IRÃ ATACA CENTRO NUCLEAR DO IRAQUE


Publicado na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 1º de outubro de 1980


O mais devastador bombardeio já desfechado contra Bagdá em nove dias de guerra destruiu também uma usina termelétrica

Caças da Força Aérea iraniana bombardearam ontem o Centro de Pesquisas Atômicas que está sendo construído pela França em Bagdá e destruíram um gigantesco depósito de combustível que alimenta a central termelétrica de Dora, nos subúrbios ao Sul da capital iraquiana, no maior ataque desfechado até agora nesta guerra entre Irã e Iraque.
A Comissão de Energia Atômica da França divulgou nota em Paris afirmando que os bombardeios provocam o fechamento temporário do Centro, embora as bombas tenham destruído apenas edifícios auxiliares do complexo, sem atingir os dois reatores nucleares (que ainda não entraram em funcionamento). A Comissão, contudo, decidiu retirar do Iraque 350 dos seus 400 técnicos e engenheiros que trabalham na construção do Centro de Estudos Atômicos de Bagdá.
Segundo afirmaram ontem em Londres especialistas do mercado petrolífero, vários países membros da Opep (entre eles Argélia, Líbia e Nigéria) decidiram aumentar em três dólares o preço de seu barril de petróleo, a partir de hoje.
Em Washington, o Pentágono confirmou que enviou ontem quatro aviões radares Awacs à Arábia Saudita para proteger o tráfego de petróleo ao Ocidente na região do golfo Pérsico.

Bombardeado centro nuclear em Bagdá

TEERÃ e BAGDÁ — Caças da Força Aérea do Irã bombardearam ontem um gigantesco depósito de combustível que alimenta a central termoelétrica de Dora, nos subúrbios ao Sul de Bagdá, e o Centro de Pesquisas Atômicas que está sendo construído pela França ao Norte da capital iraquiana, no nono dia da guerra entre Irã e Iraque.
Os caças Phanton Iranianos sobrevoaram Bagdá a apenas 150 metros de altitude, aparentemente pegando de surpresa a defesa antiaérea iraquiana, pois não foi dado o sinal de alarme e os aviões quase não foram atacados. Os três aparelhos que participaram da operação regressaram ao território iraniano, enquanto as chamadas consumiam as instalações de central de Dora. Bagdá já sofreu sete ataques aéreos da aviação iraniana, mas este é o primeiro bombardeio da capital iraquiana nos últimos três dias da guerra entre os dois países.
As agências norte-americanas de noticias AP e UPI disseram que uma refinaria de petróleo foi atingida pelo bombardeio, mas a agência francesa AFP informou que se trata da central termoelétrica, situada na mesma região.
De qualquer forma, cinco horas depois do ataque aéreo, as chamadas (que chegavam a 50 metros de altura) e a densa nuvem de fumaça impediam a aproximação do local. Segundo a AFP, a destruição central prejudicará o fornecimento de energia elétrica a Bagdá.

Centro atômico fechado

Os caças iranianos também bombardearam o aeroporto da capital iraquiana (fechado desde o início dos conflitos) e o Centro de Pesquisas Atômicas que está sendo construído pela França na periferia ao Norte de Bagdá. Quatrocentos engenheiros e técnicos franceses trabalham no projeto.
Em Paris, a Comissão de Energia Atômica da França informou que as bombas atingiram apenas edifícios auxiliares do complexo, sem atingir os dois reatores (que chegariam entrar em funcionamento no próximo ano, mas admitiu que a destruição parcial do Centro forçou o fechamento temporário das instalações.
Porta-vozes da Comissão disseram que não tinham informações sobre vítimas entre os franceses, mas adiantou que Paris decidiu retirar do Iraque 350 técnicos e engenheiros.
A França já havia começado a fornecer urânio enriquecido aos reatores. A Comissão informou que logo depois do início da guerra entre Irã e Iraque os técnicos franceses cobriram com um muro de proteção (de chumbo e concreto) o menor dos dois reatores fornecidos pela França e instalados no local bombardeado ontem. A Comissão acrescentou que nenhum dos dois reatores começou a funcionar até o momento, não havendo, portanto, perigo de escapamento de radiatividade.

Combates prosseguem

Enquanto isso, prosseguem os combates, por terra, nas três frentes abertas pela infantaria iraquiana em território iraniano. Até o momento, é impossível precisar a real situação nessas frentes, devido às informações contraditórias fornecidas por Bagdá e Teerã.
Apesar disso, é possível constatar que os dois países estão reforçando suas tropas no Sul, na região de Khorramchahr e Abadã, província iraniana do Huzistão, onde as batalhas se tornam cada vez mais violentas.
Diplomatas japoneses em Khorramchahr informaram a Tóquio que os iraquianos com uma divisão de tanques e veículos blindados já tomaram o porto da cidade (o principal do Irã), após vários dias de encarniçados combates, e apertam o cerco sobre Abadã, 16 quilômetros ao Sul, onde está situada a maior refinaria de petróleo do mundo. O Iraque, contudo, que já anunciara várias vezes a tomada da cidade, não deu nenhuma informação a respeito.
Mas a rádio de Abadã, transmitindo um comunicado do "comando do quartel-general de coordenação" da cidade emitiu um dramático apelo à população para que resista às tropas invasoras.
"Queridos cidadãos, pedimos a vocês que preparem rapidamente trincheiras nas ruas; façam 'coquetéis Molotov' e qualquer outra arma de destruição. Preparem-se para uma possível luta contra os inimigos de Alá e das massas", disse a emissora, acrescentando: "Com a ajuda de Alá e das Forças Armadas e com o apoio de vocês, heróico povo muçulmano, destruiremos o inimigo".
Segundo a UPI, a transmissão de rádio foi interrompida com o barulho de sirenes de alarma antiaéreo. Além dos combates por terra, a região é constantemente bombardeada pela aviação iraquiana; tanto o porto de Khorramchahr quanto a refinaria de Abadã já estão quase completamente destruídos.
Teerã desmentiu enfaticamente as informações de Bagdá de que as tropas iraquianas estão bombardeando. Ahvaz, capital do Huzistão, 144 quilômetros ao Norte de Khorramchahr. O correspondente da UPI, Joseph Reaves, que se encontra na região, disse que as tropas do Exército iraquiano estão a 8 quilômetros de Ahvaz e violentos combates são travados na estrada que leva à cidade. Acrescentou que as forças do Iraque estão sendo bombardeadas pela Força Aérea iraniana.
Na Frente Norte, na região de Qasr-E-Shirin, a situação permanece inalterada, apesar dos violentos combates e das informações contraditórias das duas capitais. Bagdá afirma que continua avançando por esse setor enquanto Teerã garante que está expulsando os invasores iraquianos.
Um comunicado militar do Estado-Maior iraniano transmitido pela rádio Teerã informou que 161 tanques e veículos blindados iraquianos foram destruídos "nas pesadas batalhas aéreas e terrestres" de segunda-feira, 140 dos quais teriam sido inutilizados em Qasr-E-Shirin.


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