PERON OBTEN MAIORIA ABSOLUTA


Publicado na Folha de S.Paulo, segunda-feira, 24 de setembro de 1973

BUNEOS AIRES - O general Juan Domingo Peron caminhava para uma esmagadora vitoria, ao se conhecerem os primeiros resultados das eleições presidenciais realizadas ontem, a segunda este ano, na Argentina.
Apuradas 18.000 das 55.475 mesas eleitorais em todo o país, os resultados extra-oficiais conhecidos às 19h30 davam a Peron 2.463.320 votos, ou seja, 58,03 por cento do total.
Vinham depois Ricardo Balbin, da União Civica Radical,. Com 1.090.230 votos e 26,07 por cento; Francisco Manrique, da Aliança Popular Federalista, com 693.081 votos e 13,00 por cento; e Juan Carlos Coral, do pequeno Partido Socialista dos Trabalhadores, com 12.515 votos ou 1,03 por cento.
A recontagem oficial de votos, que progride mais lentamente do que a extra-oficial realizada pelos meios jornalisticos que acompanham as eleições, dava a Peron 194.903 votos, equivalente a 31,05 por cento, com 1.628 mesas eleitorais apuradas em todo o país.
De acordo com este computo oficial, Balbin obtinha 112.992 votos, ou 30,18 por cento, Manrique 57.259, ou 15,24 por cento, e Coral 8.955 ou 2,39 por cento.
Caso se mantenha este tendencia nas urnas restantes, Peron seria consagrado hoje presidente eleito, sem necessidade de uma segunda votação, que uma nova lei eleitoral faz necessaria quando nenhum dos candidatos atinge 50 por cento mais um dos votos.

Apenas uma vitoria

Os observadores em Bueno Aires diziam ontem que, a manter-se a tendência inicialmente registrada nas apurações, Peron não obterá o triunfo eleitoral que esperava.
Lembra-se que na primeira eleição presidencial, há seis meses, Hector Campora obteve 49,6 por cento dos votos. Desta vez, Peron parecia destinado a obter cerca de 60 por cento dos votos - uma margem melhor, mas não esmagadora como se esperava.

Uma eleição normal e sem entusiasmo na Argentina

BUENOS AIRES - A normalidade e um entusiasmo regular caracterizaram as segundas eleições presidenciais que se realizam nesta ano na Argentina. Mais de 14 milhões de eleitores escolheram ontem o presidente que deverá completar o periodo de quatro anos que Hector Campora deixou com sua renuncia a 13 de julho.
A expectativa e a tensão que prevaleceram nas eleições de 11 de março vencidas pelo candidato peronista não foram observadas ontem.
Poucos duvidam que o general Juan Domingues Peron, de 77 anos, candidato da Frente Justicialista de Libertação vencerá os três adversários. Se eleito presidente constitucional pela terceira vez, deverá concluir o mandato presidencial para o qual Campora foi eleito em 11 de março.
A única duvida é em relação a margem de votos do candidato justicialista. Os partidarios de Peron acreditam que ele conseguirá muito mais de 50 por cento dos votos, o que evitará um novo pleito, que disputaria com o segundo candidato mais votado. Fontes peronistas asseguram que Peron obterá mais de 60 por cento dos votos. Campora em março obteve 49,5 por cento dos votos.

Balbin confiante

No entanto, os dirigentes da União Civica Radical (UCR), o segundo partido da Argentina, mesmo admitindo a vitória de Peron, acreditam que o ex-presidente conseguirá menos votos que Campora. Se isso ocorrer, seu candidato Ricardo Balbin terá possibilidades de se eleger na segunda rodada.
A União Civica Radical afirmou que o peronismo sofreu "desgaste" desde que assumiu o poder em 25 de maio, em consequencia das lutas internas do justicialismo e dos impactos negativos da renuncia de Campora. Campora renunciou a presidência em 13 de julho para permitir que Peron - inabilitado como candidato pelo regime militar anterior - pudesse candidatar-se em novas eleições.
Os adversários de Peron afirmam que a candidatura de Isabel Martinez a vice-presidência foi mal recebida por alguns peronistas.
No entanto, os observadores acreditam que Peron poderá obter um triunfo esmagador, pois é apoiado por uma ampla base política que inclui desde o Partido Comunista aos setores moderados, que já lhe foram hostis, mas hoje o reconhecem como o único dirigente argentino capaz de solucionar os problemas nacionais.

Os outros

Além de Ricardo Balbin, 69 anos disputam as eleições com Peron, Francisco Manrique, 56 anos, candidato da Aliança Popular Federalista de centro-direita e Juan Carlos Coral, de 39 anos, do pequeno Partido Socialista dos Trabalhadores, de extrema esquerda.
Para a vice-presidência, os candidatos são Isabel Martinez, pela Frente Justicialista, senador Fernando de La Rua, pelo Radicalismo; Rafael Martinez Raymonda, pela Aliança Popular Federalista e Guilherme J. Paez, pelo Partido Socialista dos Trabalhadores. Os eleitores não podem votar pelo candidato de um partido a presidente e escolher o vice-presidente de outro partido. Também não podem votar apenas para presidente ou vice-presidente.

