A LONGA HISTÓRIA DO PAR DE MEIA

Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1975

Antes da II Guerra Mundial, os frequentadores masculinos dos cinemas ficavam em "suspense" quando na tela Marlene Dietrich, "O Anjo Azul", cantando, estendia langorosamente suas pernas revestidas com meias de seda presas a rendadas cintas. Nos anos 20, as pernas femininas passaram a ser a zona erógena do corpo em evidência. Conforme a época, a moda valoriza uma determinada região da plástica feminina. No tempo de Josefina e Napoleão, por exemplo, a "zona erógena" era o busto, valorizado pelos vestidos com profundos decotes e fitas contornando os seios, o famoso estilo "Império".
Com a valorização das pernas, as meias, peças do vestuário que deveria revestí-las modelando, embelezando e escondendo eventuais falhas começaram a ser aperfeiçoadas. No início do século, as meias eram grossas e tinham cores escuras; por isto, quando as meias confeccionadas com fios de naylon, práticamente invisíveis, surgiram, houve uma "verdadeira revolução" não apenas no guarda-roupa das mulheres mas também no seu próprio comportamento social. Agora, mesmo com as saias muito abaixo dos joelhos elas, ao sentar, sempre dão jeitinho" para que as saias subam, permitindo mostrar o máximo possível e permitido de pernas. Esta preocupação da mulher européia dos anos 20 nem seria cogitada pela mulher do início dos anos 70, extremamente desenvolta com a mini-saia. Nesta fase, as meias - principalmente as meias calças - predominaram na moda feminina. Confeccionadas com fibras sintéticas, sua textura é leve e macia, o colorido é vibrante e elas modelam ao mesmo tempo que protejem.
Mas nem sempre as meias estiveram em tal evidência embora elas sejam a peça do vestuário mais antiga que se conheça: já eram usadas pelos coptas, como provam os achados em túmulos.
Eram meias tricotadas e usadas por homens; só muito tempo depois é que as meias seriam utilizadas também pelas mulheres. As meias e meias-calças dos lanquenetes do século XVI eram especialmente vistosas e muitas vezes, numa mesma pessoa, cada perna apresentava padrão e cores diferentes. Os cavaleiros do rococó, antes da Revolução Francesa, também se preocupavam em exibir meias enfeitadas. Diz Heirich Satter no seu trabalho "A Malha Elegante".
"Ainda não estão bem esclarecidos os motivos pelos quais as mulheres deviam usar saias compridas - pelo menos as mulheres que desempenhavam um papel na sociedade e das quais, por isso, temos notícia. Na Idade Média usavam-se meias feitas de pedaços de tecido e que não podem ter sido bonitas. Os espanhóis do século XVI já produziam meias de bela apresentação que evidentemente só as mulheres mais ricas podiam comprar e que quase ninguém podia ver, fora as amigas e os membros mais próximos da família. Quando a representação de uma cidade desejou fazer chegar às mãos da rainha Ana da Espanha um par de meias como presente de casamento, o mestre de cerimônia do Palácio o confiscou dizendo: "As rainhas de Espanha não têm pernas".

Exibindo pernas

Foi Elizabeth I, da Inglaterra quem incentivou as súditas a tricotar meias de lã para atravessar o inverno. Durante muito tempo, entretanto, meias bem confeccionadas eram privilégio de principes e reis.
Até que, aos poucos, formou-se uma verdadeira indústria de meias na Saxônia e em determinada época a Alemanha atendia 80% do consumo de meias em todo o mundo.
A medicina veio auxiliar a tecnologia na conquista do mercado: o professor Windaus descobre a vitamina D e o medicamento Vigantol que erradicaria o problema do raquitismo, responsável pelos membros atrofiados do corpo feminino. Donas de pernas mais saudáveis, as mulheres sentiam-se seguras para exibi-las e as meias eram, por uma consequência natural, mais requisitadas.
Antes da II Guerra Mundial, Carothers inventara a fibra do naylon e Paul Schack, o perlon. Estavam agora solucionados os problemas de elasticidade e, em parte, da resistência e duração. Com o desenvolvimento da tecnologia, as meias puderam ser fabricadas em grandes quantidades diminuindo o preço ao consumidor.
Segundo estatísticas, na maioria dos países as mulheres compram, em média, duas dúzias de pares de meias por ano.
Uma característica dos novos métodos de produção está no fato de que a matéria prima e o produto final quase não são tocados por mãos humanas, até chegar ao consumidor. Por meio de máquinas a fibra puramente sintética é conduzida às fábricas de meias, onde é recebida por outras máquinas para depois, ser empacotada, quase sempre em embalagens de plástico transparente, e transportada ao distribuidor. Este deixou de ser exclusivamente uma loja ou um armazém. Hoje as meias são encontradas em larga escala nos supermercados e na Europa e Estados Unidos, até nos automáticos de moedas.


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