O VEÍCULO DO SÉCULO FAZ 50 ANOS


Publicado na Folha da Tarde - Segunda-feira , 14 de agosto de 1989


Em 1939 o mundo assistia a primeira transmissão pela televisão

O mundo inteiro está comemorando os 50 anos do surgimento da televisão. Embora não exista um consenso sobre quem inventou o aparelho ou até mesmo quando foi a primeira transmissão oficial, o registro histórico fica para a primeira demonstração nos Estados Unidos, feita pela RCA, em 1939, durante a Exposição Internacional de Nova York.
Na verdade, a história da televisão começa no século passado, mais exatamente em 1817, quando o químico sueco Jakob Berzelius descobriu o selênio que tinha a propriedade de transformar a energia luminosa em energia elétrica. Essa era a premissa teórica segundo a qual era possível transmitir imagens por meio de corrente elétrica. Entretanto, somente na década de 20 é que se realizariam as primeiras transmissões de imagens a título de experiência.
Em 1923 o inglês John Baird conseguia fazer a primeira transmissão de imagens de objetos com uma caixa que ele chamava de televisão. Em 1924 fez a primeira transmissão de fisionomias humanas. Dois anos depois a BBC de Londres fez um acordo com Baird para emissões experimentais a partir de sua estação em ondas médias. Simultaneamente, entre 1923 e 1927, o russo naturalizado americano, Vladimir Zworkin, inventava o iconoscópio, aparelho que criava a primeira imagem totalmente eletrônica, formada por uma centena de linhas e milhares de pontos luminosos.

Implantação

Em 1930 começaram as transmissões regulares na Inglaterra e também na França, onde o posto emissor era a Torre Eiffel. Em 1935 houve a primeira transmissão oficial pela televisão na Alemanha e em 1938 começou a funcionar a televisão na União Soviética. Em 1939 cinco países faziam transmissões regulares com o sistema eletrônico, porém com o início da Segunda Guerra Mundial apenas a Alemanha manteve a sua televisão no ar.
O pós-guerra foi o período em que a televisão experimentou o seu mais rápido desenvolvimento pois todas as emissoras voltaram a transmitir suas imagens. Começa aí a disputa com os outros veículos de comunicação: o jornal e, principalmente, o rádio, tanto no campo da informação quanto na publicidade.
Em 18 de setembro de 1950 inaugurava-se oficialmente a primeira estação de televisão brasileira, a TV Tupi de São Paulo, pertencente à rede jornalística dos Diários Associação. Foi também nos anos 50 que aconteceram as maiores evoluções do aparelho: a substituição das válvulas eletrônicas por transistores e o surgimento da televisão a cores que só iria se popularizar na década de 60. Cada país implantou um padrão de cor: nos Estados Unidos era o NTCS contra os europeus Seçam, na França, e PAL na Alemanha.
Na década de 50, nos Estados Unidos, já existiam 107 estações e o número de aparelhos já chegava à casa dos quatro milhões de unidades. As audiências já haviam se tornado maciças por lá.
A primeira transmissão transcontinental também foi realizada pelos Estados Unidos, em 4 de setembro de 1951, quando os japoneses puderam assistir ao discurso que o presidente Harry Truman fez dirigido à conferência da coroação da rainha Elizabeth II, em Londres, em 2 de junho de 1953, através da Eurovisão. A rede internacional levou o acontecimento à França, Bélgica, Holanda e Alemanha.
Em abril, de 1961 a BBC de Londres fazia uma transmissão direta da União Soviética para outros países, mostrando o pouso do cosmonauta Iuri Gagarin, e em fevereiro de 62, o mundo também pôde ver o vôo espacial do norte-americano John Glenn. Porém essas imagens apenas preparavam o terreno para aquela que iria impressionar o mundo inteiro: em 20 de julho de 1969 mais de um bilhão de pesados viram, diretamente e ao vivo, a cena em que o homem pisava pela primeira vez na Lua.

Satélites

A competição entre os Estados Unidos e a União Soviética acelerou o processo do lançamento de primeiro satélite que serve para transmissão de sinais telefônicos e de televisão, capitáveis em qualquer parte do mundo. Quando ainda não haviam indícios da viabilidade do lançamento de satélites, o escritor cientifico britânico Arthur Clarke publicava um artigo em 1945 na revista "Wireless World", que previa o invento. Era a antecipação quase perfeita do que aconteceu exatamente 17 anos mais tarde. Em 10 de julho de 1962 a NASA lançava o TELSTAR, nos Estados Unidos, satélite construído pela AT&T, de órbita relativamente baixa.
Já em 1965 a mesma NASA lançou o primeiro satélite operacional e comercial para fins de comunicação. Era o Early Bird desenvolvido pela COMSAT. Antes disso, em 1964, formou-se o Internacional Communication Satellite Consortium, o INTELSAT, composto originalmente de 50 paises. A União Soviética recusou participar desse acordo e criou a sua própria rede com o lançamento do Molnyá I, também em 64.
O programa de satélites abriu novos caminhos na comunicação dos países em desenvolvimento. Apenas um aspecto dessa questão preocupava os países da América Latina, que era o da colonização cultural por parte das grandes potências emissoras de imagens. Por esse motivo decidiram manter sob controle as comunicações espaciais via satélite. O passo do Brasil para isso foi a criação da Embratel, em 65, após se integrar no consórcio INTELSAT.

Televisão no Brasil

O primeiro programa da televisão brasileira começou com um discurso de Assis Chateaubriand, fundador dos Diários Associados que, na noite de 18 de setembro de 50, colocava no ar a PFR-3 Tupi Difusora Canal 3. O programa inaugural foi dirigido por Cassiano Gabus Mendes e levava as imagens daqueles que faziam o rádio, como Lia de Aguiar e Walter Forster interpretando uma cena romântica, Hebe Camargo cantando, assim com o Frei José Mojica, interpretando seus sucessos. Teve até comentário político e esportivo. Durante cinco horas, os brasileiros ficaram encantados com as imagens que aquele enorme aparelho transmitia
Na época existiam apenas 200 televisores no País e para que mais pessoas pudessem assistir à primeira transmissão, diversos receptores foram instalados em locais públicos, num raio de 80 quilômetros de alcance. Um aparelho custava 59 mil cruzeiros antigos e a primeira loja a vendê-los foi a Cássio Muniz na Praça da Sé. No final de 1951 já haviam sido vendidos sete mil televisores e de 59 para 60, 200 mil brasileiros possuíam o aparelho.
A década de 50 foi a época em que produtores, artistas, diretores e técnicos aprendiam a fazer televisão na prática. Como tudo era feito ao vivo a improvisação era a marca registrada e as dificuldades muitas, principalmente na hora em que as garotas-propaganda tinham que apresentar algum produto e aconteciam os famosos imprevistos.
Mesmo assim novas emissoras iam surgindo e além da pioneira Tupi, já o operavam a TV Paulista, Canal 5 - que em 64 passaria para a Rede Globo -, e a Record, Canal 7. Também surgiam novos programas e entre eles alguns ficariam como verdadeiros marcos na televisão nacional como Sítio do Pica-Pau Amarelo, Circo do Arrelia, Grande Gincana Kibon, Clube dos Artistas, O Céu é o Limite e repórter Esso, entre outros. A influência da TV começa a ganhar tanta importância que o Ibope, antes restrito ao rádio, passava a medir os índices de audiência do novo veículo a partir de 54.
A linguagem da televisão era similar à do teatro e a programação incluia clássicos como Hamlet. Toda ação era encenada como no palco, com muita emoção e suspense e não havia lugar para falhas. Era o chamado Teleteatro, uma das realizações mais marcantes dessa década. Porém, a técnica e a linguagem vão se aprimorando, em 57, a Tupi faz um seriado de um capítulo semanal durando seis meses: Lever no Espaço, ficção cientifica que já utilizava três palcos, fundo infinito e desenho animado.
A década de 50 termina com a criação da primeira lei que regulamente a censura no Brasil, assinada por Armando Falcão no governo Kubtischek.

Evolução

Os anos 60 se caracterizam por uma série de transformações fundamentais, com início inauguração de Brasília. A TV acompanha a mudança de capital nacional transmitindo imagens ao vivo para o Rio, São Paulo e Belo Horizonte através de um sistema de microondas instalado em diversas cidades. Esse é o momento que marca o avanço das tramissões à distância pela TV Brasileira.
A chegada do vídeo teipe faz uma revolução na história da televisão nacional e determina o fim da fase de aprendizado dando lugar ao avanço tecnológico. Em primeiro momento a edição em VT era feita mecanicamente, como no cinema. A utilização ainda era tímida e servia apenas para evitar riscos e começar a formar a memória da nossa televisão. Por esses motivos a linguagem ainda continuava a mesma. O timing era o de teatro e de televisão ao vivo.
Só com o surgimento da edição eletrônica que a televisão começou a criar uma linguagem mais própria. O VT ainda permitiu a formação de redes nacionais e a criação do maior sucesso da televisão brasileira: a telenovela, quando foi ao ar o Direito de Nascer, em 64 pela Tupi. Ainda nos anos 60 a Record dá uma amostra das tendências da música brasileira com o Fino da Bossa, Jovem Guarda e os Festivais de MPB.
Outras emissoras foram chegando e confirmado o grande invento que foi a televisão. De 1939 até hoje as evoluções foram imensas e o que parecia ser apenas um sonho de um inventor inglês se transformou em uma indústria extremamente rentável tanto para as grandes redes como para os fabricantes. Quem sai ganhando é o telespectador que a cada dia se surpreende com os avanços da telinha.

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