ACABOU A UNIÃO SOVIÉTICA
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Publicado
na Folha de S.Paulo, segunda-feira, 26 de agosto de 1991
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Jaime Spitzcovsky
De Moscou
A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), criada em 1992 como fruto da revolução bolchevique
de 1917, não existe mais. A Bielorússia, tida como uma
das repúblicas mais fiéis a Moscou entre as 15 que compunham
o mosaico soviético, declarou ontem a independência.
A Ucrânia, a segunda mais importante, anunciou que assume o
controle das tropas soviéticas em seu território e que
vai criar suas Forças Armadas. Boris Ieltsin, homem-forte da
URSS hoje e presidente da Rússia - que já decretou sua
soberania -, defendeu a troca do Conselho da federação
por um Conselho de Segurança, o que equivale a transformar
a união em confederação. A Letônia prepara
a desmontagem do poder soviético na república. A Moldova
reúne seu Parlamento amanhã para sacramentar a independência
e já proibiu símbolos comunistas. A Lituânia anunciou
controlar sua fronteira ocidental e a emissão de vistos de
entrada em seu território. "Estamos livres", disse
seu presidente, Vitautas Landsbergis, ele disse ter feito acordo com
Moscou sobre a retirada dos boinas negras - tropas de elite do Ministério
do Interior - da Lituânia.
O esfacelamento da URSS se acelerou com o fracasso do golpe conservador
contra Gorbatchev, o que desencadeou uma ofensiva contra o comunismo
no país. Ontem na TV, ele disse: "Há uma semana,
existia um país. Esta semana é completamente diferente."
O marechal Serguei Akhromeiev, seu assessor militar e acusado de apoiar
o golpe, se suicidou. Deixou uma mensagem: "Tudo a que dediquei
minha vida se destruiu."
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URSS
não existe mais. Gorbatchev admite a ruptura do país
e Bielorússia se diz independente |
Jaime Spitzcovsky
De Moscou
A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas,
criada em 1922, desapareceu. A Bielorússia declarou ontem independência.
A Ucrânia anunciou formação de seu Exército.
O presidente da Rússia, Boris Ieltsin, defendeu na TV a substituição
do Conselho da Federação por um Conselho de Segurança.
A Moldova reúne seu Parlamento amanhã para sacramentar
sua independência. A Lituânia anunciou que controla sua
fronteira ocidental e que comanda a emissão de vistos de entrada
em seu território. O presidente da Letônia se encontrou
em Moscou com dirigentes da KGB e Ministério do Interior para
discutir a desmontagem do poder soviético em sua república.
"Há uma semana, existia um país. Esta semana, é
completamente diferente", declarou ontem o presidente Mikhail
Gorbatchev, em entrevista à TV soviética. A URSS se
desmancha como um castelo de cartas.
A proposta de Ieltsin equivale, na prática, a tornar a união
de repúblicas numa confederação em vez de federação.
Confederação corresponde a laços mais fracos
entre os integrantes. O presidente russo afirmou que na nova URSS
(se é que a sigla sobreviverá) as repúblicas
devem coordenar "assuntos estratégicos". Pensa sobretudo
em defesa.
A Ucrânia anunciou ontem que assume controle das tropas soviéticas
em seu território e que quer criar suas Forças Armadas.
No sábado, a república, a segunda mais importante da
URSS, declarou independência a ser confirmada em referendo.
O controle das Forças Armadas soviéticas permanece formalmente
com Gorbatchev, segundo Ministério da Defesa da Rússia.
Durante o golpe, Ieltsin assumiu o comando. Agora as repúblicas
exigem suas próprias tropas.
Nicolai Dementei, presidente bielorrusso, renunciou. Apoiou o golpe.
O Parlamento local "suspendeu temporariamente" as atividades
do PC da Bielorússia. Essa república era tida como uma
das fiéis a Moscou entre as 15 que formavam o combalido mosaico
soviético.
A Moldova, na fronteira com a Romênia, proibiu símbolos
comunistas em seu território. Ela integrava a lista das repúblicas
refratárias a assinar o Tratado da União. Esse acordo
remodelava as relações entre Moscou e os dirigentes
republicanos, tirando poderes do Kremlin. Sua assinatura precipitou
o golpe.
"Estamos livres", comentou Vitautas Landsbergis, presidente
da Lituânia. Ele disse ter fechado acordo sobre a saída
dos boinas negras, tropas de elite do Ministério do Interior,
de território lituano. A bandeira pré-revolucionária
da Rússia substituiu a bandeira soviética em todo o
território russo. Fim da herança bolchevique.
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Ocidente
sinaliza reconhecimento a bálticos - Escandinavos e Argentina
anunciam relações diplomáticas; EUA querem negociações
"o mais rápido possível" |
Está prestes a se concretizar a primeira fratura no mapa da
União Soviética desde a formação do país.
É iminente a independência das repúblicas bálticas.
Vários países europeus se declararam dispostos a reconhecer
a soberania da Lituânia, Letônia e Estônia. A Escandinávia
anunciou que estabelecerá relações diplomáticas.
A Argentina, também. Para o secretário de Defesa dos
EUA, Dick Cheney, o reconhecimento norte-americano é apenas
questão de tempo.
A Alemanha e os países nórdicos são os que mais
estão pressionado pela separação das repúblicas
báticas da URSS. O ministro do Exterior alemão, Hans-Dietrich
Genscher, afirmou ontem que é urgente o reconhecimento da independência.
Ele se reunirá na terça-feira com seus colegas bálticos
"para preparar o estabelecimento de relações diplomáticas".
Os governos de Dinamarca, Suécia, Noruega, Finlândia
e Islândia anunciaram que irão enviar embaixadores para
as três repúblicas, o que implica a aceitação
do status de independência.
A Noruega e a Dinamarca reconheceram ontem a independência das
três repúblicas, seguindo o exemplo da Islândia,
que foi o primeiro país do Ocidente a apoiar oficialmente a
secessão. Os países nórdicos alegam que consideram
os bálticos independentes desde 1921 e que nunca reconheceram
a anexação das três repúblicas pela URSS,
operação conduzida por Stalin em 1940.
A Comunidade Européia deverá realizar esta semana, em
Bruxelas, uma reunião extraordinária para discutir uma
política comum em relação à URSS e as
repúblicas bálticas. O reunião pode oficializar
o reconhecimento da CE.
França, Grã-Bretanha e Bélgica se dizem favoráveis.
Paris já se dispôs a enviar embaixadores às três
repúblicas.
Um comunicado oficial do governo argentina anunciou ontem à
noite que o presidente Carlos Menem decidiu reconhecer as "repúblicas
independentes".
"Eu tenho certeza de que os EUA os seguirão", disse
ontem o presidente lituano, Vitautas Landsbergis. Washington tem sido
cauteloso em relação ao Báltico, para evitar
acusações de interferência política da
URSS.
O presidente George Bush, entretanto, já declarou que gostaria
de ver negociações para a independência. E "quanto
mais rápido, melhor", disse ele.
A China se declarou preocupado com a possibilidade de que uma fragmentação
da URSS possa disseminar distúrbios ao longo das fronteiras
entre os dois países .
O movimento secessionista nas repúblicas bálticas foi
deflagrado em 1990, quando o Parlamento da Lituânia aprovou
a separação da URSS. Em março, o movimento foi
reprimido por Moscou, que não acatou a decisão lituana.
Em janeiro deste ano, tropas soviéticas reprimiram militarmente
a república, mantendo sob seu controle a estação
de TV e alguns edifícios públicos.
Logo após o início da tentativa de golpe contra Mikhail
Gorbatchev, a Estônia e a Letônia também se declararam
independentes, desafiando os golpistas. A linha-dura reagiu imediatamente,
enviando tropas para as três repúblicas. O novo homem-forte
da URSS. Boris Ieltsin, apóia as independências no Báltico.
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Gorbatchev
atrasou o golpe |
Mikhail Gorbatchev atrasou o golpe e, assim, proporcionou o surgimento
de um cenário que condenava a junta ao fracasso. As forças
conservadoras assumiram a ofensiva a partir de julho de 1990. O presidente
Gorbatchev desacelerou então a perestroika e arrefeceu os ânimos
golpistas. Em agosto de 1991, a volta do sonho conspiratório
esbarrou em Boris Ieltsin.
Era o 28º Congresso do Partido Comunista, julho do ano passado.
Seu resultado mostrou um Gorbatchev mais cauteloso, oscilando rumo
aos conservadores assustados com a perda de poder e privilégios.
Ieltsin anunciou sua saída do PC.
Naquela ocasião, Ieltsin presidia o Parlamento russo. Ainda
não tinha sido fortalecido pelos milhões de votos das
eleições presidenciais de 12 de junho último.
Seu cacife político e poder de mobilização avançava,
mas em julho de 1990 não poderia ter o desempenho da semana
passada.
Gorbatchev preferiu amortecer as pressões das forças
conservadoras. Com isso, atrasou o golpe. Os conservadores acreditavam
que ao esfriar a perestroika garantiam seu poder. Gorbatchev pensava
em evitar guerra civil. Tampouco sabia que Ieltsin já o superava
no ranking político.
Gorbatchev foi montado uma equipe de governo obedecendo a correlação
de forças: chamou Ianaiev para vice, Boris Pugo para ministro
do Interior, fortaleceu Iazov e Kriuchkov.
Em janeiro, uma explosão de violência no Báltico.
Iazov, Pugo e Kriuchkov seguraram seus radicais. Acreditavam que ainda
não era necessário recorrer à força.
A outra ponta do espectro político ia crescendo. As repúblicas
se fortaleciam, assim como Ieltsin. Gobatchev decidiu trocar de barco
para garantir sua sobrevivência política.
De julho de 90 a abril de 91, quando sacramentou sua aproximação
com os dirigentes republicanos, Gorbatchev administrou as pressões
conservadoras. A guerra civil não aconteceu pela capacidade
de Boris Ieltsin de mobilizar a população. Graças
ao tempo ganho por Gorbatchev. |
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