REVELADA NOS E.U.A. E INGLATERRA A INVENÇÃO DA ARMA DE MAIOR PODER DESTRUIDOR DE TÔDA A GUERRA


Publicado na Folha da Manhã - terça-feira, 7 de agosto de 1945

Neste texto foi mantida a grafia original

Ameaçado o Japão de destruição completa pela "bomba atômica"
Fruto de longas e pacientes pesquisas a sensacional descoberta - Lançado sôbre Hiroshima o violento explosivo


WASHINGTON, 6 - O presidente Truman informou que os Estados Unidos gastaram dois bilhiões de dólares na "maior campanha cientifica da história", obtendo, em compensação, um enorme êxito com a invenção da "bomba atômica", que foi lançada domingo último contra a base militar nipônica de Hiroshima.
A referida bomba tem um poder maior do que vinte toneladas de TNT e duas mil vêzes o poder explosivo da bomba britânica "Grand slam" considerada a maior bomba utilizada na história da guerra.
Em sua declaração, o primeiro magistrado norte-americano diz que o novo projetil inicia "uma era revolucionária no poder destruidor" e que, no periodo culminante da construção, intervieram cento e vinte e cinco mil pessoas. "A fôrça da qual o sol obtem sua potência foi isolada para ser lançada contra os que desencadearam a guerra no Extremo Oriente".
É o seguinte o texto da declaração do presidente Truman:
"Faz dezesseis horas que um avião norte-americano lançou uma bomba sôbre Hiroshima, importante base militar japonêsa. Essa bomba tinha mais potência do que vinte toneladas de TNT (tri-nitro-tolueno). Tinha duas mil vezes mais o poder destruidor de "Grand slam" britânica, que é a maior bomba utilizada até agora na história da guerra.
Os japonêses começaram a guerra pelo ar em Pearl Harbor. Já se lhe pagou com juros. E isso ainda não chegou ao fim. Com esta bomba, acrescentamos um novo e revolucionario aumento no poder destruidor para completar o poderio crescente de nossas forças armadas. Em sua forma atual, essas bombas já estão sendo fabricadas e aperfeiçoam-se para se tornarem ainda mais poderosas.
Trata-se de uma "bomba atômica". Sujeitou-se a potência básica do universo. A fôrça da qual o sol obtem sua potência foi isolada, para ser lançada contra os que desencadearam a guerra no Extremo Oriente.
Antes de 1939, os homens de ciências haviam chegado à conclusão de que era, teoricamente, possivel pôr em liberdade a energia atômica. Porém, ninguém conhecia a forma prática de fazê-lo. Em 1942, soubemos, não obstante, que os alemães trabalhavam febrilmente a fim de encontrar um meio de juntar a fôrça atômica às demais máquinas bélicas, com as quais pensavam escravizar o mundo. Porém, fracassaram. Devemos agradecer à Providência que os alemães tenham inventado a "V" e "V-2" tarde e em quantidade limitadas e agradecer, ainda mais, que não pudessem obter a "bomba atômica".
A batalha de laboratórios representou terriveis riscos para nós, tanto quanto as batalhas do ar, terra e mar. Mas, agora, ganhamos a batalha dos laboratórios, como ganhamos as demais batalhas.
No comêço de 1940, antes de Pearl Harbor, os Estados Unidos e a Grã-Bretanha realizaram um intercâmbio de conhecimentos cientificos úteis à guerra, e, dêsse acôrdo, conseguimos preciosa ajuda para nossas vitórias.
De acôrdo com essa norma geral, começaram as investigações da "bomba atômica". Os homens de ciência norte-americanos e britânicos empenharam-se contra os alemães na corrida das descobertas.
Os Estados Unidos contavam com grande quantidade de preeminentes homens de ciência, nos diversos ramos do conhecimento humano exigidos. Dispunham de enormes recursos industriais e financeiros, necessários para levar avante o projeto e podiam se dedicar a êle, sem se incomodarem com os obstáculos de outras tarefas vitais da guerra.
Nos Estados Unidos prosseguiram os trabalhos de laboratório e nas fábricas, os quais estavam apreciàvelmente adiantados e estariam fora do alcance dos bombardeios inimigos, enquanto que, então, a Grã-Bretanha estava exposta a constantes ataques aéreos e ainda ameaçada pela possibilidade de invasão. Por essas razões, o primeiro-ministro Churchill e o presidente Roosevelt estabeleceram que era aconselhavel levar a cabo o propósito dos cérebros cientificos de (...) com duas grandes fábricas e muitos estabelecimentos menores empenhados na produção do poder atômico.
