POESIA E PROSA
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Publicado
na Folha de São Paulo, segunda-feira, 22 de abril de 1991
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"Pelo que diz respeito a adquirir e a ganhar não fazem
os homens outra coisa, não só na roleta como em toda
parte, do que tirarem e lucrarem-se algo reciprocamente. Outra questão
é saber se a aquisição e o proveito são
algo feio. (...) Há duas espécies de jogo nitidamente
diferentes: o dos gentis homens e o da plebe. Há quem os distingua
com muita severidade. Todavia, a falar a verdade, que tolice tal distinção!
Um gentil homem pode, por exemplo, arriscar cinco ou dez luízes,
raras vezes mais. Pode também arriscar mil francos, se é
muito rico, mais só por causa do jogo propriamente dito, para
se divertir, para estudar o processo do ganho e da perda. Mas não
deve, de modo nenhum, interessar-se pelo ganho como tal. Depois de
ganhar, pode ele, por exemplo, dar uma boa gargalhada, ou dizer uma
piada a um dos circunstantes. Pode mesmo tornar a jogar essa quantia
toda, duplicá-la, mas unicamente por curiosidade, para ver
os lances da sorte, para fazer combinações, e nunca
movido pelo desejo plebeu de tirar proveito disso. Numa palavra, ele
não deve ver no salão de jogo, nas roletas e 'Trente-et-quarente'
mais do que um simples divertimento. Nem sequer deve suspeitar das
possibilidades de ganho e das armadilhas em que se baseia a banca.
Não seria mau se, por exemplo, lhe sucedesse que todos os outros
jogadores, a plebe, que treme por cada florim, fossem igualmente ricos
e jogassem unicamente para seu divertimento. Essa ignorância
completa da realidade e da concepção ingênua do
homem podem, sem dúvida, ter efeito altamente aristocrático."
Extraído do livro "O jogador", de Fédor Dostoievski"
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Dostoievski
foi fã de jogos |
O escritor russo Fédor Dostoievski conheceu duas paixões.
Apolinária (Paulina) Suslova e o jogo. Por causa desses dois
amores viveu no paraíso e no inferno. "O Jogador"
foi escrito nessa época, espelhando sua prisão às
roletas. "Em tudo e por tudo vou até o último limite",
reconheceu.
"Os Irmãos Karamazov", "O Idiota", "Crime
e Castigo" foram nutridos pela mesma vida sombria de Dostoievski.
O escritor esteve próximo de ser fuzilado, por suas ligações
com grupo de revolucionários. No momento da execução,
em 1847, soube que sua pena havia sido substituída por trabalhos
forçados.
Durante os quatro anos em que esteve na Sibéria, Dostoievski
se entrega mais ao jogo. "Desde que, na véspera, me aproximei
do pano verde e comecei a reunir pacotes de notas, meu amor passou
para segundo plano... Será que sou jogador?"
Ele estava endividado e separado de Paulina, quando inicia o livro
"O Jogador". Precisava de uma estenógrafa para terminá-lo
mais rapidamente, e assim conhece Ana Snitkina, que seria sua segunda
mulher.
Mas Dostoievski continua a jogar. Até que, de súbito,
escreve à sua esposa: "Uma grande obra amadureceu em mim:
esta fantasia imunda que me torturou durante dez anos desapareceu...
Agora está tudo acabado. É verdadeiramente a última
vez." E nunca mais jogou.
(FY)
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