CONSIDERADA COMO UM "VEREDICTO HISTORICO" A DECISÃO SOBRE A SEGREGAÇÃO RACIAL NOS E.U.A.


Eisenhower apóia a medida aprovada pela Suprema Corte, declarando inconstitucional a discriminação - Repercussão entre os elementos sulistas

Publicado na Folha da Manhã, quarta-feira, 19 de maio de 1954

Neste texto foi mantida a grafia original

WASHINGTON, 18 - Declarando inconstitucional a segregação racial escolas publicas norte-americanas, a Corte Suprema dos Estados Unidos proferiu ontem o que já se pode chamar "um veredicto historico", que poderá trazer importantes modificações na vida quotidiana.
Essa decisão, que se inscreve no programa do movimento de emancipação da população de cor, iniciado logo após a guerra da secessão, encerra um debate que colocava no plano judiciário os representantes de 15 milhões de negros que vivem principalmente nos Estados do sul.
Entretanto, a sentença da Corte Suprema, que afeta 70% da população de cor, que vive em 17 Estados onde segregação é posta em pratica nas escolas, não tem aplicação imediata. A Corte Suprema indica, com efeito, que caberá aos tribunais estudar quando e como sua decisão de principio poderá passar aos fatos.
Pode-se aguardar uma luta encarniçada de parte de um bom numero de Estados. Varios deram mesmo a entender que, no caso de que seus esforços não lograssem exito, eles contornariam a decisão da Corte Suprema, transformando suas escolas publicas em escolas particulares. Dessa forma, poderiam continuar sua politica de segregação racial.
Nada leva a pensar, por outro lado, que a população negra esteja muito desejosa de ver seus filhos frequentando as mesmas escolas que os brancos. O elemento de cor deseja conservar uma coesão marcante.
Assim tambem, segundo numerosos observadores, o que procura esse elemento é, por intermedio da abolição da segregação racial nas escolas, a igualdade com os brancos no plano dos empregos e das funções, notadamente nos serviços publicos.
A decisão da Corte tem a integral aprovação do presidente Eisenhower. Em dezembro ultimo, o presidente, fiel a uma de suas promessas eleitorais, havia, por intermedio do ministro da Justiça, afirmado que "a Corte Suprema tinha o direito e o dever de decretar inconstitucional a segregação racial nas escolas publicas". Um ano antes, uma opinião semelhante fora emitida pelo ministro da Justiça do governo Truman. Vale dizer que a linha divisoria entre os partidarios e os adversarios da segregação racial não é a dos partidos politicos, mas a linha que, ao tempo da guerra de secessão, separava o norte e o sul dos Estados Unidos.

Repercussão nos Estados Sulinos

ATLANTA, GEORGIA, 18 - Os jornais do sul dos Estados Unidos publicaram, hoje, sob grandes titulos a historica decisão do Supremo Tribunal Federal, que declarou anticonstitucional a separação entre negros e brancos nas escolas publicadas.
Os partidarios da segregação agruparam-se imediatamente para impedir que a decisão derrube a tradicional barreira que a cor estabeleceu nos centros de ensino dos Estados Unidos.
O Supremo Tribunal publicou, ontem, a decisão, que, segundo alguns, é a mais importante para o sul desde que Lincoln proclamou a emancipação dos negros.
A decisão de ontem - adotada por unanimidade pelos nove juizes do Supremo - afeta 17 Estados, cuja constituição estabelece que o Estado deve dar educação gratuita, igual, porem separada, a brancos e negros, a outros 4 Estados que permitem em certos casos a segregação de uns e outros, e ao Distrito de Columbia.
O Supremo terá que ditar outras disposições mais para que se possa levar a cabo sua decisão, porem foram muitos no sul os que manifestaram colera, desaprovação ou desaponto.
O Ministro da Justiça do Estado da Georgia, sr. Eugene Cook, declarou hoje que se havia comunicado com os ministros de Justiça de outros 17 Estados e que nenhum deles se mostrava disposto a cumprir a decisão.
O governador do Estado de Mississipi, sr. Hugh White, nomeou uma Comissão Assessora cuja finalidade consistirá em preparar os projetos de lei que sejam necessarios para evitar legalmente o comprimento do decidido pelo Supremo.
Em outros Estados foram adotadas medidas similares.

O Governo da Georgia pretende manter a segregação

ATLANTA (Georgia), 18 - Em consequencia da decisão da Corte Suprema. declarando que a segregação racial, tal qual é praticada nas escolas de numerosos Estados do sul, é contraria à Constituição Americana, o governador da Georgia, sr. Herman Talmadge, foi o único dos governadores do sul a anunciar publicamente que seu governo não levaria em conta o parecer da Corte.
Apoiando-se sobre o direito que a Constituição Federal concede a cada um dos Estados, de regular seus proprios negocios, quando não concernem senão a esse Estado, o governador Talmadge declarou que "o fato de que a Suprema Corte tenha considerado oportuno fazer uma lei de seus pontos de vista sociologicos não altera em nada a questão". Ele fez imediatamente questão de anunciar sua intenção de convocar sem demora a Comissão Escolar do Estado, para concretizar um programa "assegurando a continuação duma segregação racial permanente".


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