O EXERCITO ASSUME O PODER NA INDONESIA


Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 13 de março de 1966

Neste texto foi mantida a grafia original

JACARTA, 12 - O presidente Sukarno transmitiu todos os poderes executivos ao comandante do Exercito, general Suharto, para que este restabeleça a ordem no país, conturbada pelas manifestações anticomunistas e pró-comunistas, que vinham ganhando intensidade nos ultimos dias.
A transmissão dos poderes executivos a Suharto é fato consumado, mas ainda não se sabe ao certo se implica no afastamento definitivo de Sukarno, cujo paradeiro é ignorado, mas que aparentemente se mantem na Presidencia.
Segundo a radio de Jacarta, a transmissão de poderes verificou-se hoje cedo, ao mesmo tempo em que forte contingente militar (em meio ao qual vinte batalhões da divisão "Siliwangi", fiel ao lider anticomunista e ex-ministro da Defesa, Nasution) desfilava pelas ruas. Tal demonstração de força, segundo a emissora, destinava-se a mostrar a coesão entre o governo do presidente Sukarno, as Forças Armadas e o povo.
A primeira providencia de Suharto, ao assumir os poderes executivos, foi declarar ilegal o Partido Comunista Indonesio. Suharto lançou depois uma proclamação à nação, afirmando que havia recebido plenos poderes para manter a ordem, e que o Exercito não permitirá que a revolução indonesia se oriente para a extrema-esquerda ou para a extrema-direita.
O novo dirigente da nação pediu a colaboração das Forças Armadas e da Policia. Instou os industriais e comerciantes a ajudarem na tarefa de restauração da ordem economica do país, destacando principalmente a falta de generos alimenticios observada nos ultimos dias.
Horas depois de assumir o poder, Sukarno convocou uma reunião de chefes militares, e corriam boatos de que ele anunciaria brevemente a decretação do estado de sitio e a formação de um novo governo.
Enquanto esses boatos, em meio aos comunicados oficiais, criavam expectativa em alguns setores, noutros o ambiente era de completa euforia. Estudantes e dirigentes das manifestações anticomunistas, que praticamente sitiaram o palacio presidencial nos ultimos dias, dançavam e cantavam nas ruas, e alguns mais exaltados exigiam a cabeça do ministro das Relações Exteriores, Subandrio, apontado como o maior amigo dos comunistas no gabinete reformado dias atrás por Sukarno.
Informou-se que Subandrio estaria sendo caçado pelo Exercito, mas seu paradeiro, bem como o de Sukarno, não era conhecido.
Segundo fontes do governo, Sukarno encontrar-se-ia no seu palacio de verão, em Bangor, para onde teria se dirigido ontem em companhia de Subandrio, ao ter noticia de que tropas de paraquedistas preparavam-se para ocupar aquela residencia. Ao chegar de helicoptero em Bangor, Sukarno teria já encontrado os militares, que o teriam forçado a transmitir os poderes a Suharto, num "meio golpe de Estado".
Observadores diplomaticos acreditam que a transmissão de poderes pode ter-se verificado por imposição dos militares, ou então por ter o proprio Sukarno chegado à conclusão de que somente o comandante do Exercito poderia restabelecer a ordem. Se se confirmar a primeira hipotese, a situação poderá evoluir para uma clara ditadura militar, com o definitivo afastamento de Sukarno; na segunda, o presidente estaria procurando ganhar tempo, para retornar ao poder em condições mais satisfatorias. Para retornar, porem, parece que Sukarno terá de sacrificar o chanceler Subandrio, no qual se concentra a campanha antigovernamental dos anticomunistas.

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