A GUERRA É TOTAL NAS MALVINAS

Após o bombardeio inglês, a Argentina responde com o envio de caças "Dagger" e com denúncias às Nações Unidas e à OEA

Publicado na Folha de S. Paulo, domingo, 2 de maio de 1982

A Guerra das Malvinas já atingiu o dramático estágio de confrontos diretos entre britânicos e argentinos. Os ingleses atacaram primeiro, lançando a partir das 4h20 da madrugada (hora de Brasília) três operações de bombardeio a ex-Port Stanley, a capital do arquipélago. Os argentinos responderam com a decolagem, de suas bases em Rio Gallegos, de caças "Dagger" com a missão de destruir as embarcações da Real Armada navegando no Atlântico Sul.
São contraditórias as informações sobre as perdas sofridas dos dois lados. Buenos Aires afirma ter derrubado dois caças "Harrier" e danificado um terceiro. Um piloto inglês foi morto e outro feito prisioneiro, segundo as mesmas versões. Mas em Londres o Ministério da Defesa afirma que todos os aviões retornaram as suas bases.
Os argentinos denunciaram nas Nações Unidas e na Organização dos Estados Americanos seus adversários agora configurados como "claramente os agressores". O regime do general Galtieri afirmava que o aeroporto das Malvinas permanecia em operação, havendo assim um malogro da ofensiva inglesa. Nada disseram da destruição, no solo, de cargueiros Hércules C-130 e de "Mirage" estacionados nas pistas, que teriam sido atingidos por bombas de 450 quilos, lançadas por aviões britânicos. Uma parte dos explosivos é de efeito retardatário para dissuadir o inimigo a tapar as crateras abertas. Ironicamente, a pista é protegida por mísseis terra-ar do tipo "Tigercat", comprados pelos argentinos à Inglaterra.

Brasília reprova

Em Brasília, o presidente Figueiredo almoçou com o chanceler Saraiva Guerreiro e, ao final da tarde, o Itamarati manifestava oficialmente a posição do governo brasileiro, contrária ao ataque inglês às ilhas Malvinas. A declaração, divulgada pelo porta-voz do Itamarati, ministro Bernardo Pericás, é a seguinte:

"O Brasil não pode deixar de estar em desacordo com o ataque armado realizado na manhã de hoje (ontem), que caracteriza uma violação do primeiro parágrafo da resolução 502 do Conselho de Segurança da ONU que determina a cessação das hostilidades. A competência para a adoção de recomendações e medidas para o cumprimento em todos os seus aspectos da resolução 502 é exclusiva do próprio Conselho de Segurança.
"O Brasil reitera a necessidade de que as Nações Unidas ajam sem demora no sentido de restabelecer condições para uma solução negociada da questão.


Aviões britânicos bombardeiam as Malvinas

Londres - Aviões britânicos atacaram ontem o aeroporto de Porto Argentino (ex-Porto Stanley), capital das ilhas Malvinas, para impedir sua utilização pela Força Aérea argentina. O Ministério da Defesa informou em Londres que foram lançados três bombardeios: o primeiro, às 7h40 GMT (4h40 em Brasília) pelos aviões Vulcan, baseados na ilha de Ascensíon e que tiveram de ser reabastecidos em pleno vôo para poderem chegar à zona de conflito, entrando, em seguida em ação os caças Harrier, da força-tarefa enviada ao Atlântico Sul.
Por volta das 16 horas (horário de Brasília), um porta-voz do Ministério disse que foi também bombardeada uma pista de pouso construída pelos argentinos em Goose Green, 100 quilômetros a sudoeste da capital e acrescentou: "Posso confirmar agora que as pistas e as aeronaves no solo foram atingidas e que, particularmente, a pista de Porto Stanley está coalhada de crateras".
O governo britânico disse que a operação foi um sucesso e que todos os aviões retornaram a salvo a suas bases, recusando-se a comentar as informações procedentes de Buenos Aires de que dois Harriers foram derrubados e a aviação argentina atacara navios da força-tarefa. O porta-voz Ian McDonald insistiu, porém, em que a operação fora um êxito, e surpreendentemente disse que a Grã-Bretanha ainda não desistiu de encontrar uma solução diplomática para o conflito.
O breve comunicado do Ministério da Defesa afirma que a Grã-Bretanha já havia advertido aos argentinos que a pista de aterrissagem das Malvinas seria considerada um alvo prioritário dentro da zona do bloqueio de 200 milhas em torno do arquipélago. "O aviso emitido dia 28 de abril deixou claro que depois de 48 horas de advertência o aeroporto seria fechado e que qualquer avião que estivesse em terra correria o risco de ser atacado. Cedo, esta manhã (manhã de ontem em Londres) aviões britânicos entraram em ação para fazer cumprir o bloqueio e para impedir que os argentinos fizessem uso do aeroporto de Porto Stanley." O comunicado diz ainda que o ataque foi realizado com base no direito de auto-defesa estabelecido pela Carta da ONU.
Os porta-vozes britânico não deram maiores detalhes sobre o ataque, alegando que depois de uma operação militar é necessário um período de silêncio de rádio, além de uma análise detalhada das informações fornecidas pelos tripulantes dos caça-bombardeiros. A decisão de atacar, segundo fontes do governo, foi tomada pela primeira-ministra Margaret Thatcher durante reunião de emergência do gabinete, sexta-feira.

Alvo tático

Transformado em base aérea, o aeroporto de Porto Argentino é o único das ilhas e possui importância vital para manutenção das linhas de apoio às tropas da Argentina. Além disso, sem esse ponto de apoio para sua esquadrilha, os argentinos ficarão em inferioridade aérea na região, uma vez que seus aviões baseados no continente operarão no limite da autonomia de vôo, podendo combater apenas alguns poucos minutos sobre as Malvinas para guardar combustível suficiente para retornar à costa.
Os caças Harrier e os bombardeios de longo alcance Vulcan lançaram no aeroporto bombas especiais de 450 quilos que abrem buracos de grande diâmetro em pistas de concreto. Algumas bombas seriam de ação retardada, para impedir reparos na pista. Há informações de que havia aviões argentinos estacionados no aeroporto. Fontes da inteligência britânica disseram que caças Mirage-3, bimotores Pucara A 58 e helicópteros de transporte operavam no aeroporto.
A Argentina revelou recentemente que havia instalado foguetes terra-ar Tiger-Cat de fabricação inglesa, para defender a pista, mas em Londres o Ministério da Defesa não quis informar se os aviões Harrier tinham sido recebidos na Ilha com fogo antiaéreo.

Ataque anfíbio

Na opinião de analistas militares, uma vez obtida superioridade aérea na região, a Grã-Bretanha poderá lançar um ataque anfíbio contra os dez mil soldados argentinos no arquipélago. Um desembarque com pouca resistência poderia ser feito em algum ponto remoto das ilhas, que têm costas extremamente acidentadas e com extensão de 1.300 quilômetros, o que impede uma defesa eficaz. Notícias não confirmadas dizem que os ingleses já têm um grupo de soldados de elite operando nas Malvinas, preparando a invasão.
O ataque propriamente dito seria lançado por um navio anfíbio de assalto da força-tarefa, apoiado por helicópteros e, pelos caças Harrier. Uma vez que as tropas tivessem estabelecido uma cabeça-de-ponte, os caças ingleses já poderiam operar a partir das ilhas, pois podem realizar decolagem vertical, não necessitando de pista para pouso. Os aviões argentinos mais avançados, necessitam de pelo menos 1.300 metros de pista.

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