando que preferiu romper com centenas de amigos a fazer a defesa incondicional da U.R.S.S.

© Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.