A PERSONAGEM MAIS ENIGMATICA DO NAZISMO
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Publicado
na Folha da Manhã, domingo, 22 de novembro de 1959
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Neste texto foi mantida a grafia original
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Eva
Braun viveu catorze anos ao lado de Hitler - fiel ao tirano, desobedeceu
à sua derradeira ordem e esta revolta lhe custou a vida
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Durante quatorze anos Hitler conseguiu manter oculta sua relação
amorosa com Eva Braun. Com efeito, a existencia da amante do führer
só foi conhecida depois de os dois terem morrido lado a lado
no refugio da chancelaria do Reich, em Berlim. Aliás, quando
Eva morreu já não era amante e sim a esposa legitima
do ditador que com ela se casara, "in extremis", antes de
ingerir o veneno que o matou.
Apesar de ter vivido sempre na obscuridade e de ter sido, pelo que
se sabe, uma mulher insignificante, Eva Braun tornou-se uma personagem
dramatica, depois de ter ingerido, ao lado do marido, uma dose de
veneno e seu corpo ter desaparecido, devorada pelas chamas ao lado
do tirano. Morreu, porem, feliz, pois nos ultimos dois dias de sua
vida realizara o sonho que acariciara durante catorze anos.
O propalado celibato de Hitler deu muito o que falar na Alemanha e
no mundo. Os fanaticos consideravam o führer do III Reich um
ser superior, isento das fraquezas da carne. Os maldosos, ao contrario,
chegaram a atribuir àquele solteirismo um motivo muito menos
poetico...
Eva Braun não foi nem a primeira nem a unica mulher na vida
sentimental do ditador. Sua primeira amante foi Geli Raubal, sua sobrinha
que, segundo afirmam os historiadores, se suicidou quando soube que
seu tio preferia a filha de um mercador de Berchtesgaden.
Essa segunda "paixão" foi logo liquidada, sem consequencias
maiores, quando Hitler se tornou chanceler do Reich. Uma boa indenização
e um marido transigente contornaram a situação. Porem,
a unica mulher que conquistou realmente o coração de
Hitler foi Eva Braun, que, antes de se tornar a favorita do ditador,
trabalhava como ajudante de Herr Henrich Hoffmann, fotografo particular
de Hitler. E ela nunca abandonou essa função.
Qual terá sido a verdadeira influencia dessa mulher sobre o
chanceler da Alemanha? O fato de Hitler ter "in extremis"
aceitado passar para a historia ao lado de sua "esposa"
prova que Eva Braun foi para o führer muito mais do que uma simples
concubina. Porem, o mais espantoso é que a "bela"
conquistou o "monstro" com suas qualidades por assim dizer
negativas. Hitler escolheu sua companheira no meio que mais apreciava:
o ambiente dos fotografos e dos atores cinematograficos. Ele sempre
considerou a arte fotografica e a arte cinematografica como as mais
elevadas. Com efeito, seu divertimento preferido foi sempre o cinema.
A outra grande virtude de Eva Braun, aos olhos do ditador, foi a total
falta de interesse pela vida publica de seu senhor. Hitler, com efeito,
detestava os politicos "de saia". Alem disso, apesar de
suas desmedidas ambições e de seu imenso poder sobre
as massas, Hitler nunca passou de um provinciano de nivel intelectual
bastante baixo e de modos pouco requintados. Dono de uma personalidade
marcante, ele conseguiu subjugar grandes fidalgos e celebridades internacionais,
mas nunca chegou a adquirir, por mais que se esforçasse, o
"savoir faire" da alta sociedade. Pouco culto, ele falava
superficialmente sobre tudo, mas no fundo não se sentia muito
à vontade com pessoas eruditas. Foi por isso, talvez, que esse
homem que fez estremecer o mundo se prendeu a uma mulher simples,
pouco instruida, que nunca lhe fez sentir sua pequenez intelectual
e sua falta de distinção. A unica qualidade positiva
de Eva Braun era sua provada ascendencia ariana. Uma mulher que podia
ser mãe (mas nunca o foi) de verdadeiros alemães.
Hitler manteve oculta sua relação amorosa por dois motivos:
primeiro, por exigencias de carater politico, pois lhe convinha passar
por um ser superior, um messias aureolado de virgindade, encarnar
o esposo mistico da Alemanha; em segundo lugar, porque ele sentia
necessidade de passar seus raros momentos de liberdade ao lado de
alguem que fosse completamente alheio à politica, às
intrigas nacionais e internacionais, às questões de
Estado.
Eva Braun foi, por assim dizer, um tranquilizante para aquele paranóico
que, desejando destruir as raças que ele considerava inferiores,
foi abrindo a cova para a tão decantada raça ariana.
Todavia, a vida de Eva Braun não se parece de maneira nenhuma
com a vida que geralmente levam as grandes favoritas. Com efeito,
os historiadores pouco ou nada têm que contar dela. Aliás,
"Fraüilein" Eva era uma mulher muito simples e muito
pouco exigente. Evidentemente, preferia mais dar do que receber. Basta
dizer que suas economias eram constituidas pela porcentagem que recebia
sobre as fotografias de Hitler, na sua qualidade de ajudante do fotografo
particular do führer.
No fundo, porem, não devia estar muito satisfeita com a sua
situação. Sabia perfeitamente que nunca se tornaria
a mulher legitima do homem que amava e de quem era amada. E isso por
razões que ela nem sequer conhecia, pois foi sempre mantida
afastada de tudo.
Seja como for, Eva Braun encarna a personagem mais misteriosa do nazismo,
pois na verdade não se sabe ao certo qual foi o seu verdadeiro
papel na tragedia do III Reich. Sabe-se somente que durante a guerra
ela passava os dias sozinha em Berchtesgaden, esperando o regresso
de Hitler, de suas inspeções militares. Mas quando Berlim
foi sitiada e a derrota total estava à porta, não quis
que Eva Braun o acompanhasse. Ele queria morrer sozinho, como um herói
lendario. Daquela vez, porem, sua ordem não foi cumprida. A
mulher que durante tantos anos obedecera sem nunca discutir, revoltou-se.
Foi, aliás, uma revolta heróica, pois lhe custou a vida.
A 15 de abril de 1945 Eva Braun apresentou-se à chancelaria
de Berlim, donde nunca mais saiu.
"Perante aquela prova de devoção unica" -
assim relata o historiador inglês Hugh R. Trevor-Roper, o qual,
por encargo do Inteligence Service, se documentou a fundo sobre a
morte de Hitler - o führer desistiu da idéia orgulhosa
de passar sozinho para a historia. Eva instalou-se no refugio blindado
da Chancelaria de Berlim, sofreu os horrores dos ultimos bombardeiros
dos aliados, mas viu realizado seu sonho: casou com Hitler.
"Agora TENS finalmente que chamar-me "Frau Hitler",
ordenou ela secamente logo depois do enlace a um velho criado que
continuava a chamá-se "Fraulein".
Dois dias depois do casamento o corpo de Frau Hitler jazia carbonizado
ao lado do corpo do homem mais temido, mais idolatrado e mais odiado
dos nossos dias. |
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