SÃO MARTINHO DE LIMA, O 1º SANTO DAS AMERICAS


Publicado na Folha de S. Paulo, domingo, 6 de maio de 1962

Neste texto foi mantida a grafia original

No dia de hoje vai ser proclamado santo pelo Vaticano o irmão dominicano Martinho de Lima, o primeiro santo das Americas, que viveu em Lima, Peru, contemporaneo de Santa Rosa de Lima.
Martinho de Lima, mulato filho de uma escrava alforriada e um nobre espanhol, beatificado por Gregorio XVI em 1837, e com seu processo de canonização atualmente concluido, é no dizer do Papa João XXIII "a resposta da Igreja aos problemas raciais do seculo XX"
Nascido em Lima, Peru, aos 9 de dezembro de 1579, da união de Ana Velasquez e Juan de Porrés, Martinho e sua familia levaram uma vida de privações e sacrifícios, pois o nobre espanhol, após o nascimento de uma menina, abandonou-os. Coube a Ana Velasquez a manutenção da familia, com seu serviço de lavadeira.

Vocação religiosa

Quando Martinho completou 8 anos seu pai retornou a Lima e, reconhecendo os dois filhos, levou-os a Guaiaquil para que estudassem. Dois anos depois Martinho retornava a Lima, quando seu pai partiu para o Panamá como governador, e ali passou a ser ajudante do barbeiro local, naquela epoca tambem médico, cirurgião, dentista e farmaceutico. Martinho aprendeu bem o ofício, mas sua vocação religiosa levou-o a procurar o prior do Convento de Nossa Senhora do Rosario, pedindo que o aceitasse como frade.
As leis canonicas e as da Ordem dos Dominicanos proibiam receber como Irmão Converso indios nativos, mestiços deles descendentes até a quarta geração e negros e mulatos nas mesmas condições. Como, entretanto, Martinho gozava de bastante estima entre os frades daquele convento, o prior solicitou ao Provincial autorização para que o "mulato curandeiro" fosse admitido como "Irmão Donato", ou seja oblato, irmão terceiro, sem votos.
Martinho dedicou-se em sua nova vida aos cuidados domesticos do convento, (o que lhe valeu o simbolo da vassoura, que persiste até hoje) e ao amparo dos pobres e enfermos, no que contou com a colaboração de sua contemporanea, Santa Rosa de Lima (a primeira santa das Americas). Sua humildade e bondade valeram-lhe o respeito e a estima de toda a cidade e seus superiores, entusiasmados, pleitearam o privilegio da profissão solene com os votos religiosos.

Humildade

Apesar da vontade contraria de Martinho, que se julgava indigno dessa honra, a 2 de junho de 1603 foi lavrado o ato de profissão religiosa. Frade dos 24 aos 60 anos, Martinho sempre usava habitos já velhos e sapatos gastos, sendo seu unico luxo o direito de trazer dois rosarios: um ao pescoço e outro preso ao cinturão de couro.
A unica vez que Martinho vestiu um habito novo, sob alarde geral, foi quando se declarou proximo à morte, o que efetivamente ocorreu a 3 de novembro de 1639.
Varios milagres de Martinho foram constatados, desde mesmo a ocasião de sua morte, quando seu corpo perdeu a rigidez cadaverica e varias pessoas tiveram a cura de seus males.
A "Causa da Beatificação de Martinho" foi introduzida em 1664, mas somente em 1837 ele foi declarado beato. O processo de canonização foi reaberto em 1926 e tomou grande impulso em 1939, quando do 3º centenario de sua morte.
De acordo com os canones da Igreja, para a beatificação é necessario, alem da declaração da heroicidade das virtudes, a constatação por medicos e especialistas de um milagre autentico e tambem que em seus ditos e escritos nada haja de contrario à fé e a doutrina moral da Igreja. Ao contrario da canonização, que é definitiva e irrevogavel, a beatificação pode ser cassada ou suspensa se aparecerem fatos que justifiquem tal medida.

Processo aprovado

Para a canonização faz-se necessaria a constatação de mais dois milagres autenticos. O processo é submetido a três reuniões da Sagrada Congregação dos Ritos, da ultima das quais participa o Papa, e todas elas contando com a presença do "advogado do diabo", censor encarregado de destruir a pretensão da canonização com todos os argumentos possiveis. Aprovado nas três reuniões (ponto em que se encontra o processo de Martinho) vai o processo a consulta "de tuto", que é realizada em mais três consistorios cardinalicios. Aprovado no terceiro e ultimo consistorio, o beato é declarado santo, sendo aprovados o oficio liturgia e as orações proprias de sua missa.
A divulgação da vida e obra de Martinho de Lima, preconizada pela Igreja, em São Paulo é feita pelo secretario do Beato Martinho, localizado na igreja dos padres dominicanos das Perdizes (rua Apiacás com João Ramalho), que é dedicada a Santa Rosa do Lima.


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