A VIDA DO HOMEM QUE MUDOU A HISTÓRIA DA CHINA: A LONGA
MARCHA DE HUNAN A PEQUIM
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Publicado
na Folha de S.Paulo, sexta-feira, 10 de setembro de 1976
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Da editoria internacional
Falar de Mao, o filho de camponeses nascido em 26 de dezembro de 1893
na província de Hunan, é falar da história da
China contemporânea.
Uma vida intensa de participação política e de
teorizações sobre a revolução socialista,
conferiu-lhe a posição de governante de 900 milhões
de chineses.
Aos 18 anos, o estudante Mao Tse-tung faz parte do exército
rebelde que se levantou contra a dinastia manchu; depois de seis meses,
acreditando que "a revolução estava terminada",
volta a seus estudos na Escola Normal de Hunan. Ajudante de bibliotecário
na Universidade de Pequim em 1918, teve contato com todos os principais
centros intelectuais que buscavam definir as modernas diretrizes da
nova sociedade chinesa.
Mao Tse-tung - ou o "grande Timoneiro", como querem seus
seguidores - participou do Congresso de fundação do
Partido Comunista Chinês em 1921, e já em 1927 organizava
a revolta de outono em Hunan. Nesse mesmo ano, com a divisão
entre comunistas e o Kuomintang, juntamente com Chu Teh, Mao organizou
o Exército Vermelho de Quancim, província onde instituiu
um governo soviético e decretou reformas agrárias.
O Kuomintang, fundado em 1891 por Sun Yatsen, havia participado da
primeira revolução chinesa de 1911 e desencadeou a segunda
revolução em 1912 contra o marechal Yuan Shikai, dominando
o sul da China em 1930. Em 1925, Chiang Kai-shek sucedeu Sun Yatsen
e subordinou a sua política e idéias sociais à
obtenção pura e simples da vitória militar. Mao
baseou sua oposição ao Kuomitang a essa tese que deformava
os ideais de transformação social da China.
Dono de inegável talento, autodidata, intelectual, poeta e
prosador, político hábil e astucioso, militar de grande
estatura e senso estratégico, impôs-se à admiração
quase incondicional dos chineses, na luta sangrenta e prolongada que,
com grande paciência, travou durante 20 anos contra o invasor
japonês e contra as forças de Chiang Kai-shek até
finalmente conquistar o poder e assumir, em 1949, a presidência
do Governo central, em Pequim.
Em 1958 renunciou ao cargo, por sua própria sugestão
ao Comitê Central do Partido Comunista Chinês, para dedicar-se
a outras atividades, aparecendo pouco em público. Esse afastamento
voluntário foi interpretado, durante muito tempo, como motivado
por enfermidade ou decadência de prestígio político.
Contudo, para surpresa geral, inclusive no mundo comunista, lançou,
em 1964, a 'Revolução Cultural Proletária",
no seio de difícil e prolongada luta pelo controle do Partido,
do Exército e do Governo.
Sua morte pode encerrar todo um período histórico e
um estilo de liderança, no seio do movimento comunista, que
se iniciou com Marx e Engels, no século passado.
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Os
primeiros anos |
Aos seis anos de idade Mao Tse-tung já trabalhava com o pai,
que, começando na mais extrema pobreza - semelhante a de milhões
de chineses, daquela época - conseguiu enriquecer comprando
cereais, para vendê-los a preços mais bem elevados aos
negociantes da cidade. Dos 8 aos 13 anos de idade frequentava a escola,
em Changsa. Em 1911 teve os primeiros contatos com as idéias
socialistas, quando ingressou no partido rebelde de Li-Iuan-Hung.
Como bibliotecário da Universidade de Pequim e mesmo antes,
na biblioteca provincial de Hunan, dedicou-se ao estudo particularmente
de história e geografia. Conheceu assim a história da
Grecia antiga, como também a da Russia, Inglaterra, França
e Estados Unidos, estravasando ainda sua infatigável curiosidade
literária pela leitura de poesias e romances.
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Iniciação
política |
Ao eclodir a Revolução Russa, em 1917, Mao, aos 24 anos,
publicou um anuncio em um jornal de Changsa, convocando todos os jovens
que estivessem interessados em apoiar um movimento patriotico. Nasceu
assim, por sua iniciativa, a "Hsin Min Hsueh Hui" (Sociedade
de Estudos do Nosso Povo), cujos membros em sua maioria, estimulados
pelos acontecimentos na Russia, filiaram-se depois ao Partido Comunista
Chinês, fundado em 1921.