Peron vota

Peron surpreendeu os argentinos ao apresentar-se para votar no bairro de Palermo. Há alguns dias atrás, divulgou-se que Peron e sua esposa não poderiam votar porque estavam exilados em Madri quando se encerrou o registro eleitoral, há seis meses. Rodeado por pequena escolta, Peron entrou rapidamente no local de votação. Os jornalistas foram mantidos a distância enquanto o lider justicialista votava. Estava acompanhado por seu secretário particular, José Lopez Rega.
Peron foi saudado por centenas de cidadãos que aguardavam sua vez de votar. Respondeu sorridente, levantando o braço direito mas deixou rapidamente o local com seu automovel.
Izabelita depositou seu voto no bairro de Belgrano. Sorridente, votou sem aguardar na fila. Muitas mulheres a aclamaram quando se retirou.
Ricardo Baldin votou na cidade de La Plata, a 50 quilometros ao sul de Buenos Aires. Manrique e Coral votaram na capital. O presidente provisorio Raul Lastiri tambem votou em Buenos Aires. Lastiri foi designado chefe de Estado depois da renuncia de Campora, com a tarefa de convocar novas eleições. Suas funções serão encerradas no dia 12 outubro, quando deverá assumir o novo presidente constitucional.

Colegio eleitoral

Mais de 14 milhões de argentinos estavam habilitados para votar. O voto é obrigatorio na Argentina para homens e mulheres a partir dos 18 anos e até os 70 anos.

A contagem

Para a grande maioria da população, a eleição se limita à escolha do presidente e do vice-presidente. Mas na provincia de Santiago. Del Estero, no centro do pais, se realizam tambem as eleições para escolher o governador, que foram atrasados em consequencia de conflitos institucionais. Os dois candidatos são peronistas.
Há 55.475 mesas eleitorais habilitadas em todo o pais, que funcionaram até as 18 horas. No mesmo local os votos serão contados em presença das autoridades de cada mesa eleitoral e dos ficais dos partidos politicos. Os resultados serão entregues ao correio central, que os comunicará ao centro de computação do ministério do Interior. O trabalho de processamento dos resultados, segundo informações do governo, prosseguirá durante a noite e até as cinco horas de hoje. Calcula-se que depois das 21 horas se poderá ter uma idéia aproximada de quem será o vencedor e sua margem de vitoria.

Incidentes

- O comando eleitoral da Frente Justicialista de Libertação (FREJULI) denunciou que indivíduos desconhecidos colocaram fosforo quimico dentro de algumas urnas provocando incendio e destruição dos votos.
Os incidentes ocorreram em algumas mesas eleitorais de Quilmes e Matanza, suburbios operarios de Buenos Aires.
Em outros distritos, as eleições realizaram-se normalmente.

Uma critica

Em Bogotá, o jornal "El Tiempo" comentou ontem, em termos desfavoraveis, as eleições argentinas, as quais qualifica de "simples formalidade de circunstancias para ratificar a peça teatral escrita e interpretada por Hector Campora".
Diz num editorial que "seria ingenuo duvidar que nas eleições presidenciais exista um ganhador que não seja outro Juan Domingo Peron e sua esposa". "O chefe dos descamisados teve a condescendencia de concordar com esta pantomima".
O jornal acrescenta que "fere a sensibilidade democratica do Hemisferio que um pais da tradição e da importancia da Argentina tenha chegado a este extremo de ligeireza politica e de ostensiva burla contra seu povo e suas instituições. É o epilogo da comedia, que segundo todas as probabilidades terá carater de drama, infelizmente".

Movimento no consulado

O Consulado da Argentina em São Paulo esteve funcionando em carater excepcional durante todo o dia de ontem, para receber a justificativa de não emissão de votos de turistas que estão de passagem pelo Brasil e mesmo de pessoas que vivem aqui e ainda não comunicaram oficialmente a mudança de residencia.
Das oito da manhã até as 18 horas a movimentação foi grande no consulado, que funcionou normalmente com todo o seu quadro de pessoal, inclusive com a presença do consul geral, Eduardo Breton e os adjuntos Guilherme Rivarola e Domingo Budic.
O consul Eduardo Breton afirmou que o afluxo de pessoas foi bem maior nas eleições de 11 de março, porque agora é verão, epoca em que muitos turistas argentinos passam pelo Brasil. Calcula-se que ontem tenham comparecido cerca de mil pessoas para registrar a justificativa por não votar.

Na capital federal

Em Brasilia, sessenta argentinos compareceram à representação diplomatica de seu país na capital federal para justificar o voto. A sessão consular, aberta às 9 horas, encerrou seus trabalhos às 17 horas.
O clima na embaixada era de tranquilidade e nem os funcionarios diplomaticos nem os argentinos que transitavam por ali mostraram-se dispostos a comentar as eleições, afirmando que o melhor era aguardar os resultados.

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