PARADA DE PARIS
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Publicado
na Folha da Manhã, domingo, 18 de agosto de 1946
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Neste
texto foi mantida a grafia original
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Paris, agosto - Apesar dos quatro anos de ocupação germanica,
da falta de materiais de toda especie, do aumento cada vez maior dos
impostos e de milhares de dificuldades inerentes à mudança
das condições da epoca de guerra para a de paz, os costureiros
parisienses provaram mais uma vez que não perderam nada de
seu prestigio e arte criadora. As recentes coleções
de inverno demonstraram, por sua diversidade e simplicidade, que,
com os recursos normais, Paris pode, como antes, realizar novas idéias
e ditar a moda feminina para todo o mundo.
Não obstante cada criador interpretar as modas futuras segundo
sua propria maneira de ver, todos adotaram o sinal "V" da
vitoria. Essa criação exprime-se por uma linha de ombros
ampliada, que termina em ponta numa cintura de vespa, drapeados em
forma de chale e outras inumeras variações. Por outro
lado, com exceção dos vestidos de esporte mais simples,
os quadris continuam arredondados em todos os modelos, acentuados
por leve drapeado. Para estar de acordo com a estação,
as mulheres devem-se conformar, mais ou menos, com as seguintes medidas:
18 polegadas de cintura, 32 de busto e 35 de quadris.
Quanto às saias, nas duas tendencias definidas - saias amplas
e saias estreitas. Nas primeiras, a amplitude é principalmente
atrás ou na frente, conforme o afastamento definido da saia
camponesa, exageradamente larga, usada pelas parisienses no tempo
da libertação. Os modelos de saia estreita de 1945-1946
entretanto, são muito diferentes dos usados pelas inglesas
e americanas em virtude do racionamento do tecido.
A questão do comprimento da saia é questão de
escolha individual e, principalmente, de silhueta. Paquim, Lelong,
Patou e outros preferem as saias que cobrem os joelhos enquanto as
saias de Balenciaga chegam quase à barriga da perna. Outros
ainda permanecem fiéis ao tipo mais curto.
Os casacos variam desde o modelo redingote com a linha da cintura
acentuada e saia ampla, até os ultralargos desde os ombros.
Uma ou duas casas lançaram o sobretudo de modelo masculino,
cortado em linhas perfeitamente retas. Devido à escassez do
artigo, os adornos em peles verdadeiras são muito limitados:
as peles de coelho, gato e toupeira passaram para a categoria de luxo
e estão sendo muito empregadas como guarnições
não apenas nos capotes, mas tambem em jaquetas e nas populares
"canadiennes" ou jaquetas de caçador.
As mangas variam muito de estilo. Gres apresenta casacos com manga
em forma de asa de morcego, terminando atras, nas costas. Há
mangas tipo lanterna, soprepeliz e mangas "raglan" muito
largas. Outros ainda apresentam mangas larguissimas até o cotovelo,
terminando em punhos ou canhões estreitos. A coleção
de modelos de Mad. Carpentier apresenta mangas tão complicadas
que é impossivel descreve-las. Essa modista expõe tambem
um modelo com a linha da cintura mais elevada, que bem poderá
indicar uma nova tendencia da moda.
Os bolsos continuam a aparecer nos modelos de tarde e de noite, às
vezes até dois ou tres; outras, em forma de imensos bolsos
embutidos, geralmente disfarçados por alguma especie de enfeite.
Nos trajes de cerimonia e de coquetel, são muito bordados,
repetindo-se o motivo nos punhos e lapelas.
Os conjuntos esportivos, modelos simples para tarde são cheios
de cores; duas, três e até quatro combinações
de cores. Por outro lado, as cores preto e marinho foram restabelecidas
para todos os vestidos mais cerimoniosos. Emprega-se o preto principalmente
para os vestidos e conjuntos para coquetel, mas sempre com uma nota
clara, seja na forma de blusa ou de bordado. As outras cores favoritas
são marrom - tom chocolate e café - (às vezes
combinado com preto), verde, bege e cinza.
Embora todas as coleções incluam modelos de vestidos
de cerimonia, os criadores os consideram mais como "simbolos"
para provar que, neste, como nos outros dominios, não abandonaram
a arte. É pouco provavel que as parisienses usem imediatamente
vestidos para "soiree" assim como não há indicação
de que o problema da falta de carvão seja resolvido, e o transporte
para muita gente ainda significa viajar pelo "metro".
De qualquer maneira, esses vestidos de noite evidenciam duas tendencias:
o vestido romantico, com saia ampla ligada a um corpete diminuto,
de gola alta, ou o ultra-ousado "decolleté" reminiscencia
dos modelos usados pelas beldades do seculo XVIII. A outra tendencia
nos vestidos de "soirée" é decididamente a
linha estreita, do vestido justo, mas com drapeados complicados na
altura dos quadris e mangas exageradamente amplas.
Muitos desses vestidos possuem bordados exoticos. A coleção
de Piguet apresenta um modelo encantador, em "faille" marrom
enfeitado com lantejoulas e missangas. Lanvin nos da um modelo surpreendente
em cetim branco, com motivos bordados em toda a saia e corpete de
lantejoulas douradas e prateadas, combinadas com margaridas feitas
em pequenos pedaços de cetim. São tambem apresentados
cabuchões bordados, principalmente em "ensembles"
de veludo negro.
Usa-se muito veludo, tanto como enfeite, como em vestidos de tarde
e de noite. Às vezes combina-se veludo negro com "faille"
tambem preto. Todas as coleções apresentam um conjunto
ou casaco de veludo "corduroy". Em veludo, as cores preferidas,
depois do preto, são o marrom e o verde.
Os vestidos para recepções são quase tão
suntuosos com os vestidos de "soirée". Para esses
prefere-se o cetim, "faille" e veludo. Geralmente têm
saias amplas e corpetes justos, contrastados por mangas enormes. São
romanticos, cheios de cores e muito agasalhadores e confortaveis.
A impressão geral de observador da moda, depois de apreciar
as coleções de Paris, é de espanto pela ingenuidade
dos criadores que tiveram que lutar contra todas as dificuldades dos
tecidos "ersatz" apesar de tudo, conseguiram criar fazendas
simbolizando o luxo que sempre foi sinonimo de Paris.
Os preços são astronomicos mas, segundo um dos principais
costureiros, os lucros são pequenos. Os preços são
estabelecidos por uma Comissão de Controle. Um vestido que
antes da guerra custava 300 francos, custa hoje 30 mil. As fazendas
são dez vezes mais caras - e em certos casos vão alem
desse nivel. Os salarios triplicaram e os impostos sobre artigos de
luxo, e outros impostos, subiram quase 48 por cento. Calcula-se que
uma coleção de 40 modelos custe um milhão de
francos.
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