HOJE, UMA DATA TRISTE: MORTE DE CARMEM MIRANDA

Publicado na Folha de S.Paulo, quinta-feira, 5 de agosto de 1971


Há 16 anos morria em sua residencia, em Beverly Hills, Estados Unidos, a maior cantora e atriz cinematografica brasileira de todos os tempos Carmem Miranda, que cantava na ocasião 42 anos de idade e estava há 16 anos fora do Brasil, terra que tanto amou. Um ataque cardiaco, após o termino de filmagens para a televisão com o comico Jimmy Durante, foi o golpe fatal que surpreendeu Hollywood e todo o povo brasileiro.
"Sou brasileira. Apenas nasci em Portugal." - dizia Carmem, que chegou ao Rio de Janeiro procedente de Lisboa aos dois anos de idade. Maria do Carmo Cunha Miranda era seu verdadeiro nome. Começou a trabalhar para ajudar os pais aos 13 anos numa loja de chapéus da rua do Ouvidor. Ganhava 60 mil reis por mês e os entregava à sua mãe. Bonita graciosa, alegre Carmem tornou-se a melhor vendedora da loja. Encantava a todos, até que um dia foi apresentada ao professor Josué de Barros e ao deputado Anibal Duarte, que em 1927 estavam organizando uma festa em beneficio da Policlinica de Botafogo, no instituto Nacional de Musica.
A garota Carmem ensaiou dois tragos para se apresentar na festa: Garufa e Mama yo Quiero um Noblo. O compositor Josué de Barros gastou, mas resolveu explorar melhor os dotes da menina ensinando-lhe os sambas Taí e Linda Flor. Carmem acabou agradando mais com os sambas.
O mesmo compositor levou-a, depois para a Radio Sociedade Roquete Pinto, lançando-a tambem no disco, com Dona Balbina e Triste Jandaia, de sua autoria., esta ultima gravação foi o primeiro sucesso musical de Carmem Miranda.
Um ano após, ingressou na Radio Mayrink Veiga, sob a direção de Cesar Ladeira, artista recem-chegado ao Rio de Janeiro. Ao lado dele, Carmem começou a ganhar forma nacional no programa A Pequena notavel. Em 1938, pediu aumento de salario, passando de 500 para 1.400 reis, o mesmo que Chico Alves recebia na ocasião.
De sucesso em sucesso, Carmem Miranda passou a fazer filmes como Alô, Alô Brasil, cantando "O que é que a Baiana Tem?", de Dorival Caymi, além de apresentar shows nos Cassinos Atlantico e da Urca.
Uma noite no Cassino da Urca o empresario norte-americano Lee Shubert, sentado ao lado da atriz Sonja Henie, ficou fascinado com a exibição de Carmem e convidou-a para ir com êle aos Estados Unidos, sob contrato. Foi o começo da carreira artistica sensacional da Pequeno Notavel.
Por 400 dolares semanais, Carmem iniciou uma serie de apresentações de "O Que é Que a Baiana Tem?" na Broadway, acompanhada pelo conjunto musical brasileiro ""ando da Lua". Seu primeiro contrato com a 20h Century Fox, em Hollywood, resultou de um sucesso ao lado e Jean Sablon na peça "As Ruas de Paris", apesar de só aparecer nela durante seus minutos.
Carmem Miranda fez mais de dez filmes nos Estados Unidos. Os principais foram Serenata Tropical, Copacabana, Uma Noite no Rio, Romance Carioca, Minha Secretaria Brasileira, Se eu Fosse Feliz e Alegria, Rapazes. Na maioria deles, ela aparece com seus trajes tipicos de baiana com balangandãs e turbantes exoticos no valor de 3 a 3.500 dolares, cada. Eram trajes criados segundo seu proprio seu proprio criterio.
Apesar de viver dezesseis anos longe do Brasil, Carmem Miranda sentia-se brasileira. Mais tarde, em 1947, após seu casamento com o produtor cinematografico David Sebastian, o proprio marido diria que se casara com ela "por causa de sua alegria contagiante, tendo o Brasil estampado em cada curva de seu corpo".
"Ela não gostava de representar personagens que não fossem tipicamente brasileiros. Ela perdeu varios contratos, por isso. Uma vez não quis trabalhar ao lado de Clark Gable apenas porque teria de desempenhar o papel de uma india norte-americana". - afirmou David.
Carmem fez varias excursões artisticas pelo mundo, visitando Cuba, Havaí, India, Inglaterra, Italia e outros paises. Foi a primeira artista latino-americana a receber a famosa homenagem do Chinese Theater, com a gravação das mãos no cimento.
Grande Otelo conta que reviu Carmem no Cassino da Urca em 1954, quando ela visitou o Brasil pela segunda vez.
"Vendo que minha mulher estava gravida. Carmem Miranda disse que seria a madrinha. O menino nasceu a 13 de agosto de 1955. Ela morreu no dia 5 do mesmo mês e ano".
Hoje, o corpo da artista que mais fêz propaganda do Brasil no Exterior, em todos os tempos, repousa no Cemitério São João Batista, no Rio, na mesma quadra em que jaz Chico Alves.


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