RÁDIO, 60 ANOS UNINDO O BRASIL


Publicado na Folha de S.Paulo - terça-feira, 7 de setembro de 1982

No dia 7 de setembro de 1922, o Rio ouviu, surpreso, a fala de Epitácio Pessoa através de um transmissor

Pesquisa do Banco de Dados - "Folha"

Ainda há, entre os que ouvem os 90 milhões de rádios-receptores existentes no Brasil (trata-se de estimativa que inclui os receptores que entraram irregularmente no País), os que discutem a superioridade de uma transmissão esportiva com Nicolau Tumã ou Aurélio Campos (já falecido) na locução. Os que suscitam essa discussão podem até não ter razão, mas não há nenhuma dúvida sobre a excelência do rádio da época (anos 40). Houvesse o transistor naquele tempo, e o rádio teria sido um meio de comunicação muito mais poderoso do que foi. Seus primeiros diretores não foram a outros países buscar idéias. Tudo foi feito aqui, pelos pioneiros ou os que vieram depois. Posteriormente, a grande maioria das idéias do rádio foram levadas para a televisão.
Foram um antropólogo, educador e escritor (Edgard Roquete Pinto, nascido a 25 de setembro de 1884 e falecido em 1954), e um engenheiro meteorologista (Henrique Charles Morize) os introdutores do rádio no Brasil. Membros da Academia de Ciências sugeriram ao governo a instalação de uma emissora de rádio para as comemorações do 1o Centenário da Independência. O governo aceitou e adquiriu uma emissora de 500 watts e 80 receptores, que foram distribuídos por vários bairros do Rio.
O transmissor acabou por ser instalado no recinto da Exposição Internacional, onde foi montado o "Telephone-Alto-Falante", distribuído por pontos estratégicos. E o povo ouviu, surpreso, o discurso do presidente Epitácio Pessoa e até algumas palavras do rei Gustavo Adolfo 5o, da Suécia, que visitava o País na ocasião. O fato, que entrou para a história como sendo o nascimento do rádio no Brasil, ocorreu dia 7 de setembro de 1922. No dia 20 de abril do ano seguinte, Roquete Pinto e Henrique Morize puseram no ar a "PRA-2 Rádio Sociedade do Rio de Janeiro", que operava com um transmissor de dois mil watts, "a maior potência da América do Sul" segundo notícias da época. Em meados de junho do mesmo ano, em Recife, Oscar Pereira Pinto fundou a "Rádio Cultura de Pernambuco".
Em São Paulo, depois de algumas experiências que não tiveram sequência, e que foram feitas por diversas pessoas, surgiu, em 1926, a "Rádio Educadora Paulista" e dois anos depois, a "Rádio Record". Surgem a seguir, no Rio, a "Rádio Mairink Veiga" e a "Rádio Phillips". Tanto no Rio como em São Paulo, tudo é feito de improviso, não havendo profissionais especializados. Em 1931, Paulo Machado de Carvalho e mais dois companheiros compram a "Record" e, no ano seguinte, surge a voz de César Ladeira, que iria marcar época e fazer história no nosso rádio.
Cesar Ladeira causou impacto em 1932 irradiando o noticiário sobre a Revolução Constitucionalista e depois, com a vitória do governo central, quase foi deportado, com Paulo Machado de Carvalho, criador do rádio-jornalismo. Mais tarde, transferindo-se para o Rio, revolucionou o novo meio de comunicação, dando dinâmica à programação, pagando mais aos artistas e animando pessoalmente as apresentações. Criava "slogans", legendas e dava nome artístico aos seus apresentados. A comercialização que estava chegando ao rádio (1936) desagradou Roquete Pinto, que devolveu a rádio que dirigia ao governo. É a "Rádio Ministério da Educação e Cultura" de hoje.
Com a fundação da "Rádio Nacional do Rio de Janeiro", em 1936, começa o que os historiadores chamam de integração nacional pelo rádio. A emissora, dirigida por Gilberto Andrade a partir de 1939, iniciou a montagem de um "cast" que iria, em futuro não muito distante, garantir-lhe a liderança de audiência por muitos anos. Dispondo de melhor equipamento, apesar de o conflito mundial que tinha iniciado em 1939, continuar se alastrando, o rádio brasileiro entra na sua segunda fase, a década de 40. Esse é o ano em que o "jingle", criado por Gilberto Martins, é utilizado pela primeira vez. As rádios "Mairink Veiga", no Rio, e a "Rádio São Paulo" apresentavam novelas radiofonizadas desde 1936. No gênero, pontificavam artistas como Celso Guimarães, Floriano Faissal, Rodolfo Mayer, Ismênia dos Santos, Paulo Gracindo e outros. Na música, ídolos como Francisco Alves, Orlando Silva, Araci de Almeida e outros.
Surgiram programas de êxito permanente, como "PRK-30", de Lauro Borges e Castro Barbosa; artistas como Jararaca e Ratinho, que não tiveram seguidores. A "Rádio Nacional" liderava a programação, mantendo sob contrato 800 pessoas, sendo 120 músicos e 180 cantores e artistas de rádio-teatro. Terminada a guerra, em maio de 1945, os programas de auditório ganham mais força, tanto no Rio como em São Paulo. Publicações especializadas davam destaques aos "reis" e "rainhas" do rádio. Os programas cômicos da "Mairink Veiga" ganhavam destaque; na "Rádio Nacional", as novelas e os "shows". Em São Paulo a "Rádio Record" acompanhava de perto suas coirmãs cariocas. Para uma Emilinha Borba no Rio, respondia com Isaura Garcia em São Paulo; para Marlene, Neide Fraga e assim por diante. Foi o grande período dos fãs clubes.
O rádio tinha especialistas em todas as áreas, principalmente no esporte. Nos anos 50 a "Rádio Panamericana" ("Jovem Pan" de hoje) cuidava exclusivamente de esportes. Em junho de 1950 foi inaugurada a Televisão Tupi, mas o impacto do novo meio de comunicação só foi sentido pelo rádio alguns anos depois. Algumas estações de rádio adaptaram-se à nova situação. Procuraram tirar proveito do transistor e agilizaram a programação. Foi dado maior espaço ao rádio-jornalismo e ampliados os serviços à comunidade. Aproveitando as boas condições das comunicações telefônicas intercontinentais, contrataram correspondentes no Exterior, que entram no ar a qualquer momento e, sobretudo, adotaram as emissões estereofônicas. Mas não foram todas que agiram assim.
Walter Silva, radialista há mais de 30 anos, acha que o "rádio se aviltou a ponto de leiloar seus melhores espaços para atender à ganância de sorridentes comerciantes-animadores, falsos caipiras vendedores de remédios de fabricação e efeitos duvidosos e de fabricantes de casos policiais sensacionalistas".

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