MILES DAVIS, INOVADOR DO JAZZ MORRE AOS 65 ANOS

Morreu ontem aos 65 anos o trompetista Miles Davis. Considerado o "pai do cool jazz" e um dos músicos mais importantes do século, Davis estava internado com penumonia num hospital de Santa Mônica, na Califôrnia (EUA). Ele teve ontem problemas respiratórios e infarto. Em mais de 40 anos de carreira, Davis revolucionou estilos no jazz.

Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 29 de setembro de 1991

Morre aos 65 o trompetista Miles Davis

Infarto, pneumonia e problemas respiratórios matam nos EUA o músico, considerado "pai do cool jazz"

O trompetista Miles Davis, considerado o "pai do cool jazz", morreu ontem, aos 65 anos, de pneumonia, problemas respiratórios e infarto, no St. John's Hospital, perto de Santa Mônica, na Califôrnia, Estados Unidos. Ele estava internado há cerca de um mês.

O músico sempre teve muitos problemas de saúde. Em entrevistas concedidas três anos atrás, Davis chegou a admitir que parte desses problemas tinha origem no vício da heroína.

Miles Davis foi um reinventor do jazz e desde os anos 40 ocupava a frente de quase todos os movimentos jazzísticos, tais como "bebop", "cool jazz", "eletric jazz" ou "jazz-rock-flusion".

O trompetista Dewey Miles Davis Jr. nasceu em 25 de maio de 1926 em Alton, Estado de Illinois, nos Estados Unidos. filho de um dentista, começou tocar trompete aos 13 anos, quando ganhou o instrumento do pai. Influenciado inicialmente pelos trompetistas Roy Eldridge e Dizzy Gillespie, Davis, aos 18 anos, estudou música na Julliard Scholl of Music, de Nova York.

Protegido por Charlie "Bird" Parker, acompanhou a primeira geração do "bebop", tocando com Thelonious Monk, Gillespie e Kenny Clarke, entre outros. Visto como grosso, mal-humorado e violento com tudo que considerasse racismo, Davis ficou deslumbrado quando viajou pela primeira vez à Europa em 1948. Paris lhe abriu as portas. De volta aos EUA, o choque cultural foi tão grande que ele se entregou à heroína, relata o músico em sua autobiografia, lançada no Brasil em maio deste ano pela editora Campus.

Em 1949, já mais próximo do arranjador Gil Evans, liderou gravações consideradas deflagradoras do "cool jazz".

Na década de 50, aderiu às drogas pesadas e enfrentou períodos de inatividade, mas a partir de 1954 formou seu mais famoso quinteto, que incluía o saxofonista John Coltrane. Novas parcerias com Gil Evans, como "Porgy and Bess", renderam obras-primas.

Nos anos 60, recusando-se a aderir ao "free jazz", sua música chegou a ser esnobada pela mídia. A partir de 68, aderiu aos instrumentos eletrônicos e ao rock. Seus discos entraram para a Billboard. Davis revelou toda uma geração de estrelas, como Herbie Hancock, Chick Corea e Keith Jarret.

Em 76, o consumo de drogas interrompeu novamente sua carreira, reiniciada apenas em 81. Nos últimos anos, o músico enfrentou vários problemas de saúde. Essas doenças eram atribuídas por muitos ao consumo de heroína pelo músico.

Numa entrevista concedida em junho último ao jornal francês "Le Monde", Miles Davis disse que ficava muito doente após cada turnê, "Tenho calafrios, uma mancha no pulmão, duas hérnias por causa de esforço físico, um nervo comprimido nas costas. A minha mão formiga quando eu furmo. Tenho muitos problemas, inclusive diabetes e pés inchados."

Ao mesmo tempo, Davis dizia que a música e o palco sempre lhe proporcionavam bem-estar. "Se eu pudesse estar no palco durante todo o ano, eu não pararia de tocar. No palco, eu sinto o ar entrar nos meus pulmões", afirmou. Nessa mesma entrevista, o músico revelou que pretendia encerrar a carreira em 92.

Davis exibiu-se no Brasil em 1974 e em 1986, no Free Jazz Festival. Uma terceira apresentação, agendada em 88 no 4° Free Jazz, foi cancelada devido a uma pneumonia.


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