"JAMAIS O DISCO PODERÁ DERROTAR O LIVRO"


Publicado na Folha da Noite, quarta-feira, 12 de agosto de 1953

Neste texto foi mantida a grafia original

Fala sobre o assunto o presidente da Camara Brasileira do Livro - Casos em que o disco pode substituir o livro - Não há ameaça

- "Levando-se em conta os fatores tempo e dinheiro, não se pode acreditar no sucesso da cultura do disco", afirmou à nossa reportagem o sr. Abel Ferraz de Souza, presidente da Camara Brasileira do Livro.
O problema está sendo alvo de preocupações, por parte dos pedagogos, em virtude da noticia segundo a qual o Novo Testamento está sendo gravado em disco no Estados Unidos, havendo uma tendencia para se acreditar que o disco, dentro em breve, poderá vir a substituir o livro, em todos os campos da cultura. Falando sobre o assunto, prosseguiu o presidente da Camara Brasileira do Livro:
- "As historias infantis em disco, já vulgarizadas, destinam-se evidentemente às crianças que não sabem ler. A obra literaria em si repele o processo de gravação. A verdade é que os poemas que se levam ao acetato despertam a atenção pelo declamar, ou às vezes pela voz ou interpretação do proprio autor. Assim, para que uma obra literaria obtenha sucesso em disco, torna-se necessaria a união de uma ou varias artes, tudo dependendo, é claro, do conjunto. Ninguem, por exemplo, poderá ouvir a contento, digamos, um romance de Machado de Assis, mas poderá interessar-se pela história, se se tratar de adaptação inteligente."

A questão dos analfabetos

Lembrando o problema dos analfabetos, prosseguiu o entrevistado: - "Não, os analfabetos não poderão apreciar uma narração fastidiosa de um romance. Eles não passam do circulo reduzido de sua linguagem, não entendendo a maior parte da obra, que, por literaria, utiliza vocabulario maior que o popular. Onde os discos têm constituido grandes auxiliares do aprendizado é no setor das linguas estrangeiras, com lições praticas, possibilitando ao estudante aprender a pronuncia com facilidade. Mesmo nesse caso não se dispensa o livro, porque, com os olhos nas palavras, entende-se mais facilmente o que esta sendo falado. Aos estudantes universitarios, por exemplo, os discos, reproduzindo as aulas de diversas materias, não produzem, pelo ouvido, os mesmos resultados que as apostilas, que se podem consultar rapidamente, na parte que interessa. Os discos, além de se tornarem incomodos, não trazem a vantagem de serem mais baratos, nem a economia do tempo, pois aquele que se consome com a leitura de uma aula não é o mesmo que foi gasto pelo professor. A leitura, como todos sabem, é mais veloz que a dicção."
Finalizando, disse ainda o sr. Abel Ferraz de Souza:
- "Em suma, para que os discos se transformem em veiculos de cultura, necessario se torno aplicar metodos especiais, que dependem mais do talento do descobridor do metodo que propriamente da obra literaria ou cientifica em si, não havendo consequentemente receio de que o disco possa derrotar o livro."

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