ISRAEL SUGERE TROCA DE TERRITORIOS
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Publicado
na Folha de S.Paulo, domingo, 28 de outubro de 1973
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Israel poderia aceitar uma retirada de suas forças da margem
ocidental do Canal de Suez em troca de retirada das tropas do Egito
da margem oriental, afirmou ontem o vice-primeiro ministro israelense
Igal Allon.
Por outro lado, os governos de Tel Aviv e do Cairo concordaram com
uma proposta das Nações Unidas de que representantes
militares dos dois lados se reunam para debater o estabelecimento
das linhas de armisticio e a efetivação do cessar-fogo.
A informação foi dada em Washington pelo porta-voz do
Departamento de Estado, Robert McCloskey, mas não se sabia
ainda a data em que, sob a supervisão da ONU, se encontrariam
os generais israelenses e egipcios.
O primeiro contingente das forças de supervisão da paz
no Oriente Medio, os chamados "capacetes azuis", começou
a tomar posições ontem nas regiões conflagradas
do Levante.
Uma unidade filandesa instalou-se na cidade de Suez, em poder dos
egipcios, tonando-se alvo de constantes ataques israelenses, e um
destacamento sueco rumou para Ismailia na margem ocidental norte do
Canal de Suez.
Os 50 oficiais e soldados filandeses foram impedidos de chegar antes
à sua posição porque ficaram bloqueados, durante
quatro horas, no quilometro 102 da estrada Suez-Cairo, pelas tropas
israelenses. Somente depois da apresentação pessoal
aos israelenses do general finlandês Ensio Siilasvo, chefe do
grupo de emergencia da ONU, os soldados de Tel Aviv os deixaram passar.
Um porta-voz da ONU disse que se "capacetes azuis" encontraram
a cidade de Suez destruída mas que "tudo estava tranquilo
ao longo do Canal".
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Um
exercito cercado luta contra o deserto selvagem |
DESERTO DO SINAI - Preso num inferno de sol inclemente e pelas
tempestades de areia a leste de Suez, o Terceiro Exercito egipcio
necessitaria desesperadamente dos milhões de galões
de agua lançados com mangueiras de alta pressão que
foram utilizados para destruir as barricadas de areia israelenses
no primeiro dia de guerra.
Mesmo quando não é ouvido um unico tiro, é dificil
imaginar uma região mais hostil para um exercito cercado.
Durante o dia, a temperatura sobe até 49 graus centigrados
e pode-se ver o calor, com mais clareza do que uma miragem, flutuar
sobre as dunas redondas e sobre as elevações de rocha
amarela.
As moscas zumbem ao redor dos feridos e cobrem os mortos como um manto
negro. Os abutres descrevem circulos agourentos no limpido azul do
céu e pousam silenciosamente entre os leitos pedregosos dos
rios secos há milhões de anos.
Agora que os aviões e a artilharia de Israel destruiram as
três pontes flutuantes colocadas pelos egipcios sobre o Canal
de Suez, no inicio do conflito, a fonte de agua doce mais proxima
situa-se no oasis de Nakhl, a 160 km de distancia, a Leste.
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Uma
região selvagem |
No entanto, a viagem pelas areias e pelas dunas profundas é
perigosa até para um tanque. A unica rota para leste é
uma estreita faixa de cascalho, pontilhada de crateras pelas ultimas
três guerras, que leva à passagem de Mitla. Não
existe lugar onde se ocultar nesse imenso vazio do Sinai, vigiado
constantemente por aviões de reconhecimento.
Foi nessa região aspera e selvagem que Ismael, antepassado
dos arabes, viveu como nomade. Foi tambem onde Moisés, o profeta
mais reverenciado pelos judeus, perambulou durante 40 anos em busca
da Terra Prometida.
Nessas dunas, um exercito inteiro está agonizando: 20 mil homens
sem agua, alimentos, remedios, munições e gasolina.
Não existe um Moisés que faça surgir agua das
pedras, a não ser que os descendentes de Ismael decidam render-se.
As caravanas de comelos que descem das distantes montanhas avermelhadas
da Jordania e do Iraque consideram este ultimo trecho em direção
a Suez como o mais dificil.
As tribos de beduinos, que desapareceram desde que a guerra irrompeu
novamente, sobrevivem, em geral, graças aos seus rebanhos de
cabras, aos camelos e aos pequenos e suculentos passaros que emigram
da Africa e que os beduinos capturam com redes, ao amanhecer.
O soldado egipcio medio, recrutado nos bairros pobres do Cairo ou
de Alexandria, ou nos campos de cultivo do Nilo, não está
preparado para viver no deserto, mesmo numa situação
extrema.
À noite, não há muito consolo. Quando o sol começa
a se pôr, o que ocorre às 5 da tarde nesta epoca do ano,
as moscas desaparecem mas surgem os pernilongos. O vento sopra em
nuvens densas e geladas do Golfo de Suez e do Mar Vermelho, envolvendo
tudo com um espesso manto de chuvisco e umidade.
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Alem
do Canal |
Os cães do deserto cercam o lixo e se sentam em circulos ao
redor dos acampamentos, onde os soldados dormem sobre a areia junto
aos seus tanques. O ordor de sangue dos feridos ou dos moribundos
faz com que os cães uivem durante a noite toda, numa continuação
da vigilia diurna dos abutres.
A agua se situa logo atrás daquela duna, além do grande
canal de agua salgada que divide o territorio tanto na guerra como
na paz, mas na melhor das hipoteses está tão longe como
a estrela mais proxima que ilumina o deserto.
Por uma ironia do destino, a agua foi a arma de surpresa do Egito
no primeiro dia de guerra. Os engenheiros egipcios descobriram que
os projeteis da artilharia reforçavam a consistencia das trincheiras
de areia, enquanto que as mangueiras de agua de alta pressão
as derrubavam facilmente.
Três mil anos depois que Moisés perambulou pelo Sinai,
o Terceiro Exercito egipcio espera a libertação no mesmo
lugar.
HUGH
MULLIGAN
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