MORREU STALIN

O fim de uma existencia extremamente agitada

Preso e deportado numerosas vezes, Stalin desenvolveu grande atividade nas lutas revolucionarias em que se empenharam os marxistas

Publicado na Folha da Manhã, sexta-feira, 6 de março de 1953

Neste texto foi mantida a grafia original

Stalin nasceu em 1879, em Gori, a esse tempo pequena aldeia perdida no territorio da Georgia. Sua mãe chamava-se Catarina, e seu pai, Vissarion Djougachvili, natural de Didi-Lilo, exercia o oficio de sapateiro, numa fabrica de calçados de Tiflis.
Fez o curso primario em sua terra natal. Ingressou, a seguir, no Seminario de Tiflis, que era então um "viveiro de idéias". Estudava, às escondidas, livros de Ciencias Naturais e de Sociologia. Ousou mesmo fundar um circulo, onde se debatiam as idéias marxistas, que empolgavam a "intelligentzia" russa. Expulso do seminario, ingressou, em 1898, na organização de Tiflis do Partido Operario Social-Democrata, seção russa da Segunda Internacional. Começou, então, a sua vida de "revolucionario profissional".
Não esteve alheio às greves que eclodiram em Tiflis, durante os anos de 1900 a 1901. Em seu trabalho de agitador, muitas vezes se refugiou em Tiflis, onde ainda hoje existe uma casa considerada "esconderijo ilegal de Stalin".
Em abril de 1902, foi preso pela policia czarista e enviado para Batum. Em Koutais, para onde fora transferido, organiza uma greve de presos. É deportado, então, para a Siberia. Conhece, assim, os rigores do inverno nas estepes da longinqua provincia de Irkoutsk. Na prisão soube de um importante acontecimento, que iria ser decisivo para o movimento revolucionario, que se incubava no subsolo politico-social da velha Russia. No II Congresso do Partido Social-Democrata, em 1903, Lenine força os delegados a uma tomada de posição definitiva. Deu-se, então, a histórica cisão entre bolchevistas e mencheviques, que obrigava os sociais-democratas a definir-se ou pela Revolução ou pela Reforma.
Iludindo os carcereiros, Joseph consegue fugir da Siberia. Disfarçado de soldado, aparece um dia em Batum. Passa a ser o dirigente dos bolchevistas caucasianos, entre os anos de 1904 e 1905.
Em 1905, dirige o jornal "A Luta do Proletariado". Nesse mesmo ano - em dezembro -, na Conferencia Bolchevista de Tammefors, tem o seu primeiro encontro com Lenine.
Nesse mesmo ano, as forças revolucionarias tentam empolgar o poder. Mas a sublevação armada redunda no mais completo malogro. No Congresso de Estocolmo, em que os bolcheviques foram derrotadas, Stalin representou a organização leninistas de Tiflis.
Em fins de 1907, instala-se em Baku, onde dirige o jornal revolucionario "O Proletario de Baku". O seu proposito de encontrar-se com Lenine, a fim de acertar tarefas de ação revolucionaria, leva-o a viajar para o exterior. Começa, então, um rosario de prisões. Em Okhrana, consegue fugir. Em 1910 é novamente detido. Um ano depois estabelece-se em São Petersburgo, onde é mais uma vez preso. Na Conferencia de Praga, em 1912, reunem-se de novo os delegados sociais-democratas, com as duas tendencias já agora bem definidas: menchevistas e bolchevistas. Do historico certame, surge o Partido Revolucionario, do qual, Stalin, malgrado ausente, é nomeado membro do Comitê Central.
Em fins de 1912, participa da Conferencia Bolchevista de Cracovia. A esse tempo, deu-se em Lena, na Siberia, um massacre de mais de quinhentos grevistas, fuzilados pelos policiais czaristas. Esse fato, vivamente explorado pelos revolucionarios, veio aumentar, ainda mais, a tensão social. Nesse mesmo ano, escreve uma serie de artigos sobre politica socialista das nacionalidades, os quais foram mais tarde reunidos no volume "O Marxismo e a Questão Nacional". Tornar-se-ia, nesse campo, a maior autoridade do mundo bolchevista. Em julho de 1913, mais uma vez o prendeu os policiais do czar. Conhece, desta vez, a aldeia de Kouleika, onde havia duas ou três casas, situada na região siberiana de Toulaukhansk, a vinte quilometros do Circulo Polar. Em 1917, burla a vigilancia policial. Durante horas, caminha, em plena tormenta, três quilometros sobre o gelo. Afinal, atinge uma cabana.
