JEAN SEBERG, DO FRACASSO AO SUICÍDIO
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Publicado
na Folha de S.Paulo,
segunda-feira, 10 de setembro de 1979
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A atriz Jean Seberg, cujo corpo foi encontrado no sábado à
noite, pode ter morrido em consequência de uma superdose de
barbitúricos. É, pelo menos, o que dizem as autoridades
policiais que investigam a morte da atriz, de 40 anos de idade, e
que foi achada dentro do seu automóvel, a 200 metros do apartamento
onde morava em companhia do marido, o ator argelino Ashmed Hams, no
elegante distrito 15 de Paris.
Do porta-luvas do veículo a polícia retirou os documentos
de Seberg. Próximo ao corpo, foram achados vários envelopes
de barbitúricos, vazios, e uma garrafa de água mineral.
Um policial disse que não havia sinais de luta no interior
do carro, e amigos da atriz disseram que, em 1960, quando grávida
de sete meses, ela sofreu um choque emocional muito forte ao ler um
artigo em que se dizia que o filho que esperava era produto de uma
relação com um integrante dos "Panteras Negras".
Por isso, garantem os amigos, Seberg deu à luz prematuramente
e a menina morreu dois dias depois, o que lhe causou problemas psíquicos.
Jean Seberg completaria seus 41 anos a 13 de novembro próximo.
Autora de dois livros, "Blue Jean" - um ensaio sobre a esquizofrenia
- e "How top Escape Oneself" (Como Escapar de Si Mesmo),
este um manual com instruções para o suicídio,
a atriz fez, em sua não longa e nem muito bem sucedida carreira,
cerca de 20 filmes. Nascida em Marshalltown, Iowa, radicou-se logo
na França, onde sempre viveu.
No cinema, Seberg não atingiu, como atriz, a posição
de uma Jeanne Moreau, nem de Brigitte Bardot ou outros nomes femininos
muito mais conhecidos. Foi, pode-se dizer, uma estrela intermediária,
bonita e, quando as personagens exigiam, também muito sensual,
como se pode verificar pelo papel que representou em "Os Pássaros
Vão Morrer no Peru" (que teve, aqui, outro título),
obra baseada no romance do escritor Romain Gary, com quem, na época,
era casada. Gary foi seu segundo marido. O primeiro foi François
Moreuil, advogado que se tornou diretor cinematográfico (sem
êxito). Nenhum dos dois casamentos deu certo, e, dizem os amigos,
os fracassos matrimoniais levaram a atriz a um constante estado de
depressão. Muitos chegam a afirmar que, na verdade, ela já
havia morrido há algum tempo, dadas as dificuldades que encontrava
para superar as sucessivas crises.
Dos 20 - ou pouco mais - filmes que rodou, a maioria com histórias
simplórias, mal exploradas e geralmente do gênero policial,
pode-se incluir, como os mais importantes, "Bom Dia Tristeza",
adaptação do "best seller" de Françoise
Sagan, e "O Acossado", realizado quando Jean-Luc Godard
ocupava o papado da "nouvelle vague" francesa. Foi este,
de fato, seu grande êxito como atriz, embora como estrela ela
tivesse sido, sempre, uma considerável garantia para o sucesso
popular de outras fitas. Mas foi com Godard, realmente, que ela pôde
revelar algumas qualidades bem expressivas, compondo a pequena vendedora
de jornais americanos, usando o mesmo cabelo curto com que antes,
fizera "Santa Joana", seu filme de estréia, escolhida
pelo diretor norte-americano Otto Preminger, em 1957, entre 18 mil
candidatas para representar Joana D'Arc.
"Santa Joana" foi um fracasso, e isso, de certa forma, serviu
para minar os sonhos da mulher hiper-sensível, impotente num
universo áspero. Depois de "Bom Dia Tristeza" seguiu-se
uma série de filmes menores como "A Linha de Demarcação",
"A Rota de Corinto", "Por Um Momento de Amor",
"Sublime Loucura" (que superou o nível intermediário
dos demais), "Pendulum", o curioso "Lilith", que
fez com Warren Beatty, e "O Rato Que Ruge", onde fez a paladina
de um pequeno país que decide declarar guerra aos Estados Unidos
para depois cobrar indenização pelos danos sofridos.
Nos últimos anos Jean Seberg atuara no primeiro "Aeroporto"
e, embora psiquicamente enferma - recentemente tentara o suicídio
atirando-se sobre os trilhos do metrô parisiense, foi salva
e passou bom período em clínicas especializadas em doenças
nervosas.
Há alguns anos, ela declarara, numa entrevista, que se sentia
extremamente confusa e dizia não saber o que seria do seu terceiro
casamento - com o diretor de cinema Dennis Berry. "Sou um misto
de fragilidade, de sinceridade e de orgulho", confessava afirmando
ter sido sempre uma mulher que caminhou sozinha pela vida, que jamais
havia recebido ajuda de ninguém e que "desde garotinha
aprendi a enfrentar as dificuldades sem apoio dos outros!". Quando
casou-se com o escritor Romain Gary, bem mais velho do que ela, achava
ter crescido e despertado intelectualmente. "Ele fez-me ler Stendhal,
Flaubert, Balzac, estudamos arte românica e gótica no
Louvre". Depois, com o fracasso do relacionamento, começou
para Jean o período das crises que a levaram aos excesso de
barbituricos, tornando sua vida praticamente insuportável.
O suicídio - como afirma a polícia - foi o fim de uma
atribulada existência à procura de si mesma.
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