Como líder do PCC, na sua província natal, ajudou a
organizar um movimento sindical.
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O
massacre de Xangai |
Em 1923, a União Soviética celebrava uma aliança
com o Partido Nacionalista da China, o Kuomintang, que dominava politicamente
o país. Chiang Kai-shek era, por esse tempo, um simples e jovem
oficial do Exército.
Em 1927 os exércitos do Kuomintang - entre os quais havia unidades
comunistas - aproximavam-se de Xangai, ainda em poder dos "senhores
da guerra", contra os quais se haviam aliado nacionalistas e
comunistas; enquanto as tropas assaltavam a cidade, sob o comando
de Chiang, os comunistas iniciavam a sublevação das
ruas. Tomado o grande porto, área de influência internacional,
colocou-se o problema do poder: os dois grandes aliados da véspera
tornaram-se adversários.
Temendo o crescente poderio dos comunistas, e para prevenir-se de
um movimento pela conquista do poder, Chiang Kai-shek desencadeou
uma violenta repressão aos comunistas: o Massacre de Xangai.
Mao foi preso mas conseguiu fugir com um grupo de companheiros. Sua
esposa, Yang Kaihuliy, no entanto, foi fuzilada. Em companhia de um
reduzido grupo de trabalhadores rurais, perseguidos como ele e sem
armas para a própria defesa, Mao procurou um esconderijo nas
montanhas, situadas na fronteira entre Hunan e Kiangsi.
Foi esse núcleo inicial de sua campanha de guerrilhas: fundando
na China Meridional um "soviet" em pequenas proporções,
fustigava sem cessar as tropas do governo de Pequim. Tornou-se aos
poucos causa de constante preocupação e séria
ameaça para Chiang Kai-shek. O perigo evolui com o crescimento
das forças insurretas, que afinal chegaram a atingir 100.000
homens. Chiang Kai-shek resolveu, então, mobilizar um Exército
de 300.000 homens que, arremetendo contra a zona ocupada, estabeleceu
afinal o que se acreditou ser um certo intransponível em torno
de Mao e seus guerrilheiros.
Ao Exército Vermelho e seu chefe apresentou-se nesse movimento
um dilema: Não possuiam aviões nem tinham artilharia
suficiente para romper a barreira dos nacionalistas e, além
disso, na região em que se encontravam, erguiam-se, como outros
consideráveis obstáculos à retirada, as mais
altas cordilheiras da Ásia e 24 dos seus principais rios. A
fuga nessas condições significava o esmagamento total
dos rebeldes.
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A
longa marcha |
O esfarrapado exército de Mao Tse-tung seguiu avante sem esmorecer.
O que passou para a história como a "longa marcha"
mereceu na época o escárnio de Chiang Kai-shek que,
ironicamente, chamou-a de "Marcha Fúnebre".
Rompendo as linhas nacionalistas os comunistas marcharam na direção
do rio Iang-Tsé, e Mao alcançou enfim as proximidades
do seu primeiro objetivo. Ali diminuiu o ritmo da marcha de suas tropas,
mas logo verificou que estava diante de uma barreira: todos os vaus
existentes do largo rio estavam ocupados pelas tropas de Chiang Kai-shek,
que recebiam constantes reforços.
Era preciso agora lançar mão de outro recurso: escolhidos
os melhores homens, formou-se um batalhão que, em marcha forçada
de 85 milhas, durante um dia e uma noite, atingiu a cidade de Chu
Ping. Disfarçando-se com uniformes tomados aos prisioneiros
nacionalistas, esse batalhão penetrou na localidade e desarmou,
na calada da noite, a guarnição. Com o mesmo disfarce
e fazendo-se passar por reforços de Chiang Kai-shek, os guerrilheiros
conseguiram ludibriar o inimigo, dele recebendo auxílio para
cruzar o rio, em seu lado Setentrional e, embora em pequeno número,
estabeleceram-se com relativa segurança na margem oposta. Simultaneamente,
o grosso do Exército de Mao avançava rapidamente sobre
Chu Ping. Iniciando, no dia seguinte, a travessia do Iang-Tsé.
Não se perdeu um só homem. Milhares de milhas separavam-nos
agora de Kiangsi.
