A CARESTIA DA VIDA TAMBEM CRIA NOVAS MODAS
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Publicado
na Folha da Noite, quarta-feira, 14 de novembro de 1945
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Neste
texto foi mantida a grafia original
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De
qualquer maneira, com meias ou sem elas, a verdade é que uma
bonita perna de mulher sempre é motivo para admiração
e os basbaques param na rua, olham para trás e interrompem,
não raro, o transito.
Com o calor, então, a cidade se transforma num verdadeiro salão
de concurso de belezas - e os vestidos, tão vaporosos e curtos
(chegam a parecer pequenos para quem os veste), chegam, às
vêzes, a causar escândalo.
A maior preocupação da vida de um homem, por mais abafado
que êle esteja de trabalho ou atrasado num encontro importante,
que lhe decidirá negócios certos - apaga-se com uma
exclamação de admiração quando passa na
rua uma mulher bonita de pernas sem meias.
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A
derrota da minoria |
Entretanto, pouca gente (os homens, nesse caso) sabe que essa moda
não foi copiada de nenhum figurino parisiense ou de qualquer
tratado de beleza norte-americano. As meias foram ficando esquecidas
diante da impossibilidade da maioria das mulheres de adquiri-las pelos
preços exorbitantes que custam nos dias dificeis de hoje. E
a maioria, como numa eleição, venceu, e obrigou a minoria
- gente de dinheiro que poderia gastar sem que a despesa pesasse na
sua bolsa - a abolir o uso das meias. Depois, se uma pequena parte
de mulheres insistisse em sair da linha escolhida pela maioria, isso
ficaria ridiculo - e o ridiculo é a ameaça mais séria
que já apareceu na vida das mulheres.
Existem as que gostam de parecer diferente, fora do normal, somente
para chamar atenção - e é por isso que se vê
na rua, de vez em quando, qualquer coisa que se parece com uma moça,
e que, entretanto, não pode ser distinguida muito bem devido
a petrechos indestinguiveis, objetos exóticos que leva na cabeça,
à guisa de chapéu. Quanto aos vestidos, não se
sabe com certeza se eles encolheram ou se a fazenda não deu.
Entretanto, agradam muito mais assim aos olhos dos homens...
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Os
preços excessivos |
Em todos
êsses casos não entram meias. Êsse o motivo pelo
qual as giletes estão tendo uma saida absurda: é que
as moças raspam as pernas para que os pelos não causem
má impressão.
A guerra, o modernismo, o tempo, o custo de vida, e não se
sabe mais o quê, impuseram a adoção dessa moda,
que, diga-se de passagem é uma medida de economia contra o
abuso de preços que os aproveitadores do povo espalharam por
aí.
Esses preços assustam e insultam, da vitrine, o pobre cidadão,
empregado no comércio ou trabalhador de qualquer fábrica,
que para com vontade de comprar mas desanima e receia diante dos altos
preços que tornam inuteis os poucos cruzeiros que leva na carteira.
Na perna de cada meia exposta, aparecem cartõezinhos com preços
assim:
"Malha Resistente..................... Cr$ 22,00";
"Malha Superior ............... Cr$ 35,00";
"Indesmalháveis ................ Cr$ 38,00";
"Superior Resistente........... Cr$ 28,00";
"Malha Super-Fina............. Cr$ 32,00",
"Super Qualidade.................... Cr$ 24,00",
"Qualidade Super-Fina.......... Cr$ 55,00" e uma infinidade
de outras.
Existem tambem outros nomes: "Extase", "Ilusão",
"Freneste" e "Désier", mas só esta
última custa sessenta e cinco cruzeiros o par.
Como em quase tudo existe a mania de imitar os Estados Unidos, as
lojas da cidade vendem também, meias que as mulheres estadunidenses
usam - e o par de meias americanas custa cento e cinquenta cruzeiros.
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O
que se passa com a moda masculina |
Os homens que por acaso tenham sorrido maliciosamente dessa história
das mulheres inventarem modas para fazerem economia, devem corar daqui
por diante, porque com a moda masculina se repetem os mesmos motivos
e recursos. Não será, naturalmente, o mesmo caso das
meias de seda - porque nenhum homem sai à rua com essas peças
suspeitas. A vergonha a que nos referimos aí em cima não
é dita em tom de zombaria por terem os homens interesse em
fazer economia - mas sim pelo fato de haverem se divertido com a vaidade
feminina.
Apenas uma pequena parte dos homens de hoje anda de chapéu
- e não digam agora que é, única e exclusivamente,
para seguir a moda masculina. É que o dinheiro não dá
para comprar um "Logomarsino", por exemplo, que custa duzentos
e noventa e até trezentos cruzeiros.
O salário minimo que um rapaz recebe no fim do mês, pagas
as despesas obrigatórias de pensão, de cigarros, do
judeu da prestação e outras, não permite que
êle compre um chapéu "Chile", que custa quinhentos
cruzeiros (e êles não fazem abatimento de dez centavos.
Não adianta pechinchar).
Na vitrine, outros chapéus mais baratos custam "somente"
isso: "Toquilha" Cr$ 230,00, "Panamá",
Cr$ 350,00, "Cuenca Cr$ 250,00, "Tibet" (feito de fibra)
Cr$ 850,00. Este último, se chover ou mudar somente a temperatura,
desaba. "Ecuatorian", Cr$ 180,00, "Lontra", Cr$
220,0, e outros por aí.
É essa a razão pela qual os homens, em sua maioria,
andam sem chapéu - mesmo nos dias de chuva. Nesta quadra dificil,
recorrem aos fixadores de cabelo, que não custam uma fortuna
como os chapéus e dão brilho ao cabelo - quando o "freguês"
não é careca...
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