Durante o momento culminante da construção, a mão de obra chegou a cento e vinte e cinco mil pessoas e agora trabalham nas fábricas mais de sessenta e cinco mil. Poucos sabem o que têm estado fabricando. Vêem grandes quantidades de materiais que entram e não vêem sair nada destas fábricas, pois que o tamanho da carga explosiva é extraordinàriamente pequeno.
Gastamos dois biliões de dólares na maior campanha cientifica da História... E a ganhamos.
Porém, a maior maravilha disso tudo não está nas proporções da emprêsa ,em seu segrêdo ou no seu custo, mas, sim, na consecução do propósito dos cérebros cientificos de juntar as peças de conhecimento infinitamente complexas possuídas por muitos homens nos diferentes campos da ciência, até conseguir um plano utilizável. E não menos maravilhosa é a capacidade da indústria para desenhar e da mão de obra para executar máquinas e métodos a fim de conseguir coisas não alcançadas até agora, para que o fruto de tantos cérebros se concretizasse de forma fisica e atuasse na forma esperada.
Tanto a ciência como a indústria trabalharam sob a direção do Exército dos Estados Unidos, que conseguiu um êxito único ao levar a cabo um problema tão diverso no progresso da ciência, num tão extraordináriamente curto período de tempo. É duvidoso que se tenha conseguido uma combinação semelhante em outra parte do mundo. O que se obteve representa o maior empreendimento da ciência organizada na história. Foi realizado sob o império das circunstâncias e com todo o êxito.
Estamos agora preparados para fazer desaparecer, com mais rapidez e mais completamente, até a última emprêsa de produção que possam ter os japonêses, em terra, em qualquer cidade. Destruiremos seus diques, suas fábricas e seus meios de comunicações. Que não fique dúvida de que destruiremos completamente a potencialidade bélica do Japão.
O ultimato de 26 de julho, emitido em Potsdam, destinava-se a livrar o povo japonês da completa destruição. Seus governantes rejeitaram prontamente o ultimato. Se não aceitarem agora nossas condições, deverão preparar-se para uma chuva de destruição pelo ar, como nunca se viu na terra. Atrás dêsses ataques aéreos, seguirão fôrças marítimas e terrestres em tal quantidade e poderio como nunca se viu, e com a habilidade combativa que os japonêses já conhecem.
O secretário da Guerra, que se manteve em contato pessoal com tôdas as fases do projeto, dará imediatamente à publicidade uma declaração, com maiores pormenores.
Sua declaração dara a conhecer fatos sôbre as localidades de Oakridge, próximo de Knoxville, Tennessee e Reichlaind, próximo de Pasco, Estado de Washington, e sôbre a instalação próxima de Santa Fé, Novo México.
Ainda que os operários, nesses lugares, tenham fabricado materiais a serem utilizados na fabricação da maior fôrça destrutiva da história, não estiveram expostos a maiores perigos do que os de muitas outras ocupações. Punha-se extremo cuidado em sua segurança.
O fato de que possamos pôr em liberdade a fôrça atômica introduz uma nova era na compreensão das fôrças da natureza, por parte do homem. A energia atômica poderá, no futuro, completar a energia procedente do carvão, petróleo e a energia hidráulica, porém, atualmente, não poderá ser produzida de forma a competir com elas comercialmente. Antes de se chegar a êsse ponto, será necessário um longo período de intensas investigações.
Não foi nunca costume dos homens de ciência dêste país, ou norma dêste país, ou norma dêste govêrno, reter os conhecimentos científicios. Normalmente, portanto, se faria público tudo com referência à energia atômica. Porem, nas atuais circunstâncias, não se tem o propósito de divulgar os processos de produção ou tôdas as aplicações militares, até efetuar novo exame sôbre os possíveis métodos de nos protegermos e ao resto do mundo do perigo de uma repentina destruição.
Recomendarei que o congresso dos Estados Unidos considere prontamente o estabelecimento de uma comissão apropriada, para dirigir a produção e o uso da energia atômica nos Estados Unidos. Continuarei considerando e recomendarei ao Congresso as formas em que a potência atômica possa se converter em poderosa e potente influência para a manutenção da paz mundial.