A derrota do Iang-Tsé fora uma das mais severas sofridas por
Chiang Kai-shek, mas restava-lhe ainda uma esperança: a região
que as tropas depauperadas de Mao teriam forçosamente que atravessar
era dominada pelos Lolos, uma das tribos mais ferozes da China e cujo
ódio aos chineses perduram por séculos. A Chiang Kai-shek
afigurava-se que o restante do esfacelado exército comunista
seria destroçado pelos temíveis silvicolas. Mas Chiang
Kai-shek estava mais uma vez equivocado.
Pelas localidades nas quais ia passando, além de novos elementos,
cuja adesão recebiam para reforço de seus efetivos,
os comunistas libertavam dos cárceres vários chefes
Lolos, que enviaram à sua frente, com mensagens de amizade
à suas tribos. Ao atingir o território Lolo, o exercito
guerrilheiro de Mao foi recebido como aliado.
Mas a luta ainda não terminara. Outro grande obstáculo
restava a ser transposto. Ao deixarem a região de Lolos, os
comunistas seguiram na direção do "Grande Tatu",
rio que contavam poder cruzar facilmente. Atingiram-no várias
semanas antes dos reforços nacionalistas, mas a ponte, que
se propunham atravessar - a Liu Tin Chiao (ponte construída
por Liu) - fora destruída. As correntes que a sustinham continuavam
entretanto no mesmo lugar, sobre a garganta de mais de cem metros
de profundidade. Do lado oposto, efetivos nacionalistas avançados
aguardavam-nos com um ninho de metralhadoras. Mao escolheu trinta
de seus homens que, agarrando-se às correntes, começaram
a cruzar o rio, visados pelas metralhadoras, enquanto seus companheiros
protegiam-nos, fazendo cerrado fogo contra o inimigo. Mais de vinte
voluntários conseguiram atingir a outra margem, enquanto os
nacionalistas recuavam.
Finalmente, no dia 20 de outubro de 1935, depois de vencer dificuldades
de toda ordem, Mao e seus companheiros chegavam à província
de Shensi.
Terminada a "Grande Marcha", que se prolongou por 368 dias
e durante a qual foram ocupadas 62 cidades, dos cem mil homens que
a haviam iniciado, apenas 20 mil, aniquilados pelo cansaço
e pelas privações, restavam a Mao Tse-tung. Era preciso
reconstruir as forças.
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Frente
única |
Foi logo após Mao Tse-tung e seus companheiros haverem concluído
a longa marcha, e quando já se preparavam para a nova arremetida
através do território chinês, rumo a Pequim, que
a Internacional Comunista aprovou uma Resolução preconizando
uma política de Frente Única, a fim de que a China pudesse
dispor internamente de todo o seu poderio bélico e humano par
pôr fim à grave ameaça que se apresentava à
independência de todo o país: a invasão japonesa.
Nesse sentido, um apelo foi dirigido ao povo chinês. Mas, no
inverno de 1936/37 os japoneses já haviam fortalecido suas
posições em Suian, e Chiang Kai-shek continuava mais
preocupado com os comunistas do que propriamente com as ambições
imperialistas do Japão. Assim, em lugar de preparar seu Exército
para repelir o inimigo estrangeiro, concentrava suas tropas em Kansu
e Shiensi, para iniciar mais uma campanha que considerava de extermínio
contra os comunistas.
Chiang Kai-shek passou nessa fase histórica um período
de terrível indecisão: recebia substancial ajuda material
dos Estados Unidos, inclusive para a luta contra os comunistas; mas
Stalin, que o concitara a consentir na Frente Única para combater
os japoneses, fornecia-lhe auxílio insignificante, que somente
na última hora tornou-se palpável. A respeito dessa
fase de sua carreira em que dúvidas terríveis o atormentaram,
chegou mesmo a confessar, posteriormente, a um diplomata francês:
"Em certo momento, eu podia jogar três cartas: a japonesa,
a russa e a norte-americana. A japonesa não pude jogá-la.
Foram os próprios japoneses que a impediram. A russa não
quis eu mesmo jogá-la e talvez tivesse errado, porque Stalin,
que pouco ligava para o comunismo chinês, pedia-a apenas para
combater contra os japoneses e acreditava que só poderia fazê-lo".
Em 1936, Chiang Kai-shek, o generalíssimo, caiu prisioneiro
das tropas manchus do marechal Chang-Sue-Liang, que, enviado ao Norte
de Shensi para combater Mao, dispunha-se a entregar-lhe Chiang Kai-shek,
para que fosse justiçado. Chiang foi libertado, e selada a
aliança antijaponesa.
