DOIS DEDOS DE PROSA COM PORTINARI DIANTE DO RETRATO DE OLGA B. PRESTES

Publicado na Folha da Noite, quinta-feira, 6 de dezembro de 1945

Neste texto foi mantida a grafia original

Traz as características da pintura renascentista - Manifesta-se o artista sôbre sua própria obra

Olga Benario Prestes, vista por Portinari

O interêsse surgido em tôrno da anunciada e não efetuada exposição de Portinari derivou, segundo parece, para o seu único trabalho exposto em São Paulo - o retrato de Olga Benario Prestes.
Os comentários tecidos em volta dêsse retrato, reclamavam maior publicidade e assim, a reportagem da "Folha da Noite" procurou ouvir o autor do quadro.

Fala Portinari

— "Muito comentário tem surgido em tôrno dêsse meu trabalho, —disse-nos o conhecido pintor. Crítica e mais crítica. Favoráveis e desfavoráveis. Leigas e políticas. Técnicas e sentimentais. Opina um crítico de arte que a minha tela teve como modelo um retrato e assim, traz o estigma da cópia. Realmente, foi uma fotografia que me permitiu retratar a D. Olga Benario Prestes pois, pessoalmente, não a conheci, mas não se trata de cópia e sim de uma composição minha, em seus mínimos detalhes. Nota-se na tela êsse tom "renascença" que procurei trazer dos grandes mestres. As suaves meias tintas usadas, a simplicidade de linhas que o quadro apresenta e a posição clássica da figura, evidenciam a impressão que procurei causar".

Frente ao retrato

Diante do retrato observamos o trabalho que apresenta as características de um quadro renascentista. As letras em ouro sôbre fundo verde tão usadas por Da Vinci, as linhas clássicas do retrato que, sem fugir a sua técnica, Portinari soube aproveitar, destacam essa nota de nobreza notada em telas da época.
— "Procurei pintar com o coração —prosseguiu o entrevistado— e transmitir ao público o meu sentimento. Trouxe para o retrato a idéia de dignidade dolorosa, de profundo amor, que deve surgir da figura de uma mulher que sacrificou tôda a sua vida por um ideal. O retrato pertence a Luiz Carlos Prestes. Foi mesmo feito a seu pedido. Fiquei satisfeito com a idéia de que iria pintá-lo, porque pretendia dar à tela o verdadeiro sentido da vida de D. Olga.
Nada de bandeiras vermelhas, sangrentas. Não. Só suavidade, dedicação, amor e sacrifício, devem surgir de um retrato de Olga Benario Prestes" - terminou o nosso entrevistado.


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