PARIS: BANDEIRA VERMELHA NO ARCO DO TRIUNFO

Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 8 de maio de 1968

Neste texto foi mantida a grafia original

Paris 7 - Depois dos violentos choques de ontem, quando 345 policiais foram feridos. 10 mil estudantes voltaram essa tarde às ruas de Paris, ocupando virtualmente o centro da cidade. Uma enorme bandeira vermelha foi colocada no Arco do Triunfo. A polícia parisiense está recebendo reforços das cidades vizinhas para enfrentar as manifestações.

Estudantes enfrentam a policia na França

Violencia nas ruas de Paris: estudantes enfrentam Policia

PARIS, 7 - Só entre policiais são 345 os feridos em conseguencia do mais serio choque ocorrido nas ruas de Paris, ontem, quando as forças da ordem tentaram deter cerca de 10 mil estudantes no Quartier Latin. Não se pode avaliar o numero de feridos entre os manifestantes, já que muitos deles negaram-se a receber cuidados médicos. Estão detidos 422 estudantes.
Os estudantes, com o apoio de cerca de mil professores e assistentes universitarios sairam às ruas, apesar da proibição policial, empunhando bandeiras vermelhas e cantando a Internacional. Depois de percorrerem as ruas centrais partiram para o Quartier Latin, onde impressionante aparato policial os aguardava.
Os choques entre estudantes e policiais duraram até a meia-noite. Às 2 da madrugada a calma voltava e o dispositivo policial era reduzido sensivelmente.

Ambiente de motim

Quando as colunas de malcha chegaram ao Quartier Latin a violencia dos choques atingiu seu ponto culminante, dando a todo o bairro uma atmosfera de motim. Na praça Maubert-Mutualité, situada proxima à Sorbonne, os estudantes ergueram uma barricada, cortando o acesso às forças de repressão que vinham em seu encalço. As lojas e os cafés proximos desceram as portas de aço, enquanto os estudantes arrancavam paralelepipedos das ruas para enfrentar a policia.
Às 15 horas o boulevar Saint-Germain apresentava um aspecto desolador, repetindo o cenario dos ultimos dias da ocupação nazista, em 1944. Dezenas de veiculos com os vidros partidos e bastante danificados fechavam a rua e as calçadas em todos os sentidos. Paralelepipedos, galhos de arvores, latas de lixo e vidros partidos, espalhavam-se pelo chão manchado de sangue.
Mas as manifestações ainda prosseguiam agora descentralizadas. Onde quer que houvesse estudantes a policia investia com seus cassetetes e bombas de gás, atingindo muitas vezes populares que se encontravam no local.
A três quilometros dali, na estação de metrô que dá acesso à Cidade Universitaria (Denfert-Rochereau), cerca de 4 mil universitarios e secundaristas ergueram baricadas com postes de iluminação e galhos de arvores. De lá partiram para juntar-se ao nucleo da manifestação. Pelo trajeto, cantavam a Internacional, erguendo os punhos.
Às 20 horas os choques prosseguiam. Carros-tanque lançavam toneladas de agua sobre os manifestantes sem conseguir arrefecer-lhes o animo. No boulevar Saint-Gennain dez caminhões da CRS, colocados em fila, bloqueavam o acesso à praça Mabillon, para onde se dirigiam os estudantes. Lutava-se por cada metro de rua, numa verdadeira batalha campal.

Uma explicação

Comentando os choques de ontem entre estudantes e a Policia o jornal "Le Monde" afirma que os estudantes franceses hestiam "entre a violencia e a apatia", reconhecendo ao mesmo tempo que a violencia estudantil causou surpresa.

Explicando a situação o jornal destaca três pontos essenciais:

1) Os incidentes de ontem originaram-se segunda-feira ultima, com choques de ruas que constituem um "prolongamento da agitação da faculdade de Nanterre, perto de Paris, iniciada há um ano". As desordens verificaram-se em virtude de criação do chamado "movimento de 22 de março" e do fechamento da faculdade.
(O movimento 22 de março reune estudantes de esquerda proximos ao castrismo, o comunismo pró-China e o anarquismo. Seus integrantes concordam em ser chamados "os furiosos").
2) "A ação dos extremistas de esquerda encontrou uma resposta favoravel" e os primeiros incidentes de segunda-feira nas ruas do Quartier Latin se registraram quando os "grupos de choque" estudantis, principais promotores da agitação, tinham sido neutralizados.
3) Os tradicionais agrupamentos estudantis, como a UNEF, "estão perdendo seu carater representativo", diz o jornal. Portanto, não há estrutura coerente entre grupos politicos organizados, mas facções esfaceladas por rivalidades, e a massa estudantil, que passa da inercia à violencia e cuja inquietação real tem poucos meios institucionais para expressar-se".


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