CUBA AMEAÇA TOMAR A BASE DE GUANTANAMO


Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 21 de setembro de 1960

Neste texto foi mantida a grafia original

HAVANA, 20 - Cuba aproveitou hoje os problemas de hotel com que Fidel Castro se defrontou em Nova York, para ameaçar novamente os Estados Unidos de ocupar a grande base naval norte-americana de Guantanamo.
O primeiro-ministro interino, Raul Castro, advertiu que "em um momento determinado" Cuba pode empreender uma ação contra a grande base naval dos Estados Unidos, avaliada em 70 milhões de dolares, encravada na baia do extremo oriental da ilha.
Castro manifestou que a ocupação de Guantanamo ainda "não está na ordem do dia" e alegou que "qualquer coisa que ali ocorrer será provocado ou auto- provocação do inimigo", mas acrescentou significamente que se trata de "territorio nacional" que pode ser "reclamado".
Por outro lado, o governo preparou demonstrações nacionais para protestar contra as dificuldades experimentadas pelo primeiro-ministro em Nova York, para encontrar alojamento nos hotéis. As restrições de segurança impostas aos movimentos de Fidel Castro foram qualificadas de "estupidas, insolitas , imbecis e indecentes".

Transferencia da ONU

O jornal governamental "Revolucion" pede hoje, em editorial, a transferencia das Nações Unidas, dos Estados Unidos "para um país civilizado", e diz que a instituição não deve ser "um cerrado de caça particular" dos Estados Unidos.
"Chegou o momento - diz "Revolucion" - de exigir que a sede das Nações Unidas deixe de funcionar nessa fabrica de novos ricos, nesse indescritivel centro de vendedores de cachorro quente."
Despachos do interior da ilha dizem que dezenas de milicianos fidelistas dormiram ontem à noite em redes ao ar livre, em uma demonstração de solidariedade com seu chefe nos problemas hoteleiros que teve em Nova York.
Os sindicatos operarios sob o controle do governo exortaram seus filiados a dormir ao ar livre em um "acampamento revolucionario" de natureza não especificada, até que Castro regresse a Cuba.
O irmão do primeiro-ministro, Raul Castro, que o substitui em sua ausencia, culpou o governo dos Estados Unidos dos problemas de Fidel sobre o alojamento de sua delegação.

Fidel no Harlem: US$ 1.000 por dia

NOVA YORK, 20 - O proprietario do Hotel Shelburne, Spatz, Edward que alojou o primeiro-ministro Fidel Castro e sua comitiva a sua chegada aqui domingo, disse hoje que a turbulenta transferencia dos cubanos de seu hotel para outro do Harlem (o bairro dos pretos) foi uma «manobra de propaganda deliberada».
Por sua parte, Andrew Berding, secretario de Estado adjunto dos Estados Unidos, qualificou o incidente de «o drama hoteleiro de Castro, em três atos». Disse que primeiro foi o pedido da gerencia do Shelburne a Castro de um deposito de 10.000 dolares para sua conta de 400 dolares diarios e os possiveis danos que pudesse ocasionar: o segundo ato foi a queixa de Castro ao secretario-geral das Nações Unidas. Dag Hammarskjoeld, pelo tratamento de que foi alvo; e o terceiro, a transferencia de Castro para um hotel do Harlem.
Berding comentou: «Eu diria que mais que um drama, foi uma comedia.»
Por sua parte, Love Woods, gerente e arrendatario do Hotel Teresa, do Harlem, de 11 andares, e 40 anos de funcionamento, disse aos jornalistas que os cubanos «se portam bem e não nos causam nenhum descontentamento».
Manifestou que o grupo está alojado nos andares oitavo, nono e decimo.
Woods informou que quando os cubanos se comunicaram com ele ontem à noite lhe ofereceram um cheque de 845 dolares, porem disse a eles que somente aceitaria dinheiro. Perguntado que razão tinha para isso, já que o hotel aceita cheques de outros hospedes, respondeu «não os conheço o suficiente para aceitar um cheque.»
A conta dos cubanos, compreendendo o serviço nos aposentos, que são 30, com radio e televisão, ascenderá a 1.000 dolares diarios, segundo calcula Woods. Disse que dão boas gorjetas, por exemplo, 1,25 dolares por uma conta de café e sanduiches no valor de 5 dolares.

© Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.