PRESSÃO DO EXERCITO SOBRE PERÓN
Onda de greves em buenos aires - racionada a gasolina -
"crack" na bolsa - ambiente de inquietação
Renasce o Grupo de Oficiais Unidos
Movimento contra a atuação da esposa do Presidente
|
Publicado
na Folha da Manhã, domingo, 06 de março de
1949
|
|
Neste texto foi mantida a grafia original
|
BUENOS AIRES, 5 - Esta cidade, que se encontra sem jornais
há 18 dias, vive de rumores. Em cada esquina se ouve um comentario
ou algum novo boato sobre a dificil situação do governo.
O antigo G.O.U. (Grupo de Oficiais Unidos), formado em 1943 pelo então
coronel Perón para derrubar o presidente Castilho, parece ter
renascido, desta vez sem Perón. Assegura-se que foi o novo
G.O.U., que exigiu o afastamento do ditador das finanças, sr.
Miranda. A mesma organização teria apresentado outras
exigencias peremptorias ao general Perón, entre as quais a
supressão das inusitadas funções publicas exercidas
pela sra. Eva Duarte Perón, que dá expediente em luxuoso
escritorio instalada em pleno centro da cidade. Diariamente, numerosas
delegações vão à sua presença,
ouvem as suas arengas, e o radio oficial, cinco ou seis vezes por
dia, relata as atividades da senhora do presidente da Republica.
|
A
ação do G.O.U. |
O novo G.O.U. se empenha em atividades de investigação,
e não é misterio para ninguem que a atuação
do sr. Miranda, bem como a do ex-presidente do Banco Central, sr.
Maroglio, são objeto de averiguações.
Chegou-se a afirmar que o presidente Perón se achava "sequestrado"
em sua quinta de San Vicente, a uma hora da capital. O presidente
o desmentiu, em discurso difundido pelo radio. Continua-se, entretanto,
a afirmar que o G.O.U. o deixa presidir, mas "não o deixa
governar".
Oficiais de todas as patentes estariam incluídos no G.O.U.
de 1949, cujo programa de ação seria puramente patriotico,
tendo em vista somente combater as torvas manobras que nos ultimos
cinco anos têm caracterizado a atividade das pessoas mais chegadas
ao governo.
|
Fortunas
escandalosas de membros da administração |
Dizem-se coisas fabulosas das fortunas feitas por Miranda, Maroglio
e Juan Duarte, cunhado do presidente Perón. Fala-se de centenas
de milhões. Juan Duarte, há três anos, vendia
sabão por conta de uma firma de Buenos Aires. Recentemente,
ele pôde comprar uma estancia de 3.500 hectares, em Junin, a
três horas de Buenos Aires, na zona de terras mais ricas e valiosas
do país, tendo pago por essa propriedade 4.000.000 de pesos.
O novo G.O.U. foi constituido por militares desejosos de pôr
fim a tais escandalos. Em principio, essa organização
não se dirige contra Perón, mas as coisas poderão
tomar outro rumo, ao que se afirma, se Perón não modificar
os seus metodos de governo. Todo o exercito se sente ofendido pelas
frequentes ameaças do presidente, que declara poder, quando
o quiser, "lançar à rua os descamisados, para que
façam justiça". A sorte do ministro do Interior,
sr. Borlenghi, ex-socialista que se passou para as hostes de Perón,
já estaria decidida: o ministro será afastado.
|
Agrava
a situação a crise economica |
A situação geral é agravada pela crise economica.
À greve dos graficos, - fomentada ou, pelo menos, consentida
pelo governo, - acrescentou-se a dos entregadores de leite, e já
se anuncia tambem a greve dos bancarios. Por outro lado, o governo
se acha desprovido de recursos financeiros. A escassez de divisas
"chegou ao fundo". Um decreto, inesperado, de hoje, dispõe
sobre o racionamento da gasolina, como no tempo da guerra.
Outro motivo de inquietação é a situação
da Bolsa. O jogo desenfreado dos dois ultimos anos resultou num "crack",
que só a muito custo se consegue dissimular. Um grupo de especuladores,
dirigido pelo sr. Ryan, amigo do governo, negociou com ações
das companhias "El Globo", "Compañia Argentina
de Pesca", "La Negra Rey" e do banco "El Hogar".
Com o afastamento do sr. Miranda, produziu-se o panico, e as ações
caíram rapidamente, arrastando todos os demais valores. A Bolsa
está em desordem. Há gente na miseria em consequencia
dos desastres bolsistas, e afirma-se que alguns corretores fugiram
para o estrangeiro.
|
Novas
ameaças de Perón |
Como não há jornais, a população não
teve conhecimento do discurso de Perón pronunciado ontem numa
reunião de operarios. Novamente, fez ele ameaças à
oposição, tendo prometido o mais barbaro rigor no castigo
dos elementos que se opõem ao seu governo.
Nas esferas oficiais, especialmente no ministerio da Fazenda, observa-se
de novo forte animosidade contra os Estados Unidos, o que parece indicar
que o emprestimo de que se falava nos ultimos dias não será
obtido.
|
Normas
diferentes de governo |
Ninguem duvida de que a ação do novo G.O.U. deva trazer
algum resultado. Dois chefes militares que figuraram em posição
de destaque nos primeiros dias de revolução de 1943
voltaram a fazer parte do governo, depois de terem permanecido afastados
de Perón por longo tempo. Afirma-se, porém, que a nomeação
de ambos foi imposta a Perón pelo exercito, precisamente para
que os dois militares exerçam o "controle" do governo.
Trata-se dos generais Emilio Ramirez e Gonzales. O G.O.U. pretenderia
impor a Perón normas de governo e não permitiria que
Perón renunciasse, pois teria adotado a formula: "Os que
trouxeram o país à situação atual devem
ser os que o tirem dela."
|
©
Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos
reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em
qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização
escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.
|
|