GÁS E LÁGRIMAS NA CASA BRANCA

Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 16 de novembro de 1977

Numa manifestação de protesto pouco comum em Washington cerca de 10 mil pessoas em sua maioria iranianos residentes nos Estados Unidos - enfrentaram ontem a policia em frente à Casa Branca, no momento em que o xá Mohammed Reza Pahlevi era recebido pelo presidente Jimmy Carter. O vento levou o gás lacrimogêneo para os jardins da mansão presidencial incomodando a todos.
Ao mesmo tempo em Teerã irrompiam violentos distúrbios com os estudantes saindo às ruas e sendo contidos pelas forças policiais.
Em Washington, os manifestantes, portanto longos bastões, venceram a primeira barreira policial e chegaram ao gradil do muro da Casa Branca, obrigando a policia a uma violenta intervenção, com dezenas de prisões e feridos. O som das sirenas de ambulâncias e viaturas policiais abafaram o discurso do xá, que não pôde ser ouvido.

Xá é recebido com protestos nos EUA

WASHINGTON - Aos ritos de "Abaixo o Xá" e "O Xá é ditador", cerca de dez mil pessoas tentaram invadir ontem os jardins da Casa Branca para protestar contra a visita de Mohammed Reza Pahlevi aos Estados Unidos. depois do incidente, o Xá afirmou que os manifestantes são em sua maioria "marxistas e anarquistas que usam máscaras."
A primeira linha de proteção policial estendida em torno da Casa Branca foi ultrapassada pelos manifestantes que, usando máscaras e portanto bastões, atacaram um grupo de partidários do Xá, fazendo com que a protocolar salva de tiros de canhão fosse interrompida.
Com bombas de gás lacrimogêneo a polícia conseguiu conter as manifestantes e fez várias prisões. No jardim da Casa Branca, o presidente Jimmy Carter, sua esposa e os visitantes iranianos precisaram usar lenços por causa das nuvens de gás lacrimogêneo levadas pelo vento.
Lacrimejando, Carter recebeu o Xá com um discurso em que afirmou ser ele "um velho amigo do nosso país". Pahlevi, tambem aparentando calma agradeceu à recepção em rápido discurso que quase não foi ouvido por causa do barulho das sirenes de ambulâncias e veículos policiais.
Ao que parece, um cavalariano ficou ferido ao ser derrubado por seu cavalo atingido por uma lata de lixo, e outras pessoas tiveram mãos e braços quebrados.
As manifestações de protesto contra a visita de Pahlevi começaram na segunda-feira em Williamsburg, estado de Virginia, onde o Xá passou a noite e continuaram por volta das 4 h locais (6 h em Brasilia), quando os manifestantes concentraram-se na praça Lafayette próxima à Casa Branca. Ao amanhecer, cerca de 250 iranianos usando máscaras - "para impedir a identificação pela policia secreta iraniana" - iniciaram uma passeata.
Uma hora antes da chegada do Xá os manifestantes já eram mais de 5 mil. Paralelamente, a poucos metros dali, e protegidos pela policia centenas de iranianos realizavam uma manifestação de apoio ao Xá, com faixas dizendo "O Xá é a resposta" e "Longa vida ao Xá".
A manifestação de protesto transcorreu pacificamente até a chegada de Pahlevi, em um helicóptero, em lugar da tradicional limusine oficial. Essa é a primeira vez que uma recepção a um chefe de Estado é interrompida na Casa Branca por manifestações de tal intensidade O Xá já esteve nos Estados Unidos 12 vezes.

Desculpas

Após entrarem na Casa Branca, Carter pediu desculpas a Pahlevi "pela poluição temporária do ar". considero uma grande honra recebê-lo no primeiro ano de meu mandato", afirmou Carter. E acrescentou: "Quando o Xá passou a liderar sua nação, há 36 anos, o Irã estava ocupado por uma potência estrangeira. Durante o seu reinado, o surto de crescimento levou o país a uma notável posição de liderança mundial".
Em entrevista à televisão americana, Pahlevi afirmou que as manifestações contra sua visita não o perturbaram. Disse ao entrevistador que "se você perguntar quem estava lá, descobrirá que são em sua maioria marxistas e anarquistas que usam máscaras". E sugeriu que o número de pessoas diante da Casa Branca deveria ser comparado com "o número dos que são por meu país e seu rei".
Ao ser indagado sobre se sugeria que as manifestações contra ele não estavam sendo na verdade realizadas por estudantes iranianos, o Xá respondeu: "Alguns deles, talvez muitos deles, sejam estudantes iranianos nos Estados Unidos, mas são estudantes profissionais. Soube que aqui eles têm a foice e o martelo nas portas de seus carros".
Na entrevista, Pahlevi disse ainda que daria "boas-vindas" a uma discussão sobre os direitos humanos com o presidente Carter. Ao ser consultado sobre as acusações de que o Irá tortura os presos afirmou: "A tortura não existe mais em meu país. Adotamos medidas para que as pessoas contem com advogados civis em sua defesa e, após o exame completo, seu processo é enviado imediatamente ao tribunal".
Desmentiu também que existam cem mil presos políticos no Irã afirmando: "há apenas 2200 presos, em sua maioria terroristas, todos marxistas".

Embargo

Com relação às conversações que manterá com Carter, o Xá afirmou esperar que o presidente norte-americano peço que os preços do petróleo não sejam elevados "Eu diria que não vou fazer Pressões para nada, mas a OPEP tem 13 membros e somos apenas um deles". E acrescentou: "só posso garantir que não haverá qualquer embargo (de petróleo) por parte de meu país."
Durante as conversações com Carter, Pahlevi deverá também procurar obter garantias de que os Estados Unidos continuação a proporcionar treinamento e sofisticados equipamentos militares às Forças Armadas Iranianas. Nesse sentido, uma das principais preocupações de Pahlevi é conseguir que os Estados Unidos vendam 140 caça-bombardeiros F-16 ao Irã, pois há alguns setores do Senado que se opõem essa transção.

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