GUERRA RELIGIOSA NA ÍNDIA JÁ MATOU 300


Publicado na Folha de S.Paulo, sábado, 03 de novembro de 1990

A guerra religiosa na Índia causou, ontem, a morte de cerca de 60 pessoas. Desde setembro, houve mais de 300 mortes. Os choques aumentaram terça-feira, quando hindus depredaram um templo muçulmano no norte do país. Ontem, 10 mil hindus atacaram com pedras policiais que cercavam a mesquita. A polícia atirou e 19 pessoas morreram, segundo informações não-oficiais. O conflito já se estende aos países vizinhos.

Violência na Índia mata mais 60 pessoas

A guerra religiosa da Índia, iniciada quando fanáticos hindus tentaram demolir uma mesquita muçulmana na última terça-feira, e que já envolveu os países vizinhos, cresceu ontem com a morte de cerca de 60 pessoas, segundo informações não-oficiais. Desde o início dos distúrbios, 170 pessoas já morreram. Desde setembro, o conflito hindu-muçulmano já matou mais de 300 pessoas. A violência gerou uma crise política que pode vir a derrubar o primeiro-ministro Patrap Singh, e reconduzir ao poder o ex-premiê Rajiv Ghandi.

A cidade de Ayodhya, no norte do país e a 700 km de Nova Déli, foi palco novamente dos distúrbios mais graves. Cerca de 10 mil fanáticos hindus enfrentaram com pedradas o cordão de segurança armado pela política em torno da mesquita muçulmana, que revidou disparando suas armas. Dezenove pessoas morreram - oficialmente são 9.

Na última terça-feira, dezenas de milhares de hindus vindos de todo o país, já haviam tentado invadir a mesquita enfrentando os policias, em um conflito que resultou em nove mortos. Os acontecimentos em Ayodhya se espalharam com rapidez pelo país.

A polícia tentou dispersar os manifestantes em Ayodhya usando gás lacrimogênio e golpes de cassete. Jornalistas que estavam no local afirmam que os manifestantes subiram nos telhados das casas vizinhas e atiraram pedras nos policiais que, imediatamente, abriram fogo. As testemunhas contaram dez cadáveres nas ruas e nos hospitais, mas acreditam que o número foi maior porque os hindus esconderam alguns corpos da polícia.

Autoridades do estado de Gujarat, no extremo oeste do pais, solicitam ao governo central o envio de suas unidades especiais da polícia para controlar os distúrbios, que já chegaram à zona rural e fizeram treze mortos. Por todo o estado de Utar Pradesh, onde fica a cidade de Ayodhya, foram contabilizadas mais 23 mortes. As forças de segurança têm ordens de abrir fogo contra qualquer manifestação.

Os conflitos na Índia incendiaram os ânimos religiosos nos países vizinhos. Em Bangladesh, nação islâmica que possui uma minoria hindu, foram registradas três mortes e mais de 350 feridos, em três dias de motins em Dhaka, a capital, e em outras doze cidades. Em Islamabad, no Paquistão, os muçulmanos convocaram ontem manifestações por todo o país, para protestar contra os acontecimentos na Índia.

O primeiro-ministro indiano, Pratap Singh, marcou uma reunião para amanhã com seus partidários, para tentar encontrar uma solução política para a crise no país. Representantes de seu partido, o Janata Dal, e do partido do Congresso, do ex-premiê Rajiv Ghandi, acreditam que Singh terá que renunciar antes mesmo da convocação do voto de confiança do Parlamento, marcado para o próximo dia 7. A crise poderá dar condições para que Ghandi volte ao poder, que ele já deteve por cinco anos, depois que sua mãe, Indira, foi assassinada em 1984.


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