A MODA PERDE UM DE SEUS CRIADORES: O VELHO BALENCIAGA

Publicado na Folha de S.Paulo, terça-feira, 28 de março de 1972


PARIS - O homem que deu majestade a moda e envolveu a mulher numa aura de luxuosa sensualidade e misterioso fatalismo, o "Belo" Cristobal Balenciaga, foi sepultado ontem. Ele morreu sexta-feira ultima, com a idade de 77 anos em Valência (Espanha). Balenciaga, que foi o principe da moda parisiense durante longos anos, já havia se retirado da profissão mas, recentemente fez uma exceção em seu descanso para vestir de noiva a neta do general Franco, quando se casou com o principe Alfonso de Bourbon.
Cristobal Balenciaga, que nasceu em Guetaria (pais basco, espanhol) em 1895, faleceu em virtude de um enfarte no miocárdio. Em 1920 era já o modista mais celebre da Espanha e vestia as rainhas Maria Cristina e Vitoria Eugenia. Balenciaga se instalou em Paris em 1937, na avenida Jorge V, criando um estilo personalissimo no qual misturou a estilizada finura da costura parisiense e a sensualidade cálida do colorido espanhol. Sua influência na moda do mundo inteiro pesou muito e as elegantes se submeteram a seus preceitos. Entre suas clientes: a duquesa de Windsor, a princesa Grace de Monaco, la begium Aga Khan, Barbara Huston, Elisabeth Taylor, Marlene Dietrich e Maria Felix.
Como mestre, formou uma pleiade de grandes desenhistas de moda como Courreges, Givenchy, Ungaro e seu compatriota Paco Rabane. Retirou-se em 1968, chamavam-no o "Belo Cristobal" e ainda ao envelhecer conservou a excepcional dignidade simples e nobre simpatia de um grande da Espanha.
Orgulhoso, secreto, quase ascético como uma figura de El Greco. Em sua habitação, como toda mobilia tinha uma cama, uma cadeira e um crucifixo. Jamais aparecia em publico.
A iniciação de Balenciaga na moda feminina é interessante: seu pai era pescador, sua mãe costureira em Guetaria. Ali vivia também uma grande senhora, a avó da atual rainha Fabiola da Bélgica, a marquesa de casa Torres, um dia o pequeno Balenciaga teve a ousadia de pedir a grande dama, que saia da missa, que lhe permitisse ver seu vestuário. "Eu tinha doze anos quando a marquesa aceitou que lhe desenhasse um vestido. Fiquei louco de alegria quando no domingo seguinte a vi ir à missa com meu modelo". Entrou ao mesmo tempo na moda e na alta sociedade espanhola. O estilo de sua casa em Paris conservou quase sempre um ar monastico. Seus salões eram glaciais e as cadeiras, as mais duras de Paris.
Nas apresentações reinava um silêncio de catedral, somente cortado por suspiros quase de êxtase quando apareciam os célebres tailuers de Balenciaga. Chanel, a grande Coco, afirmava: "Cristobal é o unico entre nós capaz de recortar, forrar, coser e ajustar. Os demais somente somos desenhistas". Em 1968 fechou as portas de sua casa por vários motivos, o principal dos quais não foi sua avançada idade. Problemas fiscais e sobretudo, a atitude politica de boicote à costura francesa adotada na época pelos Estados Unidos o afetaram profundamente, segundo seus intimos. Preferiu deixá-la. Sua primeira cliente foi a avó de uma rainha. A última, a neta de um chefe de Estado.



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