TEM MAIS DE MIL ANOS A HISTÓRIA DOS QUIMONOS

Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 29 de junho de 1975

Não são poucos os ocidentais que se dedicam à moda, que consideram o quimono como o traje mais perfeito em matéria de feminilidade, seja pela delicadeza e arte do tecido ou pela sutileza de sua forma leve, que inspira a imaginar o vôo de um pássaro ou um colorido jardim florido.
É na cidade de Quioto que são elaborados os desenhos mais delicados e que a arte do "yuzen-zome", ou seja, pintura a mão alcançou seu maior esplendor.
A história da tintura de tecidos de Quioto data de mil anos. No ano de 794, quando o Imperador do Japão estabeleceu a capital nesta cidade, imigrantes vindos de todo o continente asiático passavam pela região e ali se estabeleciam, dedicando-se à sericultura e tecelagem. Estas artes eram trazidas de todo o continente e em Quioto adaptadas às condições e cultura locais.
Naquela época os quimonos eram feitos de fios tingidos de várias cores e posteriormente tecidos em vários padrões. O material usado para a confecção do quimono era o fio branco tecido antes do tingimento. A tintura era numa só cor ou padrão ou salpicado de cores, o que se chamava de "shiborizome".
Com o advento do periodo Momoyama, entre os anos 1573 e 1615, os padrões coloridos substituiram as costumeiras tonalidades escuras. Foi nessa transição que o estilo de tintura "yuzen" se tornou popular. Hoje, quando se fala em quimono de Quioto pensa-se no traje feito pelo método "yuzen-zome".
Yuzensai Miyazaki, criador deste método, nasceu em 1654 em Quioto e conta-se que vivia à sombra do portão principal do Templo Chionin, um dos mais famosos templos budistas de todo o Japão. Inicialmente sua fama era consequência das pinturas que fazia em leques dobráveis e de seus desenhos ousados, que agradavam o povo e os comerciantes da região Quioto-Osaka. Através de inovações Yuzensai procurou transferir fielmente intrincados desenhos e matizes coloridos para o pano do quimono, tecnicamente, concentrou-se em descobrir a maneira de evitar a descoloração do desenho, selecionando um tipo glutinoso de arroz, colhido na província de Kaga como material de proteção de pasta corante.

Novos padrões

Depois de tingido o tecido, a parte tingida era coberta pela pasta de arroz, processando-se depois o acabamento do pano, que era fervido num líquido feito com pasta de feijão.
No início, os padrões tingidos eram muito simples, mas com o tempo eles foram sendo aperfeiçoados até atingir os desenhos mais complicados. A "yuzen-zome" começou a desfrutar de sua maior popularidade e consumo a partir de 1615, quando o Japão entrou no período de Edo, depois da época das guerras, fase de maior tranquilidade.
Esta época, que coincidiu com o surgimento da xilogravura Ukiyoe e do drama Kabuki, influenciou o hábito do uso do quimono, que se tornou grande moda.
No período Meiji (1868-1912), as máquinas de tingir e os corantes químicos passaram a ser importados da Europa Ocidental. Seu emprego tornou possível a produção em maior escala dos quimonos "yuzen-zome". A posição de Quioto firmou-se como centro do tecido para quimono do país. Hoje a cidade possui mais de 500 fabricantes.
Um fator indispensável na popularidade da arte de Quioto é o ambiente natural de beleza inigualável. Seus milhares de templos e santuários e a beleza da paisagem contribuem para inspirar os artistas da cidade. Além disso, a água pura e clara dos rios Kamogawa e Katsuragawa oferece ótimas condições de lavagem do pano tingido e remoção da pasta.
Mesmo com os métodos mais modernos de produção do quimono ainda persistem os processos originais chamados de "tegaki yuzen" e outros mais recentes como o "kata yuzen", que consiste na aplicação, no tecido branco, de folhas desenhadas com os padrões a serem estampados, cobertos em seguida de corante pastoso. Este último processo, além de mais barato, produz um senso singular de simplicidade na cor e na forma. O resultado são os maravilhosos quimonos, agora famosos em todo o mundo ocidental por sua graça e delicadeza, que o Japão exporta em quantidade e que ainda permanecem como traje principal dos mais apegados às tradições e cultura do Japão.


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