À MARGEM DOS ACONTECIMENTOS


Publicado na Folha da Noite, quinta-feira, 22 de Agosto de 1940

Neste texto foi mantida a grafia original

Trotsky

Companheiro de Lenine, seu braço direito, creador do Exército Vermelho, Trotsky foi o sustentáculo da revolução soviética contra o mundo capitalista.
Repetindo a história da revolução francesa, as grandes potencias tentaram intervir militarmente na Rússia, por intermédio dos adversários do novo regime. Koltchack, Wrangel, Denikine, Yudenich agiam sob o impulso dos seus ideais e do seu patriotismo, mas a mola da sua força estava em poder dos sistemas internacionais empenhados numa nova Santa Aliança oposta à implantação do comunismo no império dos czares. E deviam tê-lo levado de vencida, facilmente, dado o periodo de cáos que se segui à instalação do Soviet e à dissolução em que caíra o exército russo ante a derrota e a revolução.
Mas, também aqui a história francesa se repetiu: colunas improvisadas de combatentes revolucionários rechassaram russos brancos e franco-ingleses em todas as frentes. Á proporção que se batiam, mais numerosas e mais aguerridas foram sendo, sob a direção e o comando de Trotsky, que era o comissário da defesa nacional. O Exército Vermelho, creação sua, salvou a Rússia bolchevista.
Lenine tê-lo-ia nomeado seu herdeiro e sucessor. Stalin, porem, menos impetuoso e mais astuto, assenhoreou-se primeiro da herança. E o seu cuidado inicial foi a eliminação de Trotsky, que na fuga e no exílio procurou a salvação da própria vida.
Stalin fez executar, um a um, todos os antigos líderes comunistas, de que não resta mais uma só figura de primeira grandeza. Trotsky, para escapar à condenação, teve de renovar a sorte do judeu errante. Todas as nações o repeliram, como a um pestoso, até que o México revolucionário lhe deu abrigo.
Nem aí teve tranquilidade e segurança. Meses atrás um atentado frustrado anunciou que, mesmo do lado de cá do Atlântico, sua vida corria perigo. Certamente redobraram as precauções, pessoais e do governo mexicano, para sua guarda e defesa. Tudo inutil: o atentado repetiu-se, agora com êxito, para provar que a sentença de morte tinha de ser cumprida, apesar da distância e da proteção policial, apesar de tudo.
Robespierre teria eliminado todos os seus companheiros da revolução francesa, se o terror dos sobreviventes não os unisse e não os encorajasse para a reação que levou o "incorruptivel" á guilhotina. As revoluções costumam devorar os seus próprios genitores. Os que as começam não são, nunca, os que as terminam. E a vida de Trotsky ficará como um símbolo, significando a fatalidade do destino, que nem o largo espaço e o longo tempo conseguiram mudar.

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