NIXON DEFINE SUA POLITICA EXTERIOR


Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 1970

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O presidente Richard Nixon enviou ontem ao Congresso uma mensagem de 40 mil palavras, definindo a politica exterior dos Estados Unidos durante seu governo.
Das 119 paginas do documento, 12 foram dedicadas à America Latina. O chefe da Casa Branca insistiu num novo relacionamento com o Hemisferio, "a fim de forjar uma relação construtiva e criar um programa de ação para o progresso onde as forças da reforma tomem o lugar das promessas paternais".
"Nosso poderio lançou uma sombra sobre as relações formais de igualdade com a America Latina e mesmo o uso moderado desse poder não foi tranquilizador, fazendo crescer a tensão entre nós. Nossos programas de desenvolvimento eram feitos sem consultas aos nossos vizinhos e esse estilo de tutela entrou em choque com o nacionalismo das nações do Hemisferio Ocidental. Os problemas sociais se agravaram e com eles a instabilidade politica, gerando os radicalismos", disse Nixon.
"Por tudo isso - prossegue a mensagem de Nixon - julgamos oportuno propor uma nova politica com a America Latina, criando uma comunidade de Estados independentes, auto-suficientes e unidos, para os quais os EUA devem contribuir, mas não dominar. Sozinhos não poderemos assumir a responsabilidade pelo desenvolvimento socio-economico de outras nações. Portanto, para a decada de 70 precisaremos estruturar um relacionamento que encoraje as nações e se ajudarem a si mesmas. Nosso papel é persuadir e suplementar, e não receitar. Cada nação deve ser fiel a seu proprio carater".
Em outro trecho do relatorio, o presidente Nixon adverte sobre o crescente poderio da União Sovietica, que poderá ameaçar a segurança dos EUA até o fim da decada. Propôs uma "nova era" de negociações com Moscou para diminuir a tensão no mundo, ao mesmo tempo em que alertou que os EUA estão dispostos a manter a sua capacidade estrategica e não deixar-se ultrapassar em poderio pela URSS.
Sobre o Vietnã, o presidente norte-americano disse que "a chave da paz está em Hanói".
Sobre o Oriente Medio afirmou que os EUA manterão o equilibrio de forças na região enquanto os russos continuarem a armar os arabes e pediu aos países em conflito que acatem as resoluções da ONU, respeitando o cessar-fogo para permitir as negociações politicas.

A reação de Moscou

MOSCOU - A reação sovietica inicial ao discurso de Nixon a respeito do "estado do mundo" é de que não representa alteração alguma da politica norte-americana.
A Agencia Tass reagiu asperamente ao informe presidencial.
"Apesar de a mensagem assinalar a necessidade de uma revisão cuidadosa de algumas velhas posições e de uma "nova focalização" dos problemas da paz, os propositos e tarefas principais da politica dos Estados Unidos continuam sem alteração", diz a noticia da Tass procedente de Washington .
A TASS diz que o discurso do presidente continua "dando enfase à força militar como base da política exterior norte-americana".
"Nixon reafirmou a decisão do governo de prosseguir com a construção da segunda etapa do sistema de projetos antibalisticos e o aumento do potencial de projeteis nucleares", declarou a TASS, como que sugerindo que isso teria pessima repercussão nas negociações de limitação de armas estrategicas que serão realizadas em Viena em abril.

Os pontos de destaque

WASHINGTON, 18 - São estes os pontos de maior destaque na mensagem sobre a politica exterior e a paz mundial enviada pelo presidente Nixon ao Congresso.
PAZ MUNDIAL - "A paz deve constituir-se em muito mais que a ausencia da guerra. A paz deve fornecer uma estrutura duradoura de relações internacionais que detenha ou suprima as causas da guerra."
"A associação e a força são duas colunas que sustentam a estrutura de uma paz duradoura. A negociação é a terceira. Nossa dedicação à paz é demonstrada de forma convincente por nossa vontade de negociar certas divergencias de forma justa com os países comunistas."
UNIÃO SOVIETICA - "As possibilidades para a decada de 1970 são de que os sovieticos venham a possuir forças estrategicas que vão aproximar-se e, em alguns casos, superar as nossas. O atual aumento das forças estratégicas dos sovieticos sugere graves interrogações sobre até onde pretendem chegar e a ameaça que isso representa para nós."
"Em detrimento da causa de paz, a União Sovietica não teve uma influencia benefica sobre os norte-vietnamitas em Paris. A esmagadora maioria do material de guerra que chega ao Vietnã do Norte provem da União Sovietica, o que significa uma forte responsabilidade no prosseguimento da guerra."
"Nas conversações do Oriente Medio não vimos por parte dos sovieticos a flexibilidade pratica e construtiva necessaria a um resultado favoravel. Temos provas alem disso de que a União Sovietica busca uma posição na referida região que tornará mais provavel a rivalidade das grandes potencias."
VIETNÃ - "A chave para a paz repousa em Hanói, em sua decisão de pôr termo ao derramamento de sangue e negociar no verdadeiro sentido da palavra. É tempo que Hanói atenda a preocupação da Humanidade e converta as negociações num debate serio. Hanói nos encontrará prontos e flexiveis."
ORIENTE MEDIO - "Este governo continua acreditando que as resoluções de tregua das Nações Unidas refinem as condições minimas que devem prevalecer nessa região, se é que se vai obter um acordo. Uma vez que existam aquelas condições minimas, acreditamos que apenas se pode conseguir um acordo mediante negociações pelas partes interessadas numa atmosfera de mutua disposição para uma transação".
"Agora reafirmo nossa declarada intenção de manter cuidadosa vigilancia no equilibrio das forças militares e fornecer armas aos amigos conforme surjam as necessidades".
CHINA - "A chave para nossas relações serão as ações que cada lado tome com relação ao outro e seus aliados. Não ignoraremos os atos hostis. Temos o proposito de manter nossos compromissos com os tratados para a defesa da Republica da China (Formosa). Entretanto buscaremos fomentar entendimentos que possam estabelecer uma nova norma de ações mutuamente beneficas".
LIMITAÇÃO DE ARMAS - "Realizaremos um decidido esforço atraves destas negociações para lograr acordos que não apenas protejam nossa segurança nacional mas na realidade a aumentem".
EUROPA - "Passando de dominante para país associado existe a possibilidade de que alguns vejam isto como um passo para a desunião. Todavia na terceira decada de nossos compromissos com a Europa, a profundidade de nossas relações é um fato real. Não podemos desligar-nos da Europa como não o podemos fazer do Alasca."
AMERICA LATINA - "Nossa tarefa conjunta é construir uma comunidade de instituições e interesses suficientemente ampla e elastica para levar em conta nossas divergencias nacionais. Nossos conceitos de futuras relações americanas devem, por conseguinte, ser baseados tanto em divergencias como em concordancia".
 

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