GUINÉ-BISSAU É INDEPENDENTE
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Publicado
na Folha de S.Paulo, terça-feira, 27 de agosto de
1974
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Portugal reconheceu ontem a independência da Guiné-Bissau
e admitiu o mesmo direito para as ilhas de Cabo Verde, em acordo assinado
em Argel pelo ministro das Relações Exteriores, Mario
Soares, e por Pedro Pires, do Partido para a independência de
Guiné-Bissau e ilhas de Cabo Verde (PAIGC).
O documento, que encerra quatro séculos de dominação
portuguesa sobre o território e onze anos de lutas dos rebeldes
pela libertação nacional, anuncia que Portugal reconhece
formalmente Guiné como Estado soberano a partir de 10 de setembro.
Todas as forças portuguesas serão retiradas do pais
até 31 de outubro.
As duas partes concordaram em ordenar o cessar-fogo imediato e manterão
relações diplomáticas plenas e cooperação
ativa nos campos econômico, financeiro, cultural e tecnico.
Ao mesmo tempo, Portugal reconhece o direito das ilhas de Cabo Verde
à independência que se efetivará de acordo com
as resoluções das Nações Unidas e da Organização
da Unidade Africana (OUA).
A Guiné-Bissau, uma terra inóspita de pântanos,
selvas e pastos, fica entre o Senegal e a República da Guiné,
no setor ocidental da África. O PAIGC lançou sua guerra
de guerrilhas pela independência, partindo desses dois países
e, nos ultimos anos, afirmou ter o controle de duas terças
partes do território. Em setembro do ano passado, o PAGC proclamou
a República Independente de Guiné-Bissau em um território
que os lideres guerrilheiros afirmaram ser formado por "zonas
libertadas" do pais.
A luta guerrilheira na Guiné foi considerada por muito tempo
como um dos mais eficazes movimentos africanos de libertação.
Desde o início das lutas, o governo português afirmou
que perdeu mais de 1.500 homens, embora os rebeldes garantam que a
cifra é muito mais alta.
O longo conflito caracterizou-se pela tática do PAIGC de realizar
ataques de surpresa aos quarteis portugueses e depois fugir. Acredita-se
que as forças rebeldes chegavam a 10 mil homens e que recebiam
armas modernas da União Soviética, dentre as quais foguetes
terra-ar. Os rebeldes tinham pela frente um Exército regular
de 26 mil soldados portugueses, dos quais uma quarta parte era africana.
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A
Guiné, finalmente um país livre |
ARGEL - Portugal e o PAIGC (Partido para a Independência de
Guiné e das Ilhas de Cabo Verde) assinaram ontem, no Palácio
do Povo, na capital argelina, o documento pelo qual o governo português
reconhece a independência da Guiné-Bissau, encerrando
quatro séculos de dominação. Ao mesmo tempo.
Portugal reconheceu o direito das ilhas do Cabo Verde de terem sua
independência, que se efetivará de acordo com as resoluções
das Nações Unidas e da OUA (Organização
da Unidade Africana).
O acordo foi assinado na presença do presidente Argelino Houari
Boumedienne. O ministro das Relações Exteriores, Mário
Soares, assinou por Portugal, e o major Pedro Pires pelo movimento
guerrilheiro.
As duas delegações divulgaram uma declaração
conjunta anunciando que Portugal formalmente reconhece a independência
da República da Guiné-Bissau como Estado soberano a
partir de 10 de setembro.
A declaração acrescenta que todas as forças,
portuguesas serão retiradas do país, até 31 de
outubro.
Os dois lados concordaram em ordenar um cessar-fogo imediato e estabelecer
relações diplomáticas plenas a partir de 10 de
setembro. Manterão um "relacionamento de cooperação
ativa - particularmente nos campos econômico, financeiro, cultural
e técnico - sob a base de independência, respeito mutuo,
igualdade, reciprocidade de interesses e relações harmoniosas
entre os cidadãos de cada um das duas republicas".
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A
Luta |
A independência da Guiné-Bissau agora anunciada foi forjada
em onze anos de dura luta guerrilheira nas selvas.
Durante anos a guerra esteve equilibrada, sem que as forças
portuguesas ou os guerrilheiros conseguissem alguma vantagem.
Os portugueses não conseguiam liquidar o movimento rebelde,
mas os africanos eram demasiadamente fracos para expulsar as forças
coloniais.
O momento decisivo para a Guiné-Bissau entretanto não
surgiu no campo de batalha da selva, mas nas ruas de Lisboa, quando
os militares portugueses, cansados das guerras coloniais na Guiné,
Angola e Moçambique, derrubaram o governo do primeiro-ministro
Marcelo Caetano.
A Guiné-Bissau transforma-se assim na quadragésima segunda
nação independente da África. Atualmente permanecem
sob o domínio das minorias brancas apenas os territórios
portugueses de Angola e Moçambique, além da Rodésia
e África do Sul. Portugal pretende também conceder a
independência a Angola e Moçambique nos próximos
meses.
A Guiné-Bissau, uma terra de pânicos, selvas e pastos,
fica entre o Senegal e a República da Guiné. O PAIGC
lançou sua guerra, partindo de bases nessas duas nações,
e nos últimos anos conseguiu o controle de duas terças
partes do território.
Em setembro do ano passado, o partido proclamou a Republica independente
da Guiné-Bissau, em um território formado por zonas
liberadas da Guiné portuguesa.
A luta guerrilheira dessa colonia foi considerada por muito tempo
como um dos mais eficazes movimentos africanos de libertação.
