FATAIS PARA OS SOLTEIRÕES OS ANOS BISSEXTOS


Publicado na Folha de S.Paulo, sábado, 26 de março de 1960

Neste texto foi mantida a grafia original

LONDRES (FOLHA DE S.PAULO) - Chegaram a dizer, logo após o anuncio do noivado da princesa Margaret, que foi ela quem, em fevereiro ultimo, declarou seu amor ao fotografo Armstrong-Jones. A iniciativa foi sua, portanto, nessa pequena batalha. Havia uma razão curiosa para o aparecimento dessa versão. É uma longa historia, longa no sentido que se dá, na Inglaterra, à interpretação desse termo, isto é, no sentido da tradição.
Em todo o ano bissexto (e 1960 o é) as mulheres têm a faculdade de pedir a mão da pessoa amada, enviando ao homem de seus sonhos um bonito bolo em forma de coração. Com o tempo esse ato foi se modificando até modernizar-se completamente: o pedido é feito direta e traiçoeiramente, de forma verbal. E o homem tem o dever de aceitar a proposta de casamento. Não tem por onde fugir, pois se o fizer terá de pagar uma multa: um belo vestido à proponente. A tradição data de 1288, epoca em que foi instituida uma lei exatamente nessas bases. Sim, uma lei. Aliás, no seculo XIV a França, por um decreto, adotou o mesmo habito. Ora, as mulheres, determinadas a manter a tradição a qualquer custo, conseguiram esse objetivo, com algumas variações. Assim, decidiram que apenas um dia do ano deveria ser destinado ao assalto: o dia 29 de fevereiro dos anos bissextos. Daí o boato a respeito da princesa.

Uma batalha vitoriosa

Para que se tenha idéia de como essa tradição funciona na Inglaterra, narraremos alguns fatos ocorridos este ano, em 29 de fevereiro ultimo. Num escritorio de empresa de aviação, as jovens empregadas marcaram o dia com lapis vermelho, na folhinha. E, quando o dia 29 chegou, organizaram o ataque e o desfecharam, marchando para a vitoria. Primeiro foi a vez de Billie Mingos, jovem secretaria de 25 anos, que entrou no escritorio do comandante do aeroporto, Herbey Hayes. Apaixonado por flores, o comandante, naquela manhã, estava dispondo algumas delas num vaso. A jovem fingiu interessar-se por aquelas flores, ajudou-o a arrumá-las e, de repente, exclamou: "Hoje é 29 de fevereiro. Quer casar-se comigo?". Foi o fim da era solteira do comandante.
Nesse mesmo dia e na mesma companhia, Anne Wildey, uma "hostess" de 22 anos, pôs "olho comprido" em Peter Beard, um dos detetives do aeroporto. Enfrentou-o com um sorriso e o rapaz caiu. Mais tarde ela diria: "Foi amor à primeira vista". Mas não foi; foi plano mesmo.
Joyce Watts, 22 anos, adida à torre de controle, chamou pelo radio um jovem piloto que tentava aterrar. O rapaz atendeu e ela, pelo radio mesmo, fez o pedido. Não houve escapatoria possivel. Quando o rapaz aterrou, já estava noivo.
Houve outros casos interessantes. Num restaurante uma jovem garçonete, Margaret Savage, serviu a refeição de um cliente, Ken Barley, que de vez em quando a levava ao baile. A jovem apresentou a declaração e o freguês do restaurante capitulou.
Na Dinamarca a tradição tambem é adotada há seculos. E este ano aconteceu algo "terrivel". Cerca de 80 celibatarios resolveram fugir de Copenhage, no dia 29 de fevereiro, para uma ilha chamada Fejoe, de dificil acesso. Igual numero de moças soube da fuga e para lá se dirigiu. Foi uma batalha da qual deverão resultar pelo menos 50 casamentos.
Mas são as mulheres inglesas que com mais zelo conservam o direito adquirido através de seculos. E sabem fundamentar: se hoje temos os mesmos direitos e as mesmas obrigações que os homens, por que não teremos, tambem, o de nos declararmos?
Foi por isso que surgiu a versão sobre a declaração de Margaret.

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