Uma pequena cidade foi o centro do maior segrêdo da guerra

OAKRIDGE - (E. de Tenessee), 6 - Esta cidade, de setenta e cinco mil habitantes, foi o centro do maior segrêdo da guerra: a "bomba atômica". Há três anos, era uma tranquila e típica comunidade agrícola. Apenas determinados engenheiros, cientistas e altos chefes militares conheciam completamente as instalações erguidas sôbre vinte e quatro mil hectares de terreno, as oficinas da "Clinton Enginer Workes", onde são, separadas as matérias-primas, por três processos diversos, em mais de 420 edificios.
Oakridge tem dez mil familias e uns treze mil edificios. Revelou-se que o projeto de Oakridge custou ao govêrno federal a soma de cento e seis milhões, trezentos e noventa e três mil e trezentos dólares. Está situada a uns vinte e quatro quilômetros de Knoxville. Os operários ignoravam no que estavam trabalhando e grande maioria da população julgava que ali não se etava produzindo nada. Viam entrar nas oficinas grandes quantidades de materiais, mas não viam sair coisa alguma. Isto criou uma atmosfera de irrealismo, enquanto nos gigantescos edificios se trabalhava febrilmente, dia e noite, sem produzir nada que pudesse ser visto ou tocado.
Os terrenos para a fábrica foram adquiridos em 1942 e escolhidos por sua proximidade das fontes de água e energia elétrica, bem como o seu afastamento da costa e de lugares habitados. A primeira familia chegou em um carro-reboque a três de julho de 1943 e a primeira casa foi ocupada a vinte e sete de julho do mesmo ano. Quando estava em seu apogeu o período de construções, erguiam-se mais de mil casas por dia. Mais de quatrocentos e oitenta quilômetros de estradas tiveram de ser construídos ou reconstruídos, para servir à cidade e, além disso, foram construídos oitenta quilômetros de ferrovias.

Uma noticia que abalou o mundo

OTTAWA, 6 - Referindo-se ao comunicado do presidente Truman, anunciando o emprêgo de "bombas atômicas" contra o Japão, o primeiro-ministro Mackenzie King, qualificou-o de "uma notícia que abalou o mundo".
O ministro das Munições, sr. C. D. Howe, revelou que os canadenses, trabalhando dentro do maior segrêdo, numa fábrica erguida sôbre 4.000 hectares de terreno, a uns 125 quilômetros desta cidade, cooperaram na invenção da bomba.
O sr. Howe disse: "O verdadeiro significado do invento não está no fato de que, com a nova bomba, se conseguiu um recorde quase incrível em matéria de fôrça de destruição, e sim, nas gigantescas quantidades de energia que os homens de ciência criaram, desde há algum tempo e que estavam associadas com a matéria. Agora, essa energia pode ser usada para fins práticos".

As experiências com a "bomba atômica"

LONDRES, 6 - Revelou-se hoje nesta Capital que a arma mencionada pelo presidente Truman é uma bomba de 11.000 (onze mil) quilos, sendo tão poderosa que fêz desaparecer por completo tôda uma ilha de granito do Canal da Mancha, quando foi feita uma das experiências.
A "Royal Air Force", em março último, estava lançando as "grandslams", que têm cêrca de 8 metros de extensão por 1 metro de diâmetro. Numa das experiências, a bomba abriu uma cratera de 38 metros de diâmetro por 11 de profundidade. Essa bomba é tão pesada que somente pode ser transportada por "Lancasteres" quadrimotores, com dispositivos especiais.
O bombardeio de prova foi levada a efeito contra uma ilha de pedra suficientemente grande para figurar nas cartas do Almirantado. Depois da primeira experiência, a referida ilha foi apagada do mapa, tal o efeito desta formidável bomba.
Os observadores militares consideram que é dificil conceber quais são os efeitos das "bombas atômicas", as quais são 2.000 vêzes mais poderosas do que as "grandslams".

A primeira experiência

WASHINGTON, 6 - Ao descrever a primeira experiência do lançamento da bomba-atômica, o Departamento da Guerra informou que a torre de aço de onde foi lançada a bomba se fundiu, tendo subido à estratosfera uma gigantesca nuvem escura. No momento em que a bomba explodiu, um relâmpago mais brilhante do que a luz do dia iluminou tôda a zona atingida. Do objetivo, levantou-se imediatamente uma nuvem multicor, que alcançou cêrca de 15.000 metros de altura. A bomba-atômica foi experimentada pela primeira vez às 5 h 30 de 16 de julho do ano corrente, no setor de Alamo-Gordo, a 200 quilômetros a sudeste de Albuquerque, em Novo México.

A colaboração do Canadá na descoberta

OTTAWA, 6 - O metal radioativo necessário à fabricação da bomba-atômica foi fornecido pelo Canadá, que é um dos maiores produtores de urânio do mundo.
O sr. Clarence, ministro das Munições, revelou que cientistas canadenses desempenharam importante papel na descoberta da bomba.
O govêrno canadense assumiu o contrôle da El Dorado Mining Seeltingo Co., em janeiro de 1944, a fim de ficar assegurado o fornecimento de urânio em quantidade suficiente, que era indispensável para a realização do programa referente à bomba-atômica. O govêrno tomou também as medidas para novas pesquisas e exploração do urânio e fêz acordos com as províncias canadenses, para obter todos os abastecimentos necessários.