O longo conflito caracterizou-se pela tática do PAIGC de realizar
ataques de surpresa aos quartéis portugueses e depois fugir.
Calcula-se que suas forças chegavam a dez mil homens e que
receberam armas modernas da União Soviética, inclusive
foguetes terra-ar. Os rebeldes tinham pela frente um Exército
regular de 26 mil soldados portugueses, dos quais uma quarta parte
eram africanos, e mais 16 mil milicianos portugueses que organizaram
as unidades de defesa de aldeias e cidades.
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Os
Lideres |
O líder do PAIGC é Aristides Pereira, de 50 anos, ex-funcionário
do serviço de Correios, e um dos fundadores do partido.
O PAIGC formou-se sob a liderança de Amilcar Cabral um dos
mais conhecidos líderes africanos.
Pereira era lugar-tenente de Cabral e assumiu a lideranças
do partido pouco depois do seu assassinio no ano passado em Conakry,
na Guiné.
O assassinio, cometido quando Cabral saia do quartel-general da organização,
continua um mistério. Na época, os portugueses e o partido
acusaram-se mutuamente, mas os pormenores do crime não foram
esclarecidos até agora.
Pereira, como Cabral, nasceu nas ilhas de Cabo Verde, a cerca de 250
milhas da costa da África , que ainda se acha sob o domínio
português.
Quando entrou para o partido, Pereira era chefe dos serviços
de comunicações de Bissau.
Pereira e sua esposa Carmen, que se formou em enfermagem na União
Soviética, têm três filhos, duas mulheres e um
homem; este último estuda veterinária em Cuba.
Como nação independente, a Guiné-Bissau enfrenta
graves problemas econômicos e, provavelmente, também
políticos.
Seus 800 mil habitantes, de diferentes culturas, são em sua
maioria camponeses que vivem de pequenas plantações
de milho e arroz.
Existem alguns colonos brancos e cerca de dois mil homens de empresa
portugueses que farão com que a transferencia de poder seja
mais fácil que nos outros dois territórios.
A indústria é muito reduzida. O comércio é
feito quase que exclusivamente com Portugal. As comunicações
são deficientes, as escolas e hospitais escassos e são
poucas as estradas asfaltadas.
As divisões tribais entre os principais grupos étnicos
do país, Balantas, Malinkes, Anjacos, Papels, Fulas, poderão
provocar problemas.
Os Fulas, que são muçulmanos, apoiaram decididamente
Portugal durante a guerra da independência e agora serão
governados pelo PAIGC, no qual predominam os Balantas.
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A
Volta |
Uma ponte aérea foi estabelecida entre Bissau, na Guiné
e Lisboa, para repatriar os soldados portugueses.
Domingo chegaram 8 aviões ao aeroporto de Lisboa e outros 4
eram esperados ontem.
Além de seus próprios aparelhos fretou aviões
da companhia Transportes Aéreos Portugueses. Á ponte
aérea transportará, até o fim da semana, cerca
de 10 mil soldados.
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Arcebispo |
O Papa Paulo VI aceitou ontem a renúncia de D. Custódio
Alvim Pereira, que, como arcebispo de Lourenço Marques, apoiou,
em Moçambique, o antigo governo português.
Alvim Pereira defendeu, no ano passado, o regime do primeiro-ministro
Marcelo Caetano contra acusações de missionários
católicos, de que as tropas portuguesas haviam cometido chacinas
em aldeias de Moçambique. O prelado qualificou as denúncias
de "rumores de propaganda propalados por pessoas que servem de
instrumento ao marxismo".
Por outro lado, o Papa nomeou bispo auxiliar de Luanda, Angola, o
padre Zacarias Kamuenko.
O afastamento de D. Custódio Alvim Pereira está relacionado
com a descolonização dos territórios portugueses,
depois do apoio explicito à independência de Angola,
Moçambique e Guiné, manifestado por Paulo VI há
uma semana ao novo embaixador de Lisboa no Vaticano.
O fato é considerado também uma primeira consequência
da viagem à África do enviado pessoal do pontifice,
cardeal Umberto Mozzoni, que visitou Lourenço Marques e Angola.
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Libertação |
A aceleração da libertação dos territórios
portugueses na África, e a intensificação da
luta pela libertação da África do Sul, foram
propostas ontem pelo presidente congolês, Marien Nguabi, perante
16 ministros de Relações Exteriores africanos, que se
encontravam em Brazzaville para preparar a reunião de cúpula
de seus respectivos países.
Enquanto isso, dois grupos que lutam pela independência de Angola
anunciaram ontem no Cairo que recusarão o qualquer oferta de
trégua do governo de Lisboa. Em declaração divulgada
pela agência egipcia "Oriente Médio", a Frente
Nacional de Angola e o Movimento Popular para a Libertação
de Angola afirmam que as negociações são impossíveis
na fase atual.
"O governo deve reconhecer os movimentos de libertação
como representantes legais do povo de Angola". A declaração
acrescenta que a luta continuará, mesmo que se iniciem as conversações
para conceder a independência ao território africano.
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Dois
oficiais são exonerados |
LISBOA - Dois altos oficiais foram exonerados ontem de seus cargos
de membros da Junta de Salvação Nacional: general Jaime
Silverio Marques, ex-governador militar de Lisboa e atual chefe do
Estado Maior do Exército e o general Diogo Neto, chefe do Estado
Maior da Aeronáutica.
A substituição dos militares é interpretadas
como um triunfo da alta mais liberal do Movimento das forças
Armadas, pois ambos são considerados conservadores e com certa
responsabilidade em alguns "passos atrás" do presidente
Spinola no processo de redemocratização de Portugal. |
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