EM PROL DO CINEMA BRASILEIRO


Entrevista com o dr. Joaquim Canuto Mendes de Almeida

Publicado na Folha da Manhã, terça-feira, 20 de Abril de 1937

Neste texto foi mantida a grafia original

A reportagem da "Folha" foi hontem ouvir o dr. Joaquim Canuto Mendes de Almeida promotor publico na Capital e uma das nossas mais notaveis competencias em materia de assumptos cinematographicos.
O dr. Canuto Mendes de Almeida é, como se sabe, o autor do libro Cinema contra Cinema, que foi premiado pela Academia Brasileira, e em que o cinema é cuidadosamente estudado nos seus aspectos materiais intellectuaes e educativos - e onde se encontra explicada a melhor maneira de escrever o "écran", de tratar os themas que se destinam a ser filmados segundo os processo realmente cinematographicos.
O dr. Canuto Mendes de Almeida, que foi durante muito tempo critico de cinema e que neste momento está bastante mais absorvido pelo Palacio da Justiça do que pelo mundo das imagens recebeu-nos, entretanto, bem amavelmente.
- "Poderia dizer-nos a sua impressão a respeito do desenvolvimento do cinema brasileiro? Pensa que... - Penso que o cinema nacional promete vir a ser uma grande industria.
Acredito no seu futuro tanto sob o ponto de vista commercial como sob o ponto de vista artistico.
A materia prima nacional é a inteligencia dos que imaginam o "film" e dos que o realizam - escrevendo, representando ou photographando. Não importa nada, por exemplo, que as manchinas venham de fóra...
O machinario todo o material de realização de um "film" tem um caracter puramente instrumental não podendo jamais constituir o essencial do cinema - como para um pintor o essencial da sua arte não será jamais a tela ou os pinceis ou o preço que custaram as molduras.
- Não lhe parece que os "films" falados na nossa lingua...
- No tempo do cinema silencioso creio que essa industria brasileira teria menores probabilidades de exito commercial. A produção estrangeira levava todas as vantagens - o que não acontece hoje, que dispomos do poderoso elemento que é o idioma nacional.
- Sob o ponto de vista artistico...
- O essencial é que se preocupe fazer a "enquadração" - termo que prefiro para substituir o de "scenario"- de accôrdo com um systema propriamente cinematographico. Tudo o mais - interpretação - photographia - phonographia - embora excellente, será inutil, se não for satisfatoria a sequencia do "film".
- O que pensa da attribuição do premio de 25 contos, offerecido pela Companhia Americana - o premio que será conferido pela Academia Paulista ao autor do melhor argumento para a sua primeira super-produção dessa empresa cinematographica brasileira.
- Naturalmente, penso bem. Vae ser com certeza, dado segundo um criterio cinematographico, isto é, afastando preoccupações de caracter especialmente literario e de qualidades sobre tudo theatraes.
O enredo, imagino, deverá apresentar as maiores probabilidades de perfeição cinematographica proporcionaes aos meios da industria nacional.
- Parece-lhe que teremos artistas?
- Sou de opinião que não nos devem faltar interpretes e todos os collaboradores indispensaveis à realização cinematographica.
- Sendo necessario technicos estrangeiros...
- Elles depressa formarão escola. Bem sabe que o cinema desperta sempre um interesse extraordinario.
Não vejo portanto, motivo sério para duvidar do aperfeiçoamento e sucesso do cinema feito no Brasil"...
Foi com essas palavras e um sorriso não menos optimista que o dr. Canuto Mendes de Almeida se despediu do "reporter".
E enquanto elle se dirigia para o "Forum", o reporter dirigia-se para a redação, pensando na luta do "Cinema contra o Cinema"- do bom contra o mau, o que ainda se prende a velhos preconceitos theatraes, como disse o nosso entrevistado - que no seu livro não se cansa de repetir que se "a arte cinematographica é, primordialmente, movimento e photographia - o cinema sonoro é movimento, photographia e phonographia", e não apenas uma longa conversa ou uma arrastada cantilena.

© Copyright Empresa Folha da Manhã Ltda. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Empresa Folha da Manhã Ltda.