EM PROL DO CINEMA BRASILEIRO

Entrevista com o escriptor Oswald de Andrade

Publicado na Folha da Manhã, terça-feira, 27 de abril de 1937

Neste texto foi mantida a grafia original

Continuando junto dos intelectuaes de São Paulo o nosso inquerito a respeito do desenvolvimento da cinematographia nacional, fomos hontem ouvir o escriptor Oswald de Andrade.
Encontrámol-o em sua casa - um apartamento que fica bem no alto de um arranha-céos, debruçado para os terraços de onde se vê toda a cidade.
Como o "reporter" observasse, lá de cima, o taboleiro verde formado pelas arvores da Praça da Republica, Oswald de Andrade interveio com um sorriso que valia pela melhor das "charges" do "modesto proprietario" conversando com uma visita de cerimonia:
- É o nosso jardim...
Depois, numa sala onde não faltam nem os livros, nem os quadros, nem o representante de uma nova geração de pintores, que é o proprio filho do escriptor Oswald de Andrade instalou o reporter em frente de um "clock-tail" e começou elle a fazer as perguntas.
- Não creio que você espere de mim uma entrevista dizendo o que é o Cinema, qual a sua importancia, como, por exemplo, o Cinema indica um estado avançado de civilização industrial -ou de cultura...
- Mas...
- O que decerto ao seu inquerito é saber se já temos possibilidades de realização de "films" nossos...
- Justamente...
- "É ver o que está ahi. O sucesso economico de certas fitas nossas e principalmente o sucesso intelectual de "Limite", já ha anos. Isso indica que possuimos todos os elementos plausiveis para a creação de uma industria nacional do cinema. Material humano não nos falta. Da direcção depende tudo. Conheço pessoalmente alguns astros de Hollywood. E não posso admitir que a velhota abominavel que é Lupe Velez possa ser aproveitada tão admiravelmente e não o possam as creaturas de todas as raças caldeadas no beneficio solo paulista. Tudo mostra que o cinema depende de direcção de organização. Ora fui surpreendido ultimamente com as realizações de Companhia Americana de Filmes. Tenho a melhor impressão do seu grande technico, o diretor Léo Marten. Está além disso à sua frente um notavel organizador, o dr. Luiz Amaral. E seus planos são vastos e solidos. E seus capitaes são grandes.
Quanto aos escriptores de filmes elles apparecerão estou certo. Com elles virão os scenographos, os musicos etc. Basta conhecerem o estimulo que lhes traz a poderosa organização que citei. Esperemos pois pelas primeiras experiencias. O nosso publico não poderá ser insensivel ao que se está fazendo"
É quasi desnecessario dizer que o reporter não se despediu de Oswald de Andrade sem lhe ter ouvido a respeito de cinema e de varios outros assumptos, uma serie de commentarios bem à sua maneira que não é como se sabe, de poupar intenções sarcasticas e "blagues" desconcertantes.

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