O BRASIL SEM ELIS REGINA
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Publicado
na Folha de S.Paulo, quarta-feira, 20 de janeiro de 1982
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A inesperada morte da cantora Elis Regina, aos 36 anos, provocou ontem
um enorme impacto entre seus milhares de fãs, que desde o início
da tarde se aglomeravam diante do Teatro Bandeirantes, onde o corpo
foi velado. A música popular perde, prematuramente, uma de
suas maiores intérpretes em todas as épocas, que se
identificou com o Brasil desde o início de sua carreira no
Beco das Garrafas, no Rio, passando pelos festivais que eletrizaram
os anos 60, até a cantora madura dos "shows" dos
anos 70, como "Falso Brilhante" e "Transversal do Tempo".
A causa de seu mal-estar súbito ainda não está
esclarecida. Elis deu entrada às 11h45 no PS do Hospital das
Clínicas, já sem vida. A morte foi anunciada pouco depois
das 12 horas, sendo o corpo levado para o Instituto Médico
Legal às 12h30. A autópsia revelou que a cantora não
sofria de nenhuma moléstia nos órgãos vitais.
O IML anunciará amanhã a "causa mortis". No
entanto, o delegado do 14o DP, Carmo Aparecido de Camargo, afirmou
que Elis morreu devido a uma "intoxicação exógena".
Às 16h20 o corpo foi levado para o velório no Teatro
Bandeirantes.
Elis Regina será sepultada na manhã de hoje no Cemitério
do Morumbi, saindo o cortejo do Teatro Bandeirantes às 11 horas.
O DSV já organizou um esquema especial para o trajeto: avenida
Brigadeiro Luís Antônio, rua Humaitá, rampa do
viaduto Pedroso, avenida 23 de Maio, avenida Rubem Berta, avenida
dos Bandeirantes, avenida Luís Carlos Berrine, ponte do Morumbi,
avenida Morumbi, rua Professor Carlos Gama, até a rua Deputado
Laércio Corte, onde se localiza o Cemitério do Morumbi.
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Elis,
o adeus à batucada da vida |
A cantora Elis Regina, de 36 anos, morreu na manhã de ontem
de parada cardíaca por causa "indeterminada", conforme
a declaração de óbito nº 026010. Segundo
o Instituto Médico Legal, o corpo da artista deu entrada às
12h30 e a autópsia - exames macroscópicos - revelou
que ela não sofria de nenhuma moléstia nos órgãos
principais, como coração e pâncreas, e que seu
corpo não apresentava sinais de violência. Desde então
os peritos estão realizando exames toxicológicos em
sua vísceras e dentro de 24 horas saberão que tipo de
substância ela pode ter ingerido.
As informações foram transmitidas pelo assessor de comunicação
da Secretaria de Estado da Cultura, José Antônio Machado,
que serviu de contato entre o diretor do IML, Harry Shibata, e a imprensa,
a pedido do secretário Cunha Bueno, pois o Instituto, até
as 16 horas, não havia expedido nenhum resultado dos exames.
Embora Machado não tenha confirmado, na saída o delegado
do 14o DP, Carmo Aparecido de Camargo, confirmou que a cantora morreu
por "intoxicação exógena", o que já
havia sido dito por da. Elizabete, médica do Pronto-Socorro
do Hospital das Clínicas, para onde Elis Regina havia sido
levada às 11h45.
O episódio do mal-estar súbito da cantora não
foi totalmente esclarecido. De início, circulou a notícia
que ela havia saído para comprar uma casa, logo de manhã,
sentiu-se mal e foi levada ao hospital. Os médicos tentaram
"ressuscitá-la" de todas as formas, inclusive por
massagem cardíaca, sem resultado. Sua morte seria constatada
pouco depois das 12 horas.
Quando a notícia da morte de Elis se espalhou, as imediações
e dependências do IML ficaram cercadas de amigos, parentes,
artistas e fãs, e começaram a circular informações
contraditórias. Alguns falaram de uma discussão séria
entre Elis e seu namorado na noite anterior, o que foi descartado
por Ione Cirillo, sua amiga há mais de 13 anos.
Até o final da tarde - às 16h20 seu corpo foi liberado
e levado para velório no Teatro Bandeirantes - nenhum de seus
parentes quis falar sobre o acontecido. Samuel Mac Dowell, que até
as 15 horas havia permanecido incomunicável numa sala do Instituto,
saiu abatido, juntamente com o advogado Marco Antônio Barbosa.
O irmão de Elis Regina, Rogério, quase na mesma hora
saiu de uma sala e foi conduzido rapidamente a outra, sem dizer nada.
O mesmo aconteceu com o músico e compositor César Camargo
Mariano, ex-marido da cantora e pai de dois de seus três filhos
(Pedro, de sete anos, e Maria Rita, de quatro), que deixou o IML tão
logo o corpo foi liberado.
Dezenas de pessoas saíram de suas casas para tentar saber mais
notícias diretamente no IML, para onde também foram
diversos artistas, como a atriz Tônia Carrero, que ouviu um
noticiário de rádio a caminho do aeroporto e logo depois
estava lá.
Enquanto se aguardava o resultado da autópsia, muitos dos que
trabalhavam diretamente com a cantora foram chegando, sendo conduzidos
à sala principal do IML, onde já se encontravam os advogados,
o amigo Walter Silva e uma moça alta, de cabelos curtos, que
disse "não sou ninguém", ao perguntarem se
era irmã de Elis. Mais ou menos às 14h30, chegou Janjão,
baterista da cantora, que foi juntar-se a Natan, o guitarrista, e
logo em seguida saiu para buscar os documentos da artista. Logo depois
chegavam o produtor Roberto de Oliveira, a cantora Clara Nunes, o
deputado Eduardo Matarazzo Suplicy (PT-SP) e o compositor e músico
Eduardo Gudin.
Para Suplicy, ela "despontou muito jovem, aos 18 anos, e foi
se politizando gradativamente. Era uma mulher esclarecida e progressista,
uma cantora de protesto, sensível ao que ocorria na realidade
brasileira. Ela procurava se aprimorar sempre e eu tinha afinidade
com seu modo de pensar, além de gostar de seu repertório,
que sempre demonstrou grande sensibilidade política".
Gudin, artista que foi praticamente lançado por Elis nos tempos
do "Fino da Bossa", da Record, em 1967, disse que "por
mais que ela tenha feito, muito mais teria a fazer. Foi uma carreira
interrompida no auge". Afirmando que não acreditava em
suicídio, Gudin disse que "esse tipo de coisa não
era de seu feitio. Tinha 36 anos, era a maior cantora do Brasil e
não teria por que fazer isso".
Segundo se dizia ontem, antes do mal súbito, ela recebeu, na
noite de segunda-feira, em sua casa, o compositor Ronaldo Bastos.
Segundo amigos como Walter Silva, Elis estava numa fase boa de sua
carreira e de sua vida íntima. Teve um ano agitadíssimo
profissionalmente "e se deu ao luxo de tirar férias totais",
como lembrou a amiga Ione. Ela havia passado o fim de ano com os filhos
em Foz de Iguaçu e estava tendo uma temporada muito boa de
descanso com os filhos João Marcelo, de 12 anos (filho de seu
casamento com Ronaldo Boscoli), Pedro e Maria Rita.
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