Seus companheiros de luta revolucionaria - Lenine e Zinoviev - estavam na Galícia, quando estoura a guerra de 1914. Retiram-se, então, para a Suiça, onde fundam o "Social-Democrata", orgão do Partido Bolchevista Russo.
Em fevereiro de 1917, em pleno desenvolvimento da guerra, estoura a revolução liberal-democrata, sob a direção de Kerenski. Lenine regressa da Suiça, através da Alemanha, a fim de assumir a liderança do movimento revolucionario. Stalin, que apenas voltava da Siberia, é eleito secretario politico do Comitê Central do Partido. Em agosto de 1917, Stalin apresenta um relatorio ao VI Congresso do Partido.
Em principios de outubro, nas vesperas da Revolução, o Comitê Central nomeia Stalin membro do Colegio dos Cinco, orgão encarregado da direção politica do levante, e do Colegio dos Sete, que centralizava todas as atividades revolucionarias.
Afinal, a 25 de outubro - 7 de novembro pelo calendario gregoriano - eclode a Revolução Bolchevique. Seguem-se, depois, os "dez dias que abalaram o mundo". A Russia, acolhendo o apelo de Lenine: "Paz a qualquer preço", contra as teses de Bukharin, que insistia na necessidade de transformar a guerra de imperialista em revolucionaria, retira-se da luta e assina com a Alemanha e a Austria a Paz de Brest-Litovsk. Todas as negociações foram conduzidas por Trotsky, que se manteve em constante comunicação com Lenine. Vem, a seguir, a guerra civil, com o seu cortejo de mortes, de miseria e de sofrimento. Falando sobre a determinação revolucionaria de seus lideres, afirma M. Mallet: "Nem os exercitos brancos, nem a entrada em guerra da Polonia, nem os levantes camponeses, nem a fome conseguiram destruir a Revolução, e galvanizados por Lenine os batalhões em farrapos venceram quatorze nações".
Durante os anos de guerra civil, Stalin combateu na frente de Tsaritsyn, em Perm, em Petrogrado, na frente ocidental de Smolensk - quando da contra-ofensiva polonesa -, no sul, contra Denekin, na região de Jitomir e de novo na frente meridional contra Wrangel.
Stalin sempre se caracterizou pela sua inclemencia em relação aos adversarios da Revolução. Preconizava, nos primeiros anos de regime comunista, uma atitude severa e implacavel do governo sovietico na luta contra os seus inimigos. Justificaria a pena de morte na União Sovietica, por existirem as "potencias imperialistas que nos obrigam a mantê-la para preservar a nossa existencia".
Desde que os bolchevistas assumiram o poder na Russia até 1923, Stalin exerceu as funções de comissario do Povo para as Nacionalidades. Considerava as duas pedras angulares da União Sovietica a aliança dos camponeses e dos operarios - simbolizada na Foice e Martelo - e a união das diferentes nacionalidades que constituiam a Grande Russia.
Em 1921, Lenine vê-se compelido a adotar a Nova Politica Economica - a celebre NEP -, que os ocidentais interpretaram como um violento desvio de Direita. Stalin apóia-a, inteiramente. Correu mundo a justificativa de Trotsky sobre a criação da NEP: "A diferença entre revolucionarios e reformistas está em que os revolucionarios não admitem o reformismo, senão depois da tomada do poder pelo proletariado". No ano seguinte à introdução da NEP, no XI Congresso do Partido, Stalin é nomeado secretario-geral do Comitê Central. Atribui-se-lhe a missão de reorganizar o Partido, em função da economia socialista nacional.
No exercicio do comissariado do Povo para a Inspeção Operaria e Camponesa, aceito a procurou difundir os "slogans" de Lenine: "O socialismo são os sovietes mais a eletrificação". "Se não encontrarmos os meios de implantar e desenvolver a industria, estamos liquidados como país civilizado e, com maiores motivos ainda, como país socialista." E a celebre afirmação de Lenine, a qual fez rir a Wells, o eminente escritor britanico: "Eletrificaremos a Russia Européia e a Russia Asiatica". Stalin se incumbe de expor às massas o Plano de Eletrificação. Dizia, então: "O centro de gravidade da economia tem que se deslocar no sentido da industria". Gigantesca tarefa pesava sobre os ombros dos lideres bolchevistas: transformar a Russia de país essencialmente agrario em potencia industrial. Nação sem nenhuma herança tecnologica, deveria enveredar-se pelo caminho da industrialização intensiva. Urgia estimular o operario. Stalin afirmava: "O principio da emulação socialista traz: auxilio fraternal dos camaradas avançados aos retardatarios, em beneficio do progresso geral".