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Reconstrução |
Os anos que vão de 1949 a 1958 constituíram um período
talvez tão difícil quanto o equivalente a toda a campanha
revolucionária, desde os dias longínquos de Hunan. Baseando
a política do Partido na unidade do proletariado, do campesinato,
da pequena burguesia e da burguesia nacional, considerados como todo
o povo chinês libertado da opressão externa e das forças
internas que impediam o seu livre desenvolvimento, Mao Tsé-Tung
traçou os rumos de uma Nova China.
Enfrentando as duras condições de período conhecido
como o da "guerra fria", a partir de 1947, a Revolução
Chinesa desenvolveu-se paciente e duramente, concentrando seus esforços
na reconstrução do povo e do país.
Dessa fase de reconstrução do país e de início
da construção do socialismo na China Popular ressalta-se
o plano quinquenal denominado "Grande Salto Adiante", um
planejamento organizado simultaneamente em direção à
implantação de uma indústria de bens de produção
e de elevação rápida das rendas agrícolas
e da oferta de alimentos. O "Grande Salto" não deve
ser entendido apenas como um esforço de planejamento econômico:
na realidade, foi uma política global de desenvolvimento, em
que os relativamente modestos êxitos obtidos não foram
nunca colocados em contradição com o otimismo estratégico.
Nem mesmo os inimigos de Mao conseguiram desenvolver uma séria
política de oposição nessa fase.
Em 1957, Mao Tse-tung fez sua primeira e única visita ao Exterior,
indo à União Soviética, embora desejasse também
ser conhecido os países capitalistas avançados - conforme
afirmou - entre os quais os Estados Unidos.
É desse período, também, a chamada política
das "cem flores", destinada a estimular a discussão
em todo o país. Era definida nos seguintes termos: "Deixai
que as 100 flores desabrochem e que as 100 escolas de pensamento entrem
em disputa".
Depois de participar ativamente das denúncias contra o chamado
"culto à personalidade", desenvolvido por Stalin
na URSS, Mao deixou a presidência da República Popular
da China, em 1958, para dedicar-se apenas aos problemas do Partido
Comunista Chinês.
A partir de 1958 houve um período obscuro na vida de Mao, pois
raramente aparecia em público e correram fortes rumores a respeito
de sua morte, de possivel enfermidade ou de desprestígio político.
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Política
externa |
Durante certo tempo a política exterior chinesa não
se diferenciou da política externa dos países socialistas,
especialmente da União Soviética. Hoje, a URSS está
cercada de países que compartilham os mesmos interesses, e
que funcionam, para ela, como "Estados tampões",
de certo modo à semelhança de velhos hábitos
da política européia, desde o século XIX.
A política da China Popular, nesse sentido, não tem
sido muito diferente. Ao norte, há as fronteiras com a Sibéria
e a Mongólia. A leste, a Coréia do Norte e o Oceano,
separando-a da Coréia do Sul, Japão e Formosa. A oeste,
limita-se com repúblicas populares que fazem parte da União
Soviética, com a Caxemira - objeto de disputa entre o Paquistão
e a Índia - e com esta. Ao sul, com a Índia, o Nepal,
Butão, Birmânia e Vietnã.
Esta situação, contudo, não tem garantido estabilidade
política às relações da China com seus
vizinhos. A guerra da Coréia, da qual participaram os chineses,
os incidentes da fronteira com a Índia, os incidentes com a
URSS e a Guerra do Vietnã, têm sido, simultaneamente,
parte da política dos dirigentes chineses e fonte de inúmeros
problemas para eles.
Pouco se sabe do pensamento de Mao Tse-tung a esse respeito.
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"Tigres
de papel" |
De 1960, aproximadamente, até os dias atuais pode ser demarcado
mais um período distinto na trajetoria do líder revolucionário
chinês. Ele é marcado por uma série de acontecimentos
importantes, que estão ainda na memória de todos.
Tudo tem início após a morte de Stalin, principalmente
quando Nikita Kruschev assumiu o poder na URSS e começou a
desenvolver sua política de "coexistência pacífica",
justificada como necessária para evitar a 3a guerra mundial,
uma vez que a "correlação de forças",
em sua opinião, passara, após a última guerra,
a ser favorável às forças que "lutam pelo
socialismo, pela democracia e pela paz".
As divergências entre os chineses e soviéticos custaram
a transpirar para o exterior do movimento comunista. Os primeiros
sérios sintomas disso se verificaram quando da brusca retirada
de centenas de técnicos soviéticos da China, por ordem
de Kruschev.
Os acontecimentos sucederam-se com rapidez e, em 1963, as "divergências"
vieram oficialmente a público, por iniciativa dos chineses,
com a divulgação, para todo o mundo, de uma série
de documentos, nos quais estes marcavam seus desacordos com os soviéticos.
De todos estes documentos o mais importante talvez tenha sido aquele
em que os dirigentes do Partido Comunista Chinês fizeram uma
proposição de "linha geral" para todo o movimento
comunista internacional.
De todos os países comunistas, apenas a Albânia tomou
posição ao lado da China. Em situação
de relativo isolamento no plano internacional, os chineses acentuaram
os seus esforços por uma maior independência da União
Soviética sendo então acusados de nacionalistas - desafiando-a
num dos pontos principais de sua política: o desenvolvimento
e o uso da energia nuclear. Em 1964, mesmo ano da queda de Kruschev,
os chineses fizeram explodir a sua primeira bomba atômica.
Durante toda essa fase Mao Tse-tung continuou a aparecer pouco em
público, reforçando as suposições sobre
seu mau estado de saúde e a propósito de seu possível
desprestígio político. Na verdade, essas suposições
não alcançaram esclarecer o verdadeiro problema.
Aos 72 anos de idade, quando tudo parecia confirmar a hipótese
de um lento mas inexorável declínio fisco e político,
Mao Tse-tung, demonstrando extraordinário vigor e audácia
lançou a "Revolução Cultural Proletária"
e organizou seus executores: a "Guarda Vermelha", em meio
a uma áspera e ruidosa luta pelo controle do Partido, do Exército
e do Governo. Nessa ocasião projetaram-se vários nomes,
entre os quais o de Lin Piao, chefe das Forças Armadas.
Embora tenha escrito volumosa e variada obra, Mao nada publicou nesta
fase; mas, soube-se então, organizara um extrato de seu pensamento,
entremeado de afirmações segundo a tradição
cultural de seu povo, que reuniu em um pequeno livro (As Citações
do Presidente Mao), que se tornou o guia teórico da "Guarda
Vermelha" e instrumento de agitação e propaganda
entre as massas.
As "citações" tornaram-se também mais
um instrumento de luta de Mao contra o que denominava de "revisionismo"
dos dirigentes soviéticos. Considerando a estratégia
soviética derrotista, lançou a famosa consigna "O
imperialismo é um tigre de papel". Em poucas palavras,
explicava sua tese: "Assim como não existe nada no mundo
que não tenha uma dupla natureza, também o imperialismo
e todos os reacionários têm sua dupla natureza. Eles
são tigres verdadeiros e ao mesmo tempo tigres de papel...
Nesse caso, eles eram mesmo tigres vivos, tigres de ferro, tigres
de verdade. Mas, ao fim das contas, eles se transformaram em tigres
de papel, em tigres mortos, em tigres de queijo de soja. Assim, considerados
na sua essencia, do ponto de vista do futuro e de um angulo estratégico,
o imperialismo e todos os reacionários devem ser considerados
como tigres de papel; é aí que se baseia nosso pensamento
estratégico. Por outro lado, eles são também
tigres vivos, tigres de ferro, verdadeiros tigres, porque eles comem
homens; é aí que se baseia nosso pensamento tático".
Depois da Revolução Cultural, as campanhas ideológicas,
levadas a nível de massas, continuaram a se suceder.
No início desta década, a campanha iniciada contra o
pensamento de Confúcio, o filósofo "reacionário",
encerrou-se com uma tentativa de golpe liderada por Lin Piao, o antigo
companheiro de armas de Mao que, quando buscava fugir para a URSS,
foi morto pelas baterias anti-aéreas da Mongólia, que
derrubaram o avião em que viajava. Vários dirigentes
do PC foram então expurgados.
No início deste ano, culminando uma campanha contra o vento
desviacionista de direita" e contra "os dirigentes que insistem
em seguir a via do capitalismo", Deng Xiaoping foi afastado pela
segunda vez (a primeira foi durante a Revolução Cultural)
de todos os seus cargos dentro e fora do PC Chinês. Deng deveria
na época suceder o falecido Chu Enlai como primeiro-ministro
da China. |
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