Advertência ao Japão

WASHINGTON, 6 - O Japão está sendo advertido sôbre a bomba-atômica.
O comunicado do presidente Truman está sendo irradiado repetidamente por poderosas emissoras de onda médias, situadas nas Marianas, assim como de emissoras de ondas curtas do litoral ocidental dos Estados Unidos.
Boletins apresentando dramáticos detalhes do novo engenho serão lançados em breve sôbre as ilhas metropolitanas do Japão. Os peritos em guerra de nervos são de opinião de que os efeitos psicológicos da bomba poderão ser mais devastadores que os resultados materiais.

Arrasadas quatro cidades japonêsas

GUAM, 6 - Gigantescos incêndios visíveis a longa distância arrasam quatro cidades japonêsas, depois do ataque desfechado hoje por 580 "Superfortalezas".
A emissora de Tokio informou que outra formação de "Superfortalezas" atacou a importante base de Hiroshima, situada a 30 quilômetros a noroeste de Kure.
Os aviadores que participaram dos referidos ataques afirmaram aos seus comandantes que foram ateados numerosos incêndios nos centros industriais de Maebashi, Nishinomiya, Mikabe, na ilha de Honsuh, e Saga, em Kyushu, além de Imbari, na ilha de Shikoku.
A rádio de Tokio informou ainda que outros aparelhos ianques atacaram a capital japonêsa e cinco distritos dessa zona foram particularmente atingidos pelas bombas.
Acrescentou a mesma emissora que os aparelhos atacantes chegaram sôbre a cidade em duas vagas, cêrca de 130 cada uma, e bombardearam os objetivos japonêses pouco antes das 8 horas da manhã (hora de Tokio).

Chegam ao pacífico as primeiras tropas canadenses

GUAM, 6 - Chegaram ao teatro de operações do Pacífico os primeiros contingentes de tropas canadenses, as quais começam, assim, a participar da guerra contra o Japão. Chegaram também unidades de aviação canadense.

Descrição da primeira explosão da "bomba atômica"

NOVA YORK, 7 - Eis a descrição completa da cena histórica da primeira explosão experimental da "bomba atômica" no deserto de Novo México, a 16 de julho último, fornecida pelo Departamento de Guerra dos Estados Unidos:
"Um flamejar cegante e vivo cobriu totalmente a área com uma luz ainda mais clara do que a mais clara luz do dia. Depois houve uma trovoada contínua e tremenda e uma onda de fortíssima pressão que derrubou por terra três homens, fora do centro experimental.
Imediatamente uma nuvem gigantesca multicolorida, que crescia cada vez mais, inflamou-se a uma altitude de mais de 40.000 pés. As nuvens naturais que se lhe atravessaram no caminho, desapareceram. Logo depois, ventos errantes em várias direções, na subestratosfera, dispersaram a massa, agora acinzentada, da grande nuvem. Acabara-se a experiência. A experiência foi um sucesso."
Uma garôta cega perto de Albuquerque, a 120 mihas do local da experiência, gritou:
"Que é isto?", quando o lampejo incendiou o céu.
O general Leslie R. Groves, um dos mais importantes técnicos relacionados com a experiência, que se encontrava num pôsto de observação a 17.000 jardas da tôrre de arco, de onde se fêz a explosão, declarou:
"Dois minutos antes do tempo marcado para a explosão todo mundo deitou-se com o rosto colado ao solo. O tempo restante foi anunciado por um altofalante, reinando completo silêncio."
O dr. Connant, presidente da Univerisdade de Harward, declarou que nunca imaginara que os segundos pudessem ser tão prolongados. Primeiramente registrou-se a explosão luminosa, de um fulgor sem par. Deitados, olhamos através de óculos escuros, acompanhando com a vista aquela bola de fogo. Cêrca de 40 segundos mais tarde veio a onda de choque, acompanhada de estrondos e trovões, que nos pareceram aterradores depois do nosso espanto, em face da extraordinária intensidade da luz produzida.
O general Tomaz Farrell, representante do general Groves, declarou:
"A cena que se desenrolou no interior do abrigo onde me achava foi dramática e ultrapassou ao poder de descrição. Todo mundo sabia qual era a potencialidade terrível daquilo que pensava que estava para suceder. Houve então a tremenda explosão de luz, seguida por um tronitoar ensurdecedor. Muitos observadores foram atirados ao chão, pelo abalo. Tôdas as emoções recaldadas soltaram-se nesses poucos minutos. Todos pareciam sentir que tinham assistido ao nascimento de uma idade nova - a era da energia atômica."


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