A 21 de janeiro de 1924, aos cinquenta e quatro anos, morria Lenine. Surgia, então, o problema da liderança do Partido. Stalin, no seu adeus, garantia: "Manteremos elevado e puro o nobre titulo de membro do Partido Comunista. Nós te juramos, camarada Lenine, cumprir com honra a tua vontade!"
Pouco a pouco vai-se corporificando a oposição, que teria como centro a figura de Trotsky. Profundas divergencias ideologicas ameaçavam cindir o Partido. Stalin pugna pelo socialismo num só país. Luta ainda para conservar a unidade do Partido. No XIV Congresso da agremiação bolchevique, declarou: "O trabalho em comum, a direção coletiva, a unidade do Partido, a unidade dos orgãos do Comitê Central, tendo como condição a subordinação da minoria à maioria, eis o de que precisamos". Radek que, a principio, aceitara a tese stalinista, afirmara: "A possibilidade de edificação do socialismo num só país é o ponto de apoio da alavanca de Arquimedes no plano estrategico de Lenine". Stalin estava disposto a executar a formula leninista: fazer o agricultor russo "saltar do pobre cavalo de 'moujik' para o cavalo de aço". Para isso, urgia "alcançar e ultrapassar os países capitalistas mais adiantados, dentro do mais breve prazo historico". Colocava, assim, em primeiro plano o desenvolvimento da industria pesada. Trotsky, ao contrario, insistia na necessidade da revolução permanente, sem a qual seria inevitavel a "degenerescencia capitalista" da economia sovietica. Para Trotski, o desenvolvimento da Revolução na União Sovietica estava condicionado ao exito das revoluções nacionais em outros paises de economia mais avançada. Apontava a forte posição do "kulak", reforçada pela NEP, como uma pedra no caminho do socialismo. Via, enfim, em toda a politica isolacionista de Stalin um Termidor da Revolução Bolchevique.
A 3 de setembro de 1927, a oposição lança a sua famosa "Plataforma", que o Partido considerou um "luxo". Afinal, a trilogia Trotsky-Kamenev-Zinoviev, que liderava a oposição, é excluida do Partido, por decisão do XV Congresso, reunido em novembro de 1927.
Veio depois o plano quinquenal - 1928-1933 -, que trouxe o fortalecimento da industria e um passo avante na socialização do campo, com a criação das fazendas coletivas.
Stalin, em plena guerra, participou da Conferencia de Teerã, em 1943, a que estiveram tambem presentes Churchill e Roosevelt. Os Três Grandes reuniram-se, mais uma vez, em Yalta, em 1945. Em julho do mesmo ano, conferenciaram, em Potsdam, Stalin, Truman, Churchill e Attlee.
Em virtude dos serviços excepcionais prestados à União Sovietica, Stalin foi condecorado com a Ordem da Vitoria, recebendo tambem o titulo de "generalissimo do Exercito Vermelho".
No dia 27 de junho de 1945, o generalissimo Stalin foi nomeado Herói da União Sovietica. Em dezembro de 1950, foi reeleito para o Soviete de Moscou. Três meses mais tarde, foi eleito, por unanimidade dos votantes, deputado ao Soviete Supremo da Republica Federativa Socialista Sovietica Russa, na circunscrição eleitoral de Korov, de Leningrado.
Em 17 de outubro de 1952, em virtude de reforma de estrutura do partido, foi eleito para o secretariado do Presidium do Comitê Central do Partido Comunista da União Sovietica.
Condecorado varias vezes com a ordem da Bandeira Vermelha e com a Ordem da Vitoria, Stalin escreveu varias obras de doutrina marxista-leninista.
O generalissimo Stalin era cidadão honorario de varias cidades e membro honorario da Academia de Ciencias da União Sovietica.

