CAETANO PRESO, SPINOLA NO PODER
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Publicado
na Folha de S.Paulo, sexta-feira, 26 de abril de 1974
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Neste texto foi mantida a grafia original
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O presidente do Conselho de Ministros de Portugal, Marcelo Caetano,
rendeu-se incondicionalmente ontem à tarde às tropas sublevadas, no
interior do Quartel da Guarda Republicana, na praça do Carmo, em Lisboa,
após uma breve resistencia. Estava consumado o golpe militar que,
eclodido às 3 horas da madrugada, durou exatamente quinze horas e
marcou o fim de 48 anos de regime salazarista.
Como representante das forças rebeladas, o general Antonio de Spinola,
considerado a figura central do golpe militar, assumiu o poder de
fato. Em uniforme de gela, sobre o qual se destacavam suas muitas
condecorações, ele entrou no quartel e teve uma breve entrevista com
Marcelo Caetano, convencendo-o a renunciar sem mais resistencia e
sem quaisquer condições. Caetano rendeu-se e foi preso.
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Promete
eleições livres |
A noite, já investido nas funções de presidente
da Junta de Salvação Nacional, integrada por mais seis
militares, o general Antonio de Spinola proclamou à Nação
os objetivos do movimento e prometeu tudo fazer para "facilitar
a livre eleição, por sufragio direto", do novo
presidente da Republica de Portugal.
A Junta assume - acrescentou Spinola - o compromisso de "garantir
a sobrevivencia da Nação como pátria soberana
no seu todo pluri-continental"; garantir "a liberdade de
expressão e pensamento"; e garantir "a livre tarefa
da futura Assembléia Constituinte".
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Foi
uma rebelião dos jovens oficiais |
Victor da Cunha Rego
Nosso correspondente em Lisboa
LISBOA - Acompanhei de perto a rendição de Marcelo Caetano
no Quartel do Carmo. Desde o meio-dia, a situação se
definira, com o primeiro-ministro cercado e o comandante da guarda
solicitando às unidades fiéis - sem resultado - um helicoptero
para a fuga do primeiro-ministro. Agora, Marcelo Caetano está
sob custodia, mas recebeu garantias de segurança e é
tratado com toda cortesia pelos oficiais revoltosos.
Ao cair da noite, havia apenas dois focos de resistencia, na Serra
de Monsanto, perto de Lisboa. Entretanto, a maioria dos oficiais-generais
não está envolvida no golpe de estado e o comando revolucionario
é composto por oficiais que participaram do fracassado levante
de Caldas da Rainha, em março. Eles estavam presos no forte
da Trafaria e de lá sairam para liderar o movimento.
Há indicios de focos de resistencia nas guarnições
da fronteira com a Espanha, para onde teriam seguido varios membros
do governo deposto, entre eles o ministro da Guerra. A questão
principal, todavia, é a forma como vão reagir as tropas
que lutam na Africa.
Os revoltosos prevêem a invasão de Moçambique
pelas forças da Africa do Sul e da Rodesia, e a formação
de um governo autonomo em Angola, composto pela minoria branca.
Outra questão é o relacionamento entre militares e politicos.
Desde os primeiros momentos, notaram-se graves diferenças entre
os jovens oficiais revoltosos e os poucos oficiais de alta patente
que apoiaram publicamente o comando revolucionario. Durante toda a
manhã, as emissoras dominadas por comandos mistos militares
e civis misturavam as declarações oficiais dos revoltosos
com canções de protesto nitidamente revolucionarias
(até há pouco proibidas pela censura), mas, ao cair
da noite, essas canções foram substituidas por marchas
militares.
Não houve participação de lideres da oposição
esquerdista no golpe, mas sem dúvida os jovens oficiais estão
em contato com alguns deles, como o secretario-geral do Partido Socialista
Português, Mario Soares, que está exilado em Paris e
cujo retorno a Lisboa é esperado para as proximas horas. Mario
Soares, embora sem participação oficial na conjura,
parece ser um dos nomes que serão importantes na política
portuguesa.
Todos os presos politicos detidos nas fortalezas de Peniche e no Norte
do país, foram libertados, mas não há noticias
concretas sobre os detidos na fortaleza de Caxias, perto de Lisboa.
Assisti à troca de tiros nas imediações da sede
da policia politica (ex-PIDE), e vi tambem a tomada do Quartel de
Lanceiros onde se refugiara o presidente Americo Thomaz, que dali
saiu para a Serra de Monsanto. Não se sabia, até o noite,
se ele continuava nessa guarnição ou seguira para outra
que não tenha aderido ao golpe.
Os pontos de maior importancia para que se defina a situação
parecem ser os seguintes:
1) Existem focos de resistencia, e a maioria dos oficiais-generais
não aderiu ao movimento revoltoso;
2) Há noticias em Lisboa de que o governo da Rodesia estaria
enviando forças par o fronteira de Moçambique;
3) Os revoltosos controlam Lisboa e os quartéis principais
de tropas mecanizadas, mas não controlam a Força Aerea
e, sobreturo, a Base de Beja, unidade-chave do Sul do país;
4) Notam-se já algumas divergencias entre oficiais do comando
revolucionario quanto à colaboração politica
do movimento;
5) Estamos às vesperas do 1o de Maio, data em que a esquerda
comunistas pretendia fazer grandes manifestações. Não
se sabe, agora, como as esquerdas vão agir.
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Cronologia
do golpe |
O golpe
foi desencadeado às 3 horas da madrugada, com as tropas aquarteladas
em Lisboa, Vendas Novas e Santarem acupando os pontos estrategicos
da capital. Meia hora mais tarde, foram ocupadas as emissoras de radio
e televisão e o quartel-general de Lisboa.
O alerta ao governo partiu das forças policiais. Imediatamente,
o presidente Americo Thomaz se refugiou no Quartel de Lanceiros, enquanto
o primeiro-ministro Marcelo Caetano e a maior parte do governo abrigaram-se
no Quartel da Guarda a Republicana, no central da cidade.
As 10 horas, as tropas revoltosas, chefiadas pelo major Durão,
ocuparam o Ministério do Exercito e cercaram os quartéis
em que estavam o presidente da República e o primeiro-ministro.
Ao meio-dia, foi lançado um ultimato para que os dois se rendessem.
A partir das 14 horas, tanques do Exercito e tropas revoltosas cercaram
o Quartel do Carmo.
Às 18 horas, o governo do primeiro-ministro Marcelo Caetano
considerou-se oficialmente deposto.
A frota de guerra saiu de Lisboa, do rio Tejo, às 8 horas da
manhã, havendo noticias de que aderira ao golpe e que possivelmente
estava a caminho da Africa.
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