JORNALISTA BRASILEIRO CONTA COMO SE FERIU NO VIETNÃ
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Publicado
na Folha de S.Paulo, segunda-feira, 25 de março de
1968
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Neste texto foi mantida a grafia original
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SAIGON, 24 (FOLHA) - O jornalista brasileiro José Hamilton
Ribeiro, da revista "Realidade", de São Paulo, que
perdeu a parte inferior da perna esquerda na explosão de uma
mina vietcong perto de Quang Tri, está passando bem, foi transferido
para o hospital norte-americano em Qui Nhon, a fim de submeter-se
a nova operação, e será transportado para os
Estados Unidos na proxima semana, para continuar seu tratamento.
Ao receber as visita do encarregado de negocios do Brasil em Saigon,
Rogerio Corção, que viajou até o seu hospital,
José Hamilton Ribeiro disse que, tão logo possa sentar-se
na cama, escreverá sua reportagem, que será ilustrada
com fotos em côr do acidente, feitas pelo fotografo japonês
Shimamoto, que o acompanhava em Quang Tri.
O acidente de José Hamilton Ribeiro, a 20 quilometros a Sudeste
de Quang Tri, perto da zona desmilitarizada, ocorreu na mesma região
em que morreu no ano passado, vitima de outra mina, o escritor Bernard
Fall, que era o principal especialista em historia contemporanea do
Vietnã (até agora morreram 14 correspondentes de guerra
no Vietnã).
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Sangue
frio |
José Hamilton Ribeiro aceitou com sangue frio a amputação
de sua perna. Ao voltar a si, declarou:
"Este meu pé esquerdo sempre me deu problemas. Quando
criança, tive nele uma tuberculose ossea. Não me fará
muita falta. Pensando bem, tive sorte. No mesmo local em que fui e
pisei a mina, pouco antes dois soldados morreram e um terceiro perdeu
ambas as pernas e um braço.
José Hamilton Ribeiro havia chegado a Saigon em principios
de março. Ao partir do Brasil, nenhuma companhia brasileira
quis fazer seu seguro de vida. O seguro foi finalmente feito em Londres.
Após uma semana em Saigon, ele quis assistir de perto a um
combate. No sabado, 16 de março, transportou-se para Da Nang.
A partir de segunda-feira, 18, acompanhou as atividades da companhia
Delta da primeira brigada no batalhão da primeira divisão
de cavalaria. No dia do acidente, 20 de março, assista à
limpeza de uma area, onde se suspeitava da presença de tropas
norte-vietnamitas.
A companhia inteira compunha-se de 125 homens. A patrulha em que estava
José Hamilton era de dez soldados. Pouco antes, tinha havido
três explosões de pequenas minas.
Um pormenor estranho: seis homens de sua patrulha passaram antes de
José Hamilton no local em que a mina explodiu. Só ele,
o setimo, pisou na mina.
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A
explosão |
"De repente me senti no ar (assim ele descreve o acidente). Quando
me dei conta, estava sentado no chão envolto em fumaça.
Procurei meu interprete, um americano de origem mexicana, e não
o vi. Pensei que o rapaz tivesse morrido. Só aí senti
que minha perna esquerda puxava. Olhei e não havia mais o pé.
Só alguns minutos depois começou a doer. Os enfermeiros
estavam ocupados com os outros feridos. Finalmente me amarraram a
perna acima do joelho com um torniquete. O sangue estancou."
José Hamilton foi transportado de helicoptero para o Hospital
Cirurgico de Quang Tri, onde a perna esquerda foi amputada pouco acima
do tornozelo. Ele resistiu bem à operação. Seus
outros ferimentos eram leves: algumas escoriações na
perna direita e no braço esquerdo. O resto do corpo, intacto.
Por coincidencia, seu vizinho de leito no Hospital Cirurgico de Quang
Tri era um soldado de 20 anos, nascido em Portugal, Amerindo Cavalheiro,
que emigrou para os Estados Unidos.
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