A familia de Stalin

PARIS, 3 - As fontes sovieticas guardam discrição quase absoluta a respeito da vida privada dos dirigentes. Assim, poucos pormenores são conhecidos sobre a familia de Stalin. Sabe-se, entretanto, que sua primeira mulher, Catarina, faleceu no ano de 1917, depois de lhe dar um filho: Tchapaev. Stalin casou-se, em seguida, com Nadiezda Alleluiev, da qual teve dois filhos: Vassili e Svetlana. Nadiezda faleceu em 1932.
Segundo certos rumores, a segunda esposa de Stalin, que teria desaprovado profundamente a ação politica de seu esposo, notadamente em materia de coletivização dos campos, ter-se-ia suicidado.
Os dois filhos de Stalin distinguiram-se durante a guerra: Vassili, general na aviação sovietica, foi condecorado em 1942 pelas experiencias de guerra; Tchapaev recebeu a Ordem de Lenine. Quanto a Svetlana, após o primeiro casamento infeliz com o filho do marechal Timochenko, teria esposado, em 1951, o filho de Kaganovitch, Miguel. Corriam rumores, sobretudo em 1942, sobre um quarto filho de Stalin, Jacob, que se atribuiria à sua primeira esposa. Jacob teria sido feito prisioneiro pelos alemães e morto no cativeiro. De fonte autorizada, porem, nada veio confirmar essa lenda, imaginada talvez pelos nazistas para as necessidades da causa.
Após a morte de sua segunda esposa, Stalin teria desposado Rosa Kagnovitch, que teria exercido muita influencia sobre ele.

Particularidades da vida intima de Stalin
NOVA YORK, 5 - Há uma historia a respeito de Stalin: certa vez, num campo de prisioneiros da Siberia, teve ordem de correr entre alas de guardas, que o "malharam" com a coronha de seus fuzis.
Mas, de acordo com a historia, Stalin não correu. Caminhou.
Stalin, com sua vida a esvair-se sob uma tenda de oxigenio, hoje, em Moscou, era um grito longinquo do revolucionario "homem de aço" dos campos da Siberia. Esta tarde, era o lider inconteste, que sofria de molestia "profissional" dos lideres.
Foi a tensão de trabalho que matou Roosevelt através de uma hemorragia cerebral. E muitos grandes homens de negocios morreram do mesmo mal.
Stalin certa vez descrito por Lenine como "muito aspero, muito rude", transformou-se, na segurança de seu poder imenso, num administrador de prosa amena e extremamente competente.
Até ser golpeado, esta semana, parecia nada sofrer de grave, alem de ocasionais ataques de asma e de paralisia parcial de seu lado esquerdo, que limitava seu caminhar.
Mas, com 73 anos de idade, Stalin ainda trabalhava muito.
Normalmente, levantava-se às 11 horas e passava hora e meia fazendo a barba, tomando banho e fazendo massagens. Por volta das 12h30 estava à mesa, para a primeira refeição.
Às 13 horas, entrava em seu gabinete, que tem comunicação com seu quarto de vestir. Até às 16 horas recebia informações do mundo, do governo e do Partido, por intermedio de Georgi Malenkov, o homem que é apontado como seu sucessor, e de Viacheslav Molotov, primeiro vice-"premier".
Das 16 às 17 horas ficava só, escrevendo, lendo jornais, transmitindo instruções a varios Ministerios e, possivelmente, assistindo a filmes em salão particular.
A seguir fazia a sesta, e jantava às 21 horas.
Das 23 horas até por volta das 5 da madrugada mantinha reuniões com funcionarios do governo ou do partido.
Stalin casou-se com sua terceira mulher, Rosa Kagnovich, em 1939. Não obstante, tinha apartamento separado e vivia a vida de um solteirão. Tal como todos os outros membros do "Presidium", estava sempre sob a vigia de dois homens e contava com dois cozinheiros. Vinho algum ia à mesa sem rigoroso controle de funcionarios da mais absoluta confiança.
Seus serviçais trabalhavam exclusivamente para ele e eram excepcionalmente bem tratados. Aliás, seu barbeiro teve a Ordem de Lenine, em 1948, por "serviços distintos prestados ao Estado".
Stalin era apontado como um homem de familia. Mas, de seus três filhos, sua filha, Svetlana, era a favorita. Quando a "menina dos cabelos ruivos" se casou, há dois anos, seu pai ofereceu uma festa que durou duas semanas e custou nada menos de 250.000